Que Horas São?

Por Ramon Bacelar

-Atrasado meu DEEEUUUSSS!!!

Acordo afogado na luminosidade solar inundando meu quarto de pensão, vôo escada abaixo e alcanço o passeio:

- Que horas são?

O idoso olha para mim de braço estendido: no pulso um velho Rolex sem ponteiros me avisa que é hora de correr!

Disparo pela calçada e me aproximo do primeiro táxi da fila:

-Que horas são?

-Hummm…-O taxista olha atentamente para o relógio mordendo os lábios- Hora de pegar minha cliente!! Muito obrigado pela lembrança!!!

Vuuuuummmm …

Preciso correr, correr, chegar… Eu preciso, preciso e resisto; entro em uma relojoaria cercada de sucata e ponteiros estáticos…Não resisto:

-Que horas são?

O relojoeiro sorridente aponta para a torre da praça principal: no topo, um zelador polindo os ponteiros me dá língua fazendo buúúúú como um garotinho encapetado, só me resta….

Contorno o jardim com a rapidez e elegância de uma avestruz embriagada, e visualizo ao lado da igreja uma aglomeração cercando um palhaço:

-Que horas são?

Direciono meu pedido a quem quer que me escute, mas o palhaço me fulmina com os olhos : sinto-me como um bisbilhoteiro atravancando o espetáculo, um quebra-molas inútil, deslocado e desconexo empacando o trânsito e os pedestres.

-Que horas sããããooo???- Curioso, o palhaço me pergunta retirando do peito um relógio gigante: as mesmas de ontem AHAHAHAHAHAH!!!!!

A platéia explode em sonoras gargalhadas, enquanto me retraio como uma bexiga murcha de pescoço caído e sorriso chocho.

-Desculpe…Não quis ofender. – O palhaço, de cabeça baixa, suspende a manga olhando para o pulso: Agora são… Um pouquinho pra mais logo!!! UHUHUHUHUHAHAAHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!!!!

-Socorroooo!!!

Preciso seguir, prosseguir…Chegar a tempo para, para …eu paro:

A batina entrelaça minha visão em sua monotonia bicolor… Apazigua meu espírito:

-Padre… Pelo amor de Deus, que horas são?

Vazio: o Silêncio do Silêncio.

-Para se encontrar com o Senhor…Toda hora é hora meu filho.

Eu tremo, ofego, transpiro, suspiro:

-Nãããooo!!!

Eu corro, corro, persisto, não pergunto, não desisto, resisto e finalmente desembesto escada à cima, mas um degrau em falso me impulsiona para a porta (blaaaammm) e me arremessa aos pés do meu chefe…Suspendo o pescoço:

-B-bom… Bom dia c-chefe, que horas são?

-Hora… da demissão, chegou CEDO DEMAIS!!!!

Ouço a última ordem (não entendo!) no mesmo instante que seus dedos direcionam minha visão aos velozes ponteiros do relógio de parede… Andando para trás!!!!

MIF

Ramon Bacelar
Enviado por Ramon Bacelar em 04/12/2012
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