Segredos do Pântano - parte I

O Pântano tem muito segredos, local sombrio, amedrontador, evitado. Envolto por uma atmosfera de natureza sinistra, ali muitos pereceram, ali os corvos fazem a festa junto com os jacarés, despojados carcaças que apodrecem boiando na lama escura.

Após rápida perseguição a carruagem reduziu a sua velocidade sob o aperto dos arreios, os policiais desceram, com armas em punho. Trocaram alguns disparos com o facínora, que num momento de desespero se jogou da ponte e desapareceu nas águas escuras e fétidas.

- Veja, não morreu, nada até a outra margem.

Disse um dos policiais, soltando um último disparo na direção do fugitivo.

- Será o seu fim, está indo na direção do pântano. Dali ele não voltará, não terá escapatória.

- Por quê diz isso?

- Todos os que perseguimos até aqui não voltam, e os que retornam são encontrados loucos, dizendo frases desconexas, perdem a razão.

- O que vamos dizer ao chefe de polícia?

- Que o facínora fugiu, ora, e o pior, levou o alforge com o dinheiro do barão.

Londres – a cidade crescia, sinal de prosperidade. O porto a pleno vapor, repleto de navios mercantes. As indústrias ali se instalavam, dando oportunidades de trabalho para o povo londrino e para os imigrantes que chegavam abarrotados nos navios de passageiros, nas dependências de terceira a quinta classe. Vinham de todas as partes da europa, e até de países muito distantes, como China, EUA e Argentina.

Londres, a cidade da prosperidade e do pecado. O comércio varegista e a indústria de tecidos crescia, e o número de pensões, dormitórios, hotéis, além dos cortiços e de prostibulos.

Jamill Stuarth era um jovem recém-chegado. Assim que chegou foi trabalhar no porto, era estivador de armazém. O serviço era braçal e de parcos ganhos – dava apenas para comer e ir gastar numa pub, onde bebericava uma garrafa de licor de passas, o seu predileto. Quando dava, o dinheiro sobrava visita um conhecido prostíbulo próximo ao porto. O seu quarto era um dos armazéns, a cama improvisada eram as sacas de fumo, milho, cereiais diversos.

Longe dali, no pântano, Gregor, um vagabundo que recusara o serviço braçal e duro do porto. Vivia de pequenos furtos, até que percebeu que poderia ganhar mais sem muito esforço. Agenciava pela noite as prostitutas do porto – algumas por ele foram dominadas, até que descobriu uma ninfetinha, de apenas quatroze anos que poderia atrair ricos comerciantes, médicos, advogados e estrangeiros endinheirados para os seus golpes, assaltos perfeitos. Mas, naquele dia algo deu errado, e o barão não tomou a bebida com o sonífero. Agrediu á menina, esbofeteando-a e tomando o alforge com uma pequena fortuna que teria que levar para uma de suas filiais. Quando a viu, seduzido por tamanha beleza juvenil foi atraído para o muquifo, onde o roubo aconteceria. Gregor Spartakus, ouviu quando a vítima, dentro do quarto mencionou sobre o dinheiro que tinha no alforge. Saiu do cômodo, onde estava escondido com um punhal, o golpeou nas costas, o homem berrou e caiu ao lado da cama esvaindo-se em sangue. A menina gritava de pavor, então, o facínora pegou do alforge. Os seus olhos faiscaram quando viu a quantidade de cédulas que ali estavam.

Fugiu, quando a menina voltava com a polícia. Foi perseguido por dois policiais, enquanto o terceiro tratava de buscar um médico, pedindo o auxílio da menina – esta evadiu-se num vacilo do policial, não queria ter problemas com justiça.

Jamill Stuarth, apesar de pobre, beirando à miséria, era honesto e sonhador. Admirava os homens que voltavam da França, com tamanha formação intelectual e de educação. As damas jovens que la aprendiam a ter requinte. Sonhava, um dia poder conquistar uma delas, casar-se e ser admirado, até invejado pelos demais. Compraria uma tabacaria, teria uma charrete ornadas com decorações em dourado e branco. Exportaria tabaco para a França.

O pântano era assustador aos olhos de Gregor Spartakus, porém, quando para ali se aventurou, era tudo ou nada. Tinha uma pequena fortuna nas mãos, valeria apena arriscar. Ser preso seria um fracasso desmedido, iria para a forca. Caso fosse preso, poderia receber um tiro no peito e ter o dinheiro nas mãos dos policiais – quem garanteria que voltaria para o seu dono?

Embrenhava-se cada vez pelo pântano, o solo sempre lodaçal, alagado. Uma água escura e fétida. A vegetação expessa, as árvores de aspecto sinistro, de caules retorcidos, as raízes altas e vastas, cobertas pelo limo e por filetes menores, como se tivessem grossos pelos – pareciam vivas a fita-lo. Estava tenso, inseguro, amedrontado. Perguntava-se para onde deveria seguir. A tarde se aproximava do fim, já se desenhavam os filetes rubros no traçado reto do rio, onde havia a linha do horizonte. Notava répteis de aparência amedrontadora, jacarés seguiam na sua direção quando o avistavam, Gregor, com dificuldade se movimentava, tendo a água até os joelhos, dava preferência, em se manter próximo das grandes raízes expostas, ali poderia se defender de um ataque. Ficava em pânico quando tinha a água até ao peito, um ataque seria fatal. Depois de muito andar, enfim, encontrou vasta vegetação, árvores de caules frondosos, copas de árvores cheias. A noite se aproximava, quando foi surpreendido por um som que lembrava a voz humana. Protegido pela vegetação foi na direção da voz, esta foi aumentando de intensidade, até que para sua surpresa, viu um homem, de aspecto sofrível, tinha o cabelo em desalinho, os olhos esbugalhados. As roupas sujas, em frangalhos, babava feito um louco varrido e dizia:

- Eternamente, não, por favor, não, deixem-me ir...socorro eu quero sair daqui, eternamente, não, deixe-me ir, quero a minha liberdade...

Este passou pelo fugitivo, atônito sem o notar, caia e levantava, se chocava contra as árvores, depois caiu na lama negra e sumiu gritando, feito um louco.

- Ora, seja la que o tenha assustado, não me assusta. Pareço que estou perto da morada de alguém, sim, caçadores, talvez habitem por aqui. Existem os que exploram as riquezas naturais desta área. Seguirei, melhor encontrar o Capeta pela frente do que morrer perdido e servir de repasto para os jacarés.

Á noite Jamill Stuarth, poderia naquela noite ir ao bordel de madame Zolla. O bordel se dividia em dois cômodos, o térreo era para os menos abastados, o primeiro e segundo andar para os afortunados. Os quartos ficavam num vão que ficava nos fundos do segundo andar.

O bordel funcionava numa rua estreita e curta. Ali, tinha as prostitutas de rua, estas dividiam a clientela com as da casa – que eram mais chiques, requintadas. Vinham de outras cidades da europa, principalmente de Paris. Falavam mais de duas línguas e cobravam pelo preço da morte, o comércio dos seus corpos.

A iluminação da rua do bordel era parca, luminárias públicas iluminadas á óleo de baleia. As ruas eram frequentadas áquela hora pelas prostitutas, pelos vadios, ladrões, exploradores das mesmas, estivadores briguentos, baderneiros-a pária social. Os homens de bens, endinheirados traziam os seus protetores armados. Quando chegavam os grande navios de passageiros da França, Holanda e Portugal, o movimento de policiais era intenso, podia ser ver ao longo da madrugada os apitos dos policiais, até que o dia raiasse – tiros, também, e gritos de gente alvejada, confundindo-se com o ladrar dos cães raivosos.

O frio era intenso na noite londrina. Dentro do bordel reinava uma atmosfera de bar. As conversas se confundiam, em diferentes timbres de vozes. O ar irrespirável, abafado pelas baforadas de charutos e de cigarrilhas de menta. Ali se bebia, joagava o carteado e alguns homens, principalmente, os mais jovens, trazidos pelos pais subiam as escadas, de braços dados com uma jovem prostituta na direção dos quartos.

Jamill estava solitário, ocupava uma mesa no térreo, ali estava por que no encerramento ajudaria a fechar, e faria a limpeza do salão. Acima de sua mesa, no primeiro andar estava uma mesa ocupada por quatro senhores, dava para ouvir o que diziam, apesar do barulho do local. Um pianista tocava can-canacelerado. Prostitutas jovens, lindas, sempre com um sorriso maravilhoso no rosto juvenil dançavam despreocupadas com o estilo de vida vadia que levavam, sem pudores, de futuro incerto. Pareciam serem as mais felizes das mulheres. Algumas estavam bêbadas, exibiam os seios e as coxas , daria um belo quadro de Degas.

Um dos senhores, da mesa do andar de cima falou:

- O barão Hernannis vai sobreviver, o golpe não foi profundo, a lâmina , por sorte estancou numa costela, esta protegeu o pulmão ser perfurado.

Dizia Hercull, um médico formado na Grécia, tinha um consultório próximo do porto.

- E o dinheiro?

Indagou Phillips, um rico exportador de tabaco, e amigo pessoal da vítima, sorvendo uma farta dose de run.

- O facínora fugiu, entrou no pântano, a polícia não o perseguiu.

- Nossa, quanto havia no alforge da empresa?

Inadagava mister Klose, um alemão que tinha um escritório de advocacia.

- Uma pequena fortuna, o bastante para um homem mudar de vida, começar um pequeno negócio e não precisar trabalhar mais para ninguém.

Respondeu o médico, soltando fartas baforadas do seu charuto cubano. Enquanto dispunha as cartas á mesa. Apostavam valores de pequena monta. Mulheres cercavam à mesa, feito lobas em busca da presa.

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 28/10/2012
Reeditado em 07/11/2012
Código do texto: T3955787
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