O espelho de mão (Quarta e última parte)
Olhava-me ao espelho. O vestido ficara ótimo!Tinha um bom caimento. Minha mão contornava minha cintura, sentido a lisura do tecido. Estava tão feliz!Tudo estava dando tão certo!
A única coisa que achei completamente chata é que papai e mamãe partiriam hoje. Iriam à casa de vovó, pois ela estava muito doente. Se não fosse pela formatura eu teria ido. Contudo, nada me tiraria o prazer de ver a cara de Sandra, vendo-me sendo coroada como a rainha do baile.
Vou retirando um a um os bobs do cabelo. E num legitimo efeito dominó, as cascatas de cachos vão caindo. Estavam divinais. Esparjo um pouco de laquê para que elas perdurem. Finalizo a maquiagem passando um gloss sabor morango selvagem. Ah! Quase ia me esquecendo de passar o perfume. Banho-me com duas borrifadas. Pronto! Estou preparada para ocupar o trono.
Consulto meu relógio. Sete e meia. Busco meu celular na minha bolsa carteira. No qual havia a seguinte mensagem:
Já stou chgndo amor!
Enviado por: Fabrizio
Havia a muito avisado Fabrizio sobre a formatura. Disse a ele que dançaria a primeira falsa com Brad e depois, passaria o resto da festa junto com ele. Se não estivesse namorando...
Porém, o que importava era que seria coroada. Isto significava muito na historia daquela escola. Alguém havia, enfim, derrotado Sandra Sanders. Uhu! Ponto! Começo a rir... Quando alguém bate a porta.
-- Olá, filha já está pronta?—era mamãe. Pude ver através do espelho da penteadeira o quanto os olhos dela faiscaram de amor e admiração.
-- Sim estou. O que acha?—pergunto dando uma voltinha.
-- Você esta linda filha!—exclama a mãe coruja.
-- Cadê, o papai?—pergunto.
-- Foi junto com Beto retirar o carro da garagem... —houve uma pausa. —Tem certeza de que não quer ir conosco?
Penso. Ir ver minha vó doente ou curtir um baile de formatura como rainha. Abaixo os olhos e digo:
-- Não, mãe. O baile vai ser muito importante para mim...
-- Então tá... —diz- me ela me abraçando como uma mãe urso a seu filhote. Nesse momento meu coração revirou-se. Um sentimento novo nascera. Difícil de exprimir em palavras ou sentenças. E foi nessa hora que a abracei como nunca havia abraçado. E disse o que nunca havia lhe dito.
-- Mãe... Amo muito vocês... —de repente lágrimas mornas e sinceras rolaram de meus olhos.
-- Ei, ei querida... Que isso. Não chore ou a maquilagem borrará... —disse-me ela tentando me alegrar. Sorrio.
De repente a buzina do carro de papai soa, quebrando aquela atmosfera de silenciosa e inteligente que fora criada em nossa volta.
-- Papai vai vir, não?—pergunto.
-- Não, acho que não.
-- Então tá. Diz à vovó que mando mil beijos a ela.
-- Pode deixa. E se divirta. —me dá um ultimo beijo na face e desce a escada.
***
Meia hora depois, o carro de Fabrizio anuncia com, uma buzinada, a sua chegada. Finalmente, o cavaleiro viera buscar, a sua princesa, pra levá-la ao baile. Dou uma última olhada no espelho da penteadeira e retoco um pouco a maquilagem. Olho minha imagem no espelho. Disparo um beijo pra ela. Perfeita!
No entanto, precisava fazer algo. Lá fora Fabrizio já dava sua terceira buzinada. Ele que esperasse.
Pego do meu precioso e encantado espelho de mão e beijo os lábios de minha irmã. E agradeço:
--Obrigada, por tudo!
E saio deixando o espelho dos desejos deitado em minha cama.
***
Minutos após, da saída de Suzanne o espelho começa reluzir fortemente. A parte oval e espelhada do objeto imitia uma luz branca e forte. E com isso uma sucessão de fatos começa a desenrolar-se: um carro preto rodava na estrada. Adentramos ao veículo, no qual, podemos ver nitidamente os seus ocupantes: um homem, uma mulher e um garoto de aparentemente dez anos. Reparando bem... Aqueles eram os pais de Suzanne!
De súbito, uma chuva forte começa a cair. Do nada. Apesar de a meteorologia ter anunciado que a possibilidade de chuva era de zero porcento. Porém, aquela chuva caía torrencialmente. Ficava-se quase impossível de se ver algo.
Em determinado momento um dos pneus dianteiros é perfurado. O que ocasiona um leve desequilíbrio no automóvel, fazendo com que este atravessasse a outra faixa. O carro rodopiou algumas vezes na pista. Até que estaca. Estariam salvos? Não, não estavam.
Neste exato momento um motorista de carreta aproximava-se. Ele não conseguia enxergar completamente nada com aquele vidro embaciado. Tentou diminuir a velocidade, no entanto, algo de muito estranho acontece. O pedal do desacelerador estava quebrado. Pisa várias vezes na tentativa de conter a velocidade crescente. Infelizmente seus esforços foram inúteis.
Enquanto isso no carro, os pais de Suzanne tentavam desesperadamente saírem do carro. Todavia, as portas do carro não abriam. Eles estavam apavorados. Até que... Até que... Uma luz de farol fora se achegando, se achegando.
Cegando-os para vida.
***
Tocava S.O.S da Rihanna.A decoração do baile estava simplesmente perfeita.Atendia muito bem a temática daquele ano: A última primavera.
Flores das cores: rosa, roxa, violeta, lilás descaiam do teto. Parecia que tínhamos mergulhado num mundo mágico. Entro no grande salão, de braços dados com Fabrizio. Hehehe. Foi muito legal ver a cara de inveja e decepção de Sandra e companhia. Dou um sorriso pra elas.
***
A coroação fora muito breve. Eu e Brad fomos coroados com diademas feitos de plásticos. Brad tentou dar em cima de mim, quando dançávamos a valsa, porém dei um fora nele. Queria me livrar o quanto antes dele, pois ele não era o tipo de pessoa da qual se possa chamar de pé de falsa (a todo instante pisava em meus pés).
-- Brad você faz um grande favor pra mim?—pergunto olhando aqueles olhos azuis.
-- O quê?
--Dança com uma amiga minha? Neste momento Sandy se aproximava.
-- Quem?
-- Ela. —digo empurrando Sandy em cima de Brad. Qual ele olha da cintura pra cima.
Bom, já havia me livrado dele, agora podia ficar dançando com O Fabrizio.
***
Dançar com Fabrizio foi à coisa mais louca que já me acontecera. Quando dançávamos parecíamos um só corpo. Diria que estávamos na mesma conexão. Muito b em sintonizados. Uhuu! Aquele era o melhor dia de minha vida!
***
-- Suzanne! Suzanne!—era Sandy. Eu estava na mesa do ponche. Ponche esse em que continha flores dentro de si.
-- Que foi? Que foi?—pergunto no mesmo tom eufórico.
-- Dããr! Brad e eu vamos... Ai, você sabe... – contou-me ela. Tento dar uma de amiga preocupada só que ela estava decidida.
-- Se eu tenho certeza? Lógico que tenho!Um cara gatos desses!—Sandy despede-se de mim com um beijinho. Fico a vendo correr na direção de Brad. Os dois começam a se beijar calorosamente. Sorrio e vou levar o ponche a Fabrizio.
***
Meia noite. A festa terminou. Eu e Fabrizio estávamos à frente de nossa casa. Meu Deus! Como os beijos do meu namorado eram calientes!Teve um momento em que as mãos dele penetraram dentro de meu vestido e ficaram a alisar a minha coxa. Aquilo me excitava. Paro de beijá-lo e digo:
-- Vamos pra casa?
Ele assente.
***
Tinha pelo menos, cinco minutos para tornar este quarto romântico. Pego meu espelho de mão que havia esquecido em cima da cama e o coloco sobre a penteadeira. Dou uma ajeitada na cama. Retoco apressadamente a maquiagem. Estava O.K.
Podiam-se ouvir os passos sedentos de sexo de meu namorado. Ele irrompe na porta e meu celular toca. Era um número desconhecido. Quem seria?Atendo.
***
-- O quê? Meus pais estão mortos...?— meu mundo desaba. Fico zonza. Tento me levantar, mas tombo.
***
Fui amparada pelos fortes braços de meu namorado. Talvez tenha sido apenas um espécime de pesadelo... Não. Não fora. Pude constatar ao ver os olhos de Fabrizio. Começo a chorar. E ele me diz:
-- Sinto muito meu amor...
-- Não eles não...
Choro pelo menos uma hora. Fabrizio continuava a me amparar tentando de alguma forma me reconfortar. Minhas lágrimas inundavam o seu peito. Não conseguia falar nada.
Foi quando tenho uma ideia. O espelho de mão que aquela velha maluca me havia dado. Eu ainda tinha um desejo! Desvencilho-me dos braços de Fabrizio, vou à penteadeira e pego o espelho.
-- Ainda podemos trazê-los de volta... Ainda podemos... —disse com a voz embargada.
-- Como meu amor... —diz ele com uma voz que indicava o quanto estava sofrendo por mim.
-- Com esse espelho Fabrizio ele é mágico... Eu ainda possuo um desejo e posso trazê-los de volta...
-- Isso é impossível Su... —responde erguendo-se do chão. Vinha na minha direção. Penso que ele achava que havia entrado em choque.
-- Veja Fabrizio, veja: espelho desejo que você traga meus pais e meu irmão de volta.—digo olhando pro meu reflexo. Fabrizio ficou observando o espelho durante algum tempo mais nada acontecia.
-- Vamos, brilhe!—o sacudo e nada acontece. Nada de pedras reluzentes ou ao menos ferroada. O espelho parecia ser agora como qualquer outro.
Recomeço a chorar. Fabrizio me abraça e retira de minhas mãos o espelho. Era tão bom tê-lo. Ficamos, abraçados durante um bom tempo até que a campainha toca.
-- São eles!! São eles!!—digo eufórica. Corro pra porta e desço as escadas correndo. Meu namorado veio logo atrás de mim.
***
Sabia que o espelho não falharia agora. Abro a porta e perco a respiração. Não eram meus pais ou muito menos meu irmão. E sim a velha insana do espelho. Não conseguia dizer nada. As palavras ficaram encerradas na minha garganta.
-- Olá, Suzanne como vai?
Não digo nada.
-- Acho que você possui algo que me pertence, não?—diz a velha de burca preta, estalando os dedos. E de chofre o espelho que momento antes, me pertencia, agora se via nas garras da velha.
Enfim consigo dizer avançando em cima dela:
-- Isso me pertence...
--HÁ, HÁHÁ... – gargalha. -- Você é mesmo ingênua, não Suzanne?Você que provocara tudo... Desde a morte do cachorro a morte da sua família...
-- O que você quer dizer com isso?
-- Quero dizer que quando você desejava algo ao espelho, algo tinha que ser dado em troca...
-- Você me enganou sua desgraçada!—disse enfurecida. Como não tinha percebido isso? Então a morte de Bobby, meu cachorro, fora em troca de meu boletim com notas azuis e a morte de meus pais e meu irmão fora em retribuição de minha coroa de rainha do baile... Começo a chorar.
-- Você me enganou... —falo com a voz quase inaudível.
-- Outras já fizeram isso... E eu também sou uma vítima. Era jovem como você quando me aparece uma bruxa e me dá de presente este espelho de mão dos desejos... —dizia ela balançado o espelho— Peregrinei muito até encontrá-la, Suzanne...
-- Mas por que eu?—pergunto com voz rouca.
--Porque você é uma adolescente ambiciosa e vaidosa. O tipo perfeito para presentear com um espelho de mão encantado!
Procuro por Fabrizio. Olho pra trás e o vejo ainda na escada petrificado como uma estátua. Congelado no tempo.
-- O que você fez com ele?
-- Nada. Ele só está congelado. Não queria que ninguém interferisse em nossa conversa. Quando tudo acabar ele voltara ao normal...
-- O que você quer em troca? – pergunto. Observa-me.
-- Quero a sua juventude... E em troca dela, prometo devolver seus pais,seu irmão e o seu cão... O que acha?—me diz com sorriso no rosto.
Estava encurralada. Não tinha escolha. A culpa era minha e era eu a única que poderia consertar.
-- O que tenho que fazer?
--Aproxime-se...
Ando alguns passos. Fico de frente a bruxa.
-- Então... —pergunto corajosamente. Ela levanta o espelho e quebra-o sobre minha cabeça. Isso faz criar uma chuva de estilhaços caírem sobre meu corpo. Eles tocavam minha pele, rasgando-a. Rios de sangue brotavam de minha derme.
-- O que você fez comigo?—pergunto assustada.
-- Roubei a sua juventude...
Algo me passara despercebido... Aquela figura antes decadente tornara-se jovem...
Sim. Jovem. Com cabelos negros, olhos verdes e a pele lisa e impecável sem velhas rugas de antes... Tudo muito jovial.
--Acho que isso lhe pertence... —me diz a jovem bruxa entregando o maldito espelho de mão. Se eu soubesse que aquilo tudo iria acontecer não teria aceitado aquele objeto.
-- E minha família?
-- Ah, quase ia me esquecendo... —ela estala os dedos e tudo se apaga. Não vejo mais nada.
***
Acordo com uma dor de cabeça horrenda. Que pesadelo horrível que tive... Onde estava?Olho ao meu redor. Ei. Acho que sei onde estou!Esse é o jardim de minha casa! Levanto-me eufórica. E sem querer, deixo cair um objeto que dormira comigo.
Era o espelho... O pego e vou à direção da porta de minha casa. Toco a companhia... E que me atende é Beto...
As lágrimas começam a rolar. Tento abraçar Beto mais este se esquiva. E pergunto:
-- Que foi Beto...?—pergunto aproximando-se. Pinço-o pelo braço e ele começa a gritar:
-- MÃE TEM UMA VELHA ESTRANHA QUERENDO ME PEGARRR!!!!
Velha? O liberto imediatamente e este bate a porta em minha cara. Como assim velha? Olho atrás de mim para ver se não havia mais ninguém. Não. Não havia.
Engulo em seco. Olho pro espelho em minhas mãos. Não. Isso era impossível!Choro antes mesmo de ver-me no espelho.
Olho aquele reflexo. Não, não podia ser. Aquele reflexo não me pertencia. Meu cabelo havia esbranquiçado, minha boca murchara, meu rosto estava cheias de meandros de rugas e uma verruga enorme habitava meu nariz...
Num desespero crescente, solto um berro gutural, senil e perene:
-- NÃÃÃOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!!!!!!
FIM
Dedico este conto aos leitores deste blog (raffaelpetter.blogspot.com )que me incentivaram a continuar.
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