Férias de Verão - 2 de 5

Capítulo 2

Retornamos a um pequeno hotel a beira da praia. O hotel em si não era grande coisa mas os arredores compensavam. Eu podia acordar com o som do mar batendo contra as rochas e o cheiro da maresia. Haviam gaivotas, vários barcos pesqueiros e veleiros que criavam uma verdadeira confusão de cabos e velas. Pela hora o sol começava a se pôr no horizonte, tingindo-o com cores avermelhadas. Era um belo espetáculo.

Mas todo o paraíso que me cercava desapareceu quando vi um pequeno veículo estacionado na entrada. Uma sensação ruim brotou dentro de mim... Eu tinha quase certeza que já tinha visto aquele automóvel em algum lugar.

Eu não podia estar mais certa.

- Ora, ora, ora, mas que grande surpresa... Enzo Velasques.

Torci o nariz com tanta vontade que fiquei parecida com uma pintura cubista.

- Eu que digo. A que devo sua presença aqui cara Giovana?

Giovana era uma médium que já havíamos encontrado em um episódio anterior. Um episódio particularmente desagradável. Ela tinha cabelos longos e olhos verdes, além de uma mania de usar roupas apertadas de adolescentes.

- Eu fui chamada para resolver o problema de uma maldição. Mas não sabia que você também tinha sido contratado.

- Na verdade fiquei sabendo dos acontecimentos por acaso e resolvi vir a cidade. – Enzo respondeu.

- Um trabalho filantropo? Jamais imaginei que o último Velasques passaria a sobreviver de caridade.

Enzo Velasques era o último membro de sua família e seguia com o negócio de parapsicoinvestigação que era passado de geração para geração. Eu havia sido agregada as suas missões há alguns anos atrás.

Antes que nossa conversa continuasse lá veio Rebeca, uma surfista da região. Ela era loira, com um bronzeado invejável e mais curvas do que muitos homens aguentariam. Eu não ia com a cara dela, ela me passava um olhar arrogante, mas eu não podia dizer nada sobre isso... Ela era a irmã da vítima que tentávamos ajudar.

- Senhor Enzo, boa noite, vejo que já conheceu a Giovana. Eu havia contratado os serviços dela há algumas semanas, pouco antes de vocês aparecerem.

- Pagamento adiantado. – Giovani disse dando uma piscadela e eu pensava por que o Enzo nunca fazia algo do tipo.

- Ia com ela agora ver minha irmã, passamos aqui na esperança de que vocês estivessem no quarto.

- Bom, vocês nos encontraram agora. Então podemos ir.

Enquanto o chato do Enzo, a desagradável da Giovana e a indecente da Rebeca conversavam, eu vi uma cascata de chocolate próxima a mesa de recepção. Eles vendiam frutas mergulhadas naquele líquido abençoado para os clientes e como o Enzo tinha um problema com chocolates sua única exigência para aceitar o caso tinha sido, além da estadia, todas as frutas mergulhadas que ele e eu pudéssemos comer.

Avancei na direção de uma gorda maçã logo dando uma senhora mordida.

Acho que nunca me arrependi tanto na vida.

Foi como morder a unha encravada de uma velha senhora. Acho que o gosto só não foi pior por que metade das minhas papilas gustativas haviam cometido suicídio.

Enquanto abria a boca deixando cair aquela mistura bizonha num lixo próximo, tentava identificar o que havia mordido. Foi com um extremo esgosto que percebi que alguma alma sem escrúpulos havia mergulhado uma cebola na cascata de chocolates.

Quem faria uma atrocidade daquelas?

- Não sabia que você também gostava de cebolas mergulhadas em chocolate.

Olhei para o lado e tive um calafrio. Uma pele pálida como leite. Um olhar cinza e sem vida. Cabelos vermelhos como fogo... Outra figura que já havíamos encontrado em um caso anterior.

A albina Daniela.

- Daniela? O que faz aqui? – Enzo perguntou com um olhar intrigado.

- Ela tem algumas habilidades Enzo Velasques, por isso eu resolvi transformá-la em minha aprendiz. – Giovana falou e aquilo me deixou surpresa, nunca havia percebido nenhuma habilidade mediúnica naquela mulher.

- Está anoitecendo, mas ainda podemos ir ver minha irmã se quiser Giovana. – Rebeca disse. – Quem sabe depois poderíamos jantar. O senhor e sua filha também estão convidados.

- Perfeito, temos muito o que conversar no caminho. – Enzo disse

- Por mim está ótimo. – Giovana respondeu.

- Eu não sou a filha dele! – Disse cuspindo cebola e chocolate para todo lado.

Capítulo 3

Apesar de terem nos oferecido um jantar, eu gostaria de poder tomar um banho antes. Estava com seis horas de suor e terra em cima de mim, mas como o Enzo estava afim de encontrar com a Júlia, irmã da Rebeca, de novo, minha vontade e minha higiene ficaram para lá. Por isso caminhávamos pelos calçadões da cidade e eu ouvia a Rebeca repetir a história que já havia nos contado.

- Então, basicamente, não é uma maldição.

- Nossa mãe trabalha com exoterismo e coisas do tipo. Na verdade eu não sei direito por que nunca me preocupei com o que ela fazia. – Rebeca explicava. – Até por que aquilo não era um trabalho, mas sim uma fonte de gastos. Ela vivia fazendo doações e gastando o dinheiro em artigos de gosto duvidoso. Os anos de gastos descontrolados acabaram empobrecendo minha pobre mamãe e no fim da vida, quando precisou do dinheiro para tratar um câncer, ela não tinha.

- Por isso ela faleceu? – Giovana questionou e Rebeca assentiu.

- Eu digo que a cura de todas as doenças existem, se você tiver dinheiro para pagar por ela...

- Eu só não entendi onde entra a parte da maldição. – Daniela perguntou dando uma barulhenta mordida em sua cebola achocolatada, o que quase me deu embolia.

- Antes de morrer mamãe disse que daria um presente para nós, algo que não deixaria que acabássemos como ela. Ela começou a fazer um tipo de ritual sobre suas coisas para que quando as herdássemos a magia viesse até nós. O problema é que ela morreu no meio do processo.

- Um jogo de jantar e um broche foram as únicas coisas enfeitiçadas. Com medo disso as jovens jogaram essas coisas no lixo, só percebendo depois que haviam cometido um erro. – Enzo explicou porque já ouvira essa parte, ao término apresentou a colher que havíamos encontrado.

- Você encontrou!

- Todas as vinte e quatro peças estão juntas agora. Podemos fazer um ritual de desencanto e livrar sua irmã de toda a maldição agora.

- Parece que eu só vim para receber. – Giovana comentou com um sorriso furtivo e eu senti muita inveja naquela hora.

Nós havíamos chegado a casa que Rebeca e Júlia herdaram de sua mãe. Elas também viviam com Clarinha, filha de Rebeca, uma criança bem barulhenta.

- Mamãe!

Clarinha se atirou sobre a mãe que a pegou no colo. Não dava para dizer que elas não eram parentes. Clarinha era uma versão miniatura da mãe, só não tinha suas curvas.

Quando entramos só era possível ouvir os lamentos que segundo Rebeca nunca mais abandonaram a casa. Júlia sofria muito com tudo aquilo.

- Eu ainda não sei que espécie de feitiço pegou sua irmã. – Giovana perguntou.

- Querida, pode ir colocar pratos extras para o jantar? Eu vou com essas pessoas lá em cima ver a tia Jú e já descemos.

Clarinha fez um bico.

- A tia chorou o dia todo.

- Eu sei amorzinho, mas logo ela via ficar bem, essas pessoas estão aqui para ajudá-las.

Com um beijo Clarinha se despediu e nós subimos para o segundo andar. O quarto de Júlia era logo no fim da escada e ao abrí-lo nos deparamos com uma grande surpresa.

Havia uma corda pendurada no teto e o corpo de Júlia pendia enforcado nela.

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A todos que estão acompanhando, obrigado! O conto continua segunda 19/11

Gantz
Enviado por Gantz em 17/11/2012
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