ILHA DOS PESCADORES
O mar revolto, as ondas atiravam-se contra os rochedos em uma pequena ilha de pescadores no balneário de Angra dos Reis, afastada da civilização. Tudo ficava muito distante, os moradores deslocavam-se em embarcação para chegar a civilização em busca de alimentos, ferramentas, sementes e tantas coisas mais.
A Ilha dos pescadores era pouco habitada, dizem os antigos que a maioria dos moradores foram embora, com medo de coisas estranhas que aconteciam na redondeza.
Senhor Nicolau, um marujo experiente que já navegou muito mar a dentro, homem forte, destemido, valente que desbrava o mar em busca do sustento da família. Contam os antigos que ele já viu muita coisa naquele mar. Ele como poucos permanecia na ilha.
Geralmente os pescadores iam para o mar e ficavam meses sem retornar para casa. Enfrentavam tempestades violentas, muitos não voltavam nunca mais, sendo sepultados pelo mar. Isso quando não eram tragados por uma forma de vida estranha, a qual os pesadores denominaram de Demônio do Mar.
Certa vez lá estava seu Nicolau em uma dessas pescarias, em seu barco tinham dez homens. Naquela noite o mar estava violento com a tempestade que chegou. Ventos uivantes, ondas gigantescas, jogavam a embarcação de um lado ao outro. Um dos pescadores foi lambido por uma onda, atirando-o no mar. Os colegas tentaram resgatá-lo, sem sucesso. O pescador se batia na água sendo jogado pelas ondas. De repente surge de uma imensa onda uma forma de vida horripilante, abocanhando o pescador, degustando o com o sangue escorrendo pela boca.
O pescador gritava até ter sua vida esvaindo-se, para servir de alimento para aquele ser que vive nas profundezas do mar, aguardando a oportunidade de fazer suas vítimas.
Contam os pescadores que o Demônio do mar costuma atacar em noites de tempestades.
No dia seguinte a tempestade, depois de quase dois meses no mar, os pescadores resolveram retornar para terra firme.
A embarcação navegou por muto tempo até encontrar terra firme. De longe avistaram a ilha.
Os moradores da ilha e principalmente os familiares corriam para a praia para saudar seus entes queridos.
A embarcação ancorou no cais, e os moradores partiram para ajudar a retirarem a pesca do barco, era um costume da ilha, os moradores ajudavam a retirar a carga e em troca recebiam peixes.
Os familiares dos pescadores corriam na esperança de encontrar seu familiar. As família foram se reencontrando uma a uma, menos uma família, a do pescador que o Demônio devorou. A família pranteou a perda daquele que era o esteio da casa. Deixou mulher e cinco filhos, o mais velho com catorze anos e o menor com três meses.
Os pescadores saiam a pesca, mas não tinham garantia de retorno, era preciso ir, pois era dali que se tirava o sustento da família. Todas as vezes que eles saiam para pescar, as famílias iam se despedir como se fosse a última vez, para muitos era a chance de se despedir do seu familiar.
Descansaram alguns dias e até para vender sua pesca.
Começaram a preparar a próxima pescaria, arrumaram a rede, as tarrafas, alimento e água para dois meses. As famílias já ficavam apreensivas, o medo era seu principal atributo.
Finalmente eles partiriam naquela madrugada, porém faltava um pescador, mas quem iria no lugar daquele falecido? O seu filho se ofereceu para ir, pois ele agora era o homem da família e tinha que prover o sustento de sua mãe e seus irmãos. Partiram depois da saudosa despedida dos familiares. Rumo ao mar, corajosos, destemidos, fazendo o que eles sabiam fazer de melhor, pescar.
Navegaram por dias, chegando finalmente em alto mar, lançaram as redes e tarrafas ao mar, a pescaria foi abençoada naquele e nos dias seguintes, nunca tiveram pesca tão abastada. Pelo visto retornariam mais cedo desta vez. O barco estava abarrotado de peixes, então voltariam no dia seguinte.
Naquela noite descansaram mais cedo, para partirem no dia seguinte. No cair da noite começaram a se formar nuvens, anunciando uma tempestade. Começou a chover muito, o mar ficou revolto, as ondas cresceram ameaçando a vida dos pescadores. Eles começaram a temer por suas vidas. E as ondas cresciam cada vez mais, de repente uma onda lançou três pescadores ao mar, os outro desesperados, não conseguiam nem se protegerem, quanto mais ajudar os companheiros.
O demônio do mar surgiu carregando os pescadores para as profundezas do mar. Depois da tempestade formou-se um denso nevoeiro, tornando o local mais tenebroso, os pescadores temiam por suas vidas.
Eis que em meio ao nevoeiro surgiu um barco, carregado de homens, alguns pescadores afirmaram ter visto os amigos falecidos a bordo, inclusive o outro companheiro que morreu na outra pescaria.
O barco passou e sumiu no nevoeiro. Os pescadores acalmaram-se mais, aguardando o dia amanhecer para fugirem daquele pesadelo.
Depois de uma noite tenebrosa, os primeiros raios de sol timidamente anunciam-se no horizonte. Os pescadores velejam rumo ao lar. Dessa vez com o coração mais partido do que nunca. Todos estavam muito triste com o desfecho do dia anterior. Aos poucos se aproximavam de terra firme, ao avistarem a ilha a dor foi se intensificando, por saber que traziam más notícias.
Ao ancorarem, a multidão se achegaram, ajudaram no trabalho, pois a pescaria foi muito boa, não foi melhor pela perda dos companheiros. Seu Nicolau não sabia como dar a notícia as famílias dos falecidos. Hesitou bastante, até encontrar palavras.
Deu a notícia e foi um chororó geral, todos entristeceram-se.
Venderam a pesca e rendeu um bom dinheiro para cada pescador. Porém a tristeza se apossou dos marujos, que não achavam graça em mais nada. Terminada as vendas todos seguiram para suas casas. O Senhor Nicolau preocupava-se com as futuras pescarias, pois estava desfalcado de três homens. Anunciou para todos que estava recrutando marujos, porém foi difícil encontrar contingente, visto os últimos acontecimentos com os pescadores. Depois de muito procurar ele somente conseguiu pessoal na família dos pescadores mortos. Os coitados tinham que sustentar a família órfã de pai.
Como a última pescaria foi boa, deu para ficar mais tempo em terra, chegando assim o dia de zarpar para alto mar. O senhor Nicolau preparou todas as coisas necessárias para a pescaria. Zarparam ao amanhecer da aurora, rumo ao trabalho, que apesar de perigoso era o ganha pão de muitas famílias da ilha. Povo simples que se contenta com tão pouco, mesmo que para isso tenha que dar a própria vida.
A viagem transcorria na mais serena paz, o mar estava calmo, os ventos a favor, e lá ia o barco deslizando mar a dentro, como a valsar em suas ondas. Os principiantes, garotos novos cheios de esperança, como a viver uma grande aventura, sonhada desde a mais tenra infância. Viam seus sonhos se realizando. Os outros pescadores já tarimbados de muitas aventuras e vivendo o perigo, não se empolgavam com a pescaria, para eles era mais um desafio, onde poderiam perder a própria vida em prol dos seus familiares.
Lançaram as redes ao mar, ficaram aguardando elas se encherem de peixes para recolher ao barco. Quando as redes se enchiam eram içadas ao barco, foram longos dias de trabalho pesado.
O tempo se fechou, começou a se formar grandes nuvens sobre o barco, todos muito temerosos com uma tempestade que estava se formando. Não demorou muito a chuva caiu violenta, as ondas cresciam cada vez mais, o barco era levado de um ao outro lado. Em meio a tempestade surgiu um barco das profundezas do mar. Ele estava cheio de pessoas horríveis, pareciam mortos vivos. O barco veio na direção dos pescadores, que já temiam por suas vidas. O senhor Nicolau tratou de navegar em sentido oposto, fugindo do barco.
Por mais que eles tentassem fugir, o barco se aproximava cada vez mais rápido. E finalmente dois deles pularam e entraram no barco dos pescadores, eles tinham uma aparência de Cadáveres, sem cor, sem vida, e começaram a atacar a todos os pescadores. Pareciam animais famintos devorando suas presas. Comeram e saciaram sua fome, matando a dois dos pescadores, fugindo em seguida carregando os restos mortais.
E mais uma vez os pescadores ficaram aterrorizados com tamanha desgraça que se abateu sobre eles. Nos dias que se seguiram os pescadores não tinham mais animo para o trabalho, estavam chocados com o que viram, e temiam um novo ataque.
Os pescadores temendo um novo ataque não conseguiram dormir. Ficaram fortemente abalados, alguns já pensavam em abandonar essa profissão. E mais uma vez na calada da noite tendo o céu estrelado como testemunha, os Demônios atacaram os pescadores, e observaram que entre eles estavam seus companheiros mortos anteriormente. Eram tantos que não dava para contar. Foi uma carnificina, mataram a todos com exceção do senhor Nicolau que tarimbado do mar pulou na água, enquanto os demônios trucidavam seus companheiros.
Os Demônios assumiram a embarcação do Senhor Nicolau e navegaram em direção a ilha.
O Senhor Nicolau nadou o quanto aguentou, até encontrar uma madeira, resto de alguma embarcação destruída, agarrando se a ela, jogou parte de seu corpo em cima dela, sendo levado pelas ondas até a ilha. Acordou jogado na areia da praia do outro lado da ilha. Tentou entender o que havia acontecido até recobrar sua lembrança do ocorrido no mar. Passado o susto, então já lúcido lembrou de tudo. Levantou e seguiu beirando a praia rumo a aldeia em que morava. Caminhou um bom tempo e finalmente avistou a aldeia, percebeu um alvoroço na ilha, uma correria, alguma coisa estava acontecendo ali, mas o que?
Chegou mais perto e ficou observando, quando viu os Demônios do mar atacando os moradores da pequena ilha. Escondeu-se até tudo terminar. As pessoas fugiam apavoradas, algumas chegavam até a se afogarem tentando fugir pelo mar, outras perdiam suas vidas num piscar de olhos, a ilha estava em pandemônios. Após uma carnificina, seu Nicolau saiu do esconderijo e caminhou pela aldeia, vendo o resultado daquela tragédia, não sobrou ninguém.
Seu Nicolau agora desolado em uma ilha sem saber o que fazer para seguir para o mar sem tripulação. Ficou matutando um bom tempo até surgir a ideia de buscar mão de obra em outro lugar. Assim pensando adormeceu, e quando acordou no dia seguinte o sol já havia raiado, apressou em pegar uma embarcação rumo a civilização. Chegando lá assuntou aqui e ali até encontrar pescadores dispostos a segui-lo, conseguiu uns dez. Seguiu de volta para a ilha.
No dia seguinte rumaram para o mar, em busca de pescado. Senhor Nicolau estava radiante, afinal tinha de volta sua vida que tanto gostava, o barco com a tripulação completa e a pesca que era sua distração, esquecendo assim toda a desgraça ocorrida anteriormente. Lançaram as redes ao mar, a pescaria prometia. Aguardaram as redes encherem. Ao cair da noite os marujos de primeira viagem ficaram no convés admirando o céu estrelado. Enquanto isso seu Nicolau pitava seu cachimbo despreocupadamente, como se o mar não oferecesse perigo aqueles pescadores.
Ao entardecer a temperatura começou a cair, as nuvens se formando, o nevoeiro tornou-se denso, os pescadores estavam adorando as novas experiências. Enquanto seu Nicolau ria pelo canto da boca, enquanto saboreava o seu cachimbo. O vento começou a jogar o barco. Ondas enormes abraçavam o barco, os marujos começaram a temer por suas vidas, enquanto seu Nicolau não saia nem do lugar. De repente eis que um turbilhão de Demônios invadiram a embarcação, atacando os marujos. Seu Nicolau continuava pitando seu fumo, quando um dos Demônios parecendo o líder, passou pelo seu Nicolau e disse:
- Esse é seu papai.kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk