O Aborto
Nossa vida é cheia de reviravoltas, incidentes, acidentes, é cheia de amor e ódio, nossa vida é tão cheia e tão vazia...
...
Ela tinha os olhos esverdeados, aquela mesma cor que dizia tanto de sua juventude, revelava também sua idade, ela, ainda verde para tudo o que estava vivendo.
Olhando para placa que jazia dependurada á porta, sentiu raiva de si mesma e de toda sua ingenuidade. Lembrou-se de conversas que teve com sua mãe, lembrou-se de tudo que poderia ter ouvido melhor, e aquilo mostrou apenas o quanto ela era culpada.
Inconscientemente uma musica chegou aos seus ouvidos...
Certo dia uma jovem bem jovem me disse:
'Fernanda estou grávida, e agora?'
Suas mãos eram negras e frias
Tremiam suavam, buscavam as minhas mãos
Ela me revelou que chorava e pensava em aborto
Ela me revelou que chorava e pensava em morte
Ela me revelou que chorava e pensava no cara
Sozinha, chorava...
Ela entrou naquele corredor ao som eloqüente de um espírito que vivia dentro de si e a duvida cada vez mais pairava em seus pensamentos.
A dor, o tormento, os argumentos do sim e do não atravessavam as quatro janelas de seus tímpanos, vozes ecoadas de uma guerra interna entre um anjo e um demônio pairados sobre seus ombros, lhe persuadindo de forma sucinta.
Ao som da melodia ela sentou-se, aturdida. Olhar para aquelas adolescentes sentadas ao seu lado. Algumas tão decididas e outras ainda mais confusas do que ela.
Ouviu-se o ranger da porta branca, o mesmo branco que simbolizava a paz estava ali em todo aquele ambiente. Seria ele realmente capaz de lhe trazer a placidez que ela tanto queria.
O branco, a cor que alguns diziam, aliviava a sensação de desespero e choque emocional, a cor da libertação as opressões. Mas a pressão que aquele momento lhe sugeria era algo surreal, e as idéias que cresciam desmedidas em sua mente eram obscuras e imorais, ou seriam apenas convencionais?
- Tum... Tum... – Não havia som, mas ela possivelmente o ouviu bater. Apenas três curtos meses e naquele momento tão inoportuno ele resolvera se manifestar.
Olhou confuso ao seu redor e a porta mal se abriu e uma mulher de cerca de trinta anos saiu da sala em lágrimas.
- Próxima! – Disse uma voz rouca e tão feminina que surgira logo após.
A segunda mulher, ironicamente também trajando branco saiu do consultório, ainda dava para sentir o cheiro de sangue nela. Olhou para todas as três garotas que restaram, as outras não tinham mais que dezessete anos e estavam acompanhadas.
Uma estava abraçada a mãe, a outra estava ao lado de um senhor mais velho, não estavam sequer de mãos dadas, mas ele esfregava as mãos constantemente uma na outra, deixando claro seu nervosismo. Já a terceira era deficiente, tinha síndrome de down e ao seu lado estava um jovem rapaz um pouco mais velho que ela.
A mulher, que era na verdade a enfermeira estava ali ainda aguardando a entrada da paciente.
- Rapaz, é a vez de sua irmã! – Ela disse rispidamente apontando com os olhos para a menina de olhos diferenciados
O garoto olhou para a mulher e para irmã e então amaldiçoou seu próprio pai enquanto ela murmurava.
- Não quero isso papai, brincar é ruim! É muito ruim, papai! Isso dói! – Ela repetia em vão.
- Levante-se, Ema, vamos entrar – Ele disse com a voz tranquila e apreensiva. Segurou as mãos pequenas de sua irmã e a porta se fechou atrás da silhueta de ambos.
Nayara ainda estava sentada, seus olhos varrendo toda aquela área e catalisando o universo de emoções que orbitava por ali, quando foi desperta pelo toque do celular da enfermeira.
- Oi, filha! Nossa, o dia ta cheio por aqui – Dizia a mulher tentando baixar a voz para omitir a conversa. Querida, fique tranqüila, vai dar tudo certo. Tudo vai se resolver, sei, eu sei como você está – Ela pausava, olhava para o relógio e depois para a fila de espera – Sei que está preocupada com a prova. É a ultima né? Ah, meu bem, sei que irá vencer, e logo estaremos as duas rindo em sua formatura. Estaremos sempre juntas meu amor, saiba que pode contar comigo, você sabe disso não é? – Ela ficou calada por meros segundos e tão logo o tempo rugisse ela sorriu e Nayara pode ver o brilho naqueles olhos.
Foi então que o som exacerbado do grito da pobre menina saiu do consultório.
- Eu preciso de ajuda, aqui! – Gritou o doutor, chamando a enfermeira e então ela voltou a ouvir aquela voz, aquela mesma melodia que até o momento era tão agressiva aos seus propósitos.
Eu sei como difícil pode ser
A dor de quem não fez por merecer,
Eu sei o que é querer e não poder
O que é sonhar com uma criança em meu ventre
Falei do sonho que era conceber
Contei quantos perdi sem merecer
Chorei, e implorei em oração
Não mate essa criança inocente
Ela foi escolhida dentro do teu ventre.
Ela estava sozinha, o pai da criança simplesmente a havia abandonado. Sua mãe já havia lhe dito que deveria ter tomado cuidado.
Ela ficou furiosa quando soube de tudo, quando soube que sua filha, criada na igreja, uma moça que tinha tanto entendimento das coisas de Deus poderia ter se entregue da maneira como aconteceu. Se deixar levar pela lábia de um playboy qualquer.
- Deus, porque fiz isso? – Ela se punia, queria entender o porquê de tudo ter dado tão errado. Ela estava apaixonada, e uma única vez se entregou a seu namorado, que até então dizia repetidas vezes que a amava.
Entretanto após a noite de sexo ele simplesmente não queria mais nada com ela. O tempo passou rápido demais, e quando ela decidiu recomeçar, os sintomas vieram. Tonteira, enjoo, e por fim o exame de gravidez.
Ela estava no banheiro de sua casa, sua mãe trancada no outro quarto. Quando ela caiu em si, seus olhos vislumbraram o esperado e ela simplesmente decidiu que não podia deixar que aquela criança nascesse.
Agora ali estava ela, era a próxima da fila. Ouviu o som da porta ranger novamente. Viu a menina sair ao lado do irmão desconsolada.
Ela teve certeza que aquela pobre menina não poderia ter aquela criança. Talvez o aborto fosse um pecado, mas não naquele caso. E então a voz da enfermeira chegou lasciva novamente.
- Próxima! – E ela se levantou, sentiu seu coração apertado e os olhos marejaram, mas ela estava sozinha. Sua mãe nunca a entenderia, olhou para sua barriga, pousou a mão por sobre a saliência que a denunciava e pediu perdão aquela criança.
- Me desculpe, eu não posso, eu sinto muito – ela disse enquanto caminhava em direção a porta. Olhou para a próxima garota, que a olhou tão decidida. Seus olhos esbanjavam ódio, a barriga dela ainda estava maior, ela deveria estar entre o quarto e quinto meses. Nayara baixou os olhos e continuou a andar enquanto o médico a chamava com as mãos e aquela conhecida musica continuava a lhe visitar, porém agora ela tinha certeza que a ouvia, que ouvia aquela conhecida voz.
Eu sou a voz que você nunca ouviu
Mamãe, o beijo que nunca te traiu
Eu sou e quero ser como você
Serei seu maior presente, me deixa nascer!
- Não faça isso meu amor! Pelo amor de Deus, podemos fazer isso! Essa criança pode nascer, eu te ajudo a cuidar dela – Disse a mãe ao terminar de cantar aquele suave refrão.
- Mãe? Mas como – ela dizia.
- Eu vi o site que você pesquisou, tinha o nome desse lugar lá. Pelo amor de nosso senhor Jesus Cristo, não faça isso. Você tem a mim. Eu estive trancada naquele quarto por dias, orando por você, pedindo para que Deus colocasse você novamente no caminho dele. Essa criança é uma luz.
- Você não está brava comigo? – A filha perguntou.
- Querida, sou sua mãe? O amor deve ser maior que tudo. Não digo que o que fez é certo, mas isso? Essa criança não tem que pagar pelos seus erros, ela é justamente uma missão que Deus te deu para que possa aprender com eles. Cuide dela, dê a ela todo seu amor.
Nossa vida é cheia de reviravoltas, incidentes, acidentes, é cheia de amor e ódio, nossa vida é tão cheia e tão vazia... mas, se temos alguém que nos apóia, que nos abraça, que nos alerta, ah, tudo fica bem mais fácil.
- Me desculpe mamãe! – Nayara disse correndo na direção da mãe e abraçando-a em lágrimas.
- Sim, mas com uma condição – A mãe impôs.
- Mãe, eu já ia voltar para igreja – Ela dizia.
- Não filha, não é isso, Deus sabe bem o que quer, ele conhece seu coração e te guiará. Só queria que se fosse menina, ela se chamasse Fernanda.
Fim!
A letra da música é de Fernanda Brum, o titulo dela é "Aborto Não".
É complicado falar de aborto, cada um vive, cada um morre, a salvação é individual, a vida é muito individual mesmo com todas suas ramificações. Não da pra julgar, nem mesmo entender a dor que cada um sente, mas que dói ver qualquer que seja a oportunidade de vida ser massacrada, isso dói.
Tempos difíceis esses nossos.
Um aborto ou interrupção da gravidez é a remoção ou expulsão prematura de um embrião ou feto do útero, resultando na sua morte ou sendo por esta causada. Isto pode ocorrer de forma espontânea ou induzida, provocando-se o fim da gestação, e consequente fim da atividade biológica do embrião ou feto, mediante uso de medicamentos ou realização de cirurgias.
O aborto induzido, quando realizado por profissionais capacitados e em boas condições de higiene é um dos procedimentos mais seguros da medicina atual. Entretanto, o aborto inseguro, feito por pessoas não-qualificadas ou fora de um ambiente hospitalar, resulta em aproximadamente 70 mil mortes maternas e cinco milhões de lesões maternas por ano no mundo. Estima-se que sejam realizados no mundo 44 milhões de abortos anualmente, sendo pouco menos da metade destes procedimentos realizados de forma insegura. A incidência do aborto se estabilizou nos últimos anos, após ter tido uma queda nas últimas décadas devido ao maior acesso a planejamento familiar e a métodos contraceptivos. Quarenta por cento das mulheres do mundo têm acesso a aborto induzido em seus países (dentro dos limites gestacionais).
Historicamente, o aborto induzido vem sendo realizado através de diferentes métodos e seus aspectos morais, éticos, legais e religiosos ainda são objeto de intenso debate em diversas partes do mundo.
Reportagem tirada do Wikipédia nesse link http://pt.wikipedia.org/wiki/Aborto - leiam na integra!
No mais, sejam sempre bem vindos!