Possuída pela fugitiva do inferno
Chovia. E justamente no meu primeiro dia na faculdade de engenharia!Droga!
Armo meu guarda-chuva roxo. Parecia uma violeta desabrochando. O mesmo acontecia com os passantes, que protegidos debaixo de seus guarda-chuvas pareciam verdadeiras águas-vivas coloridas. Olho meu relógio: 6:30. Tinha pouco menos de uma hora e meia pra executar todo o trajeto até chegar à faculdade. Olho pra esquerda e pra direita; atravesso a rua. Tinha que ganhar tempo...
***
Que tédio... Do que adianta fugir do inferno e não ter o que fazer? E principalmente quando se está presa numa casa velha, que rescende a mofo.
Por que não saía? Porque simplesmente não tinha forças o suficiente!Gastei-a quase toda, tentando passar despercebida por Cérbero o cão do inferno... Solto um Muxoxo de tédio...
Pensava nisso , quando eis que se aproxima de meu cativeiro uma mulher, que empunhava um guarda- chuva violeta.
--Yeah!Enfim, encontro um recipiente para eu possuir... —digo estalando minha lingüeta bifurcada.
***
Tomava um atalho, pois levaria menos tempo. Passava por perto de uma antiga casa quando me chamam:
--NOEMMMMIII!!!!
Estaco. Procuro pela dona da voz. Não a encontro. Fico olhando pra velha estrutura que era aquela casa. Ela tinha janelas quadradas. Uma delas tinha o vidro quebrado.
-- NOEMMMIII!!!!—chama-me novamente uma voz feminina de tom desdenhoso. E foi pela aquela janela de vidro quebrado que vejo um vulto. Quando digo um vulto é porque no momento não consegui distinguir o que era...
Quem poderia ser?Seria algum serial killer, que estivesse em busca de fazer mais uma vitima? Não. Pouco provável. Contudo, a rua onde a casa ficava, estava completamente deserta. Excluindo obviamente um cachorro, que perseguia ferozmente um gato que tinha abocanhado um rato.
Tinha que me decidir logo... Não podia ficar ali o dia todo.
--NOEMMMIII!!!!
Chamam-me outra vez. Meu coração dizia para eu seguir em frente e esquecer aquilo, todavia, meu cérebro me mandava descobrir quem era. Seguiria a razão ou a emoção? Decido-me pela razão. Desde muito pequena sempre tive uma curiosidade absurda.
Passo pelo portão de ferro, caminho pelo um jardim com plantas secas e árvores mortas até que galgo alguns degraus, parando em frente duma velha porta de carvalho. Ia bater na porta só que esta se abre sozinha...
***
Acho que brincarei um pouco com ela... A assustaria e depois a possuiria. Gargalho.
***
Adentro ao hall de entrada e deixo o guarda-chuva, murcho gotejando. O forro da casa era todo constituído por várias teias de aranha. A casa parecia estar abandonada há séculos. Exala um cheiro insuportável de mofo, chegava a ser nauseabundo.
Por um momento, pensara que não havia ninguém por ali. Preparava-me pra deixar a casa quando:
--NOEEMIII!!!—novamente a mesma voz me chama. Parecia vir de algum cômodo de cima. Subo a escada de madeira correndo. Uma coisa eu não tinha dúvida: descobriria quem era o engraçadinho custe o que custasse.
***
Como os humanos conseguiam ser tão tolos?Eles são uma verdadeira piada!Lá vem ela... Atravessava o corredor, as tábuas do assoalho lhe gemendo sob os pés... Corro pra uns dos quartos existentes da casa, fechando a porta atrás de mim com muita força... Noemi tenta abrir a porta... A impeço... E grito mais uma vez:
-- NOEMIII!!!!
***
Droga! O babaca ou a babaca –—ainda não tinha certeza quanto ao gênero— que estava trancado nesse quarto. Bato com meus punhos na madeira da porta:
-- QUEM É VOCÊ SEU IDIOTA?ABRA A PORTA COVARDE!MOSTRE A CARA—grito. Nesse momento a porta se abre. E eu entro curiosíssima para desvendar quem era.
***
Vendo-a de frente até que era bonita... Seria bom ter um corpo como aquele. Tinha cabelos loiros quase platinados, olhos castanhos escuríssimos e lábios finos delicados que estavam pintados de vermelho.
Chega de brincar de gato e errado, Estava na hora de ser liberta... Fecho a porta. Via-se estampado, em sua face, o terror mais puro.
-- NOEMMIIIII!!!AQUI Ó....—berro.Me procurava dum lado e do outro. Parecia uma originalíssima barata tonta.
-- AQUI Ó...—grito de novo só que dessa vez,vou materializando meu corpo.Gradualmente. Se pudesse, teria fotografado a cara de espanto dela.
***
Que estranho. Não havia ninguém naquele quarto. Do qual exalava um cheiro estranho que quase faz eu vomitar... Parecia enxofre.
De repente uma voz, agora tinha a certeza absoluta, de ser mulher, grita pelo meu nome. Fico a procurar pra ver se não havia algum microfone por perto... Não, tinha.
Um vento frio e cortante penetra pela janela de vidro quebrado. Quem seria? Não conseguia pronunciar nenhuma palavra. Meu coração parecia um pássaro preso na gaiola, qual sentisse a presença do perigo e começasse a pular insanamente tentando escapar de sua prisão.
Mais uma vez aquela voz feminil grita por meu nome. Estava paralisada. Seria algum fantasma?
Não, não acreditava nessas coisas. Não existiam. Contudo o que via em minha frente tomando contorno, não era um serial killer e nem muito menos um fantasma. A “coisa” era um espécime de fumaça negra, um ser etéreo que ia moldando-se, tomando corpo de mulher...
O ar me faltava... Ela se aproximava de mim...
***
Sentia o medo evaporando de seus poros. Seria um prazer ter aquele corpo só pra mim. E depois, se eu me enjoasse dele procuraria outro... Fazia ela se suicidar e pronto. Estava livre pra escolher outra casca.
Meus olhos avermelhados chispavam ansiando pelo desejo da posse. Pelo desejo de se ver livre. Enfim livre!
Fico a olhando. Minha lingüeta subia e descia. Aproximo minha mão de seu rosto... Ela suava... Dou um sorriso de escárnio.
***
Aquela coisa estava em minha frente. Seus olhos pareciam duas brasas incandescentes. Estava tão perto que podia sentir seu hálito fétido qual cheirava a morte... Acariciava minha pele com aquela sua mão negra de ébano. Uma mão quente, que ardeu quando tocou minha derme...
O que aquela sinistra criatura queria comigo?
***
Chegou o momento...
***
A criatura de chofre desaparece. Some no ar... Onde ela estava?Respiro fundo. Agora podia descansar... Começo a tossir. Minha garganta parecia se engasgar era como se alguém a estivesse dilacerando. Tombo de joelhos no chão; meus olhos começam a lacrimejar e minha narina ardia.
Em certo momento, não vejo mais nada...
***
Aninho-me em seus músculos, rastejo-me por seus ossos a incendiava toda. Como era bom aquilo! Possuir um corpo de carne e osso. Pronto! Instalo-me em seu cérebro como um parasita. Aos poucos vou tomando conta dele.
Levanto do chão. Aquilo era delicioso. Abro a boca de minha nova morada e grito:
-- UHUUUUU!!!
***
Estava à frente da porta. Mais alguns passos e estaria livre dessa maldita prisão. Agora sentia-me mais forte.Torço a maçaneta de minha porta e...
-Olá, Lila como vai indo? Não acha que está na hora de voltar?
Petrifico. Aquele era Parrison uns dos caçadores do inferno, que levam os demônios fugitivos de volta a seu lugar. Ele habitava um mortal de cabelos moicano na cor vermelha. Era um originalíssimo Punk. Tento fechar a porá na cara dele mais ele me impede.
Ele era um caçador e com isso ele era muito mais forte do que eu... Eu peço:
--Por favor, não me leve eu te imploro...
Ele me dá um sorriso sardônico como resposta e depois diz:
--Vejo que você encontrou um corpo... Que por sinal é muito... Sexy —disse num tom voluptoso.Sorrio levantando um pouco a barra do sobretudo preto deixando um pouco a mostra as minhas pernas tenras,alvíssimas como leite.
-- Você acha?—pergunto.Ao que ele assente com a cabeça.Beijo –o intensamente. Nossas línguas se enroscavam feito duas cobras ferozes brigando por alimento, por prazer. O beijo era intenso... Parecia que estava sendo sugada... Aspirada para dentro de Parrison.
Parrison me enganara! Estava sendo tragada para dentro dele. Não conseguia interromper... Não tinha escapatória... Maldito!Abandono minha nova morada.
***
-- Onde estou?—digo passando a mão pela minha cabeça. Nossa como ela doía. Olho. Estava no hall duma casa. Que estranho. Não consigo me lembrar de completamente nada. A porta estava aberta... Chovia torrencialmente lá fora.
Consulto meu relógio: 6:40. Droga! Tinha pouco tempo para chegar à faculdade. Era meu primeiro dia no curso de engenharia.
Armo o guarda-chuva e saio daquela casa velha e estranha.
E aí gostaram? O que acharam? Comentem...