O Espelho de mão (Parte 2)
Via meu reflexo naquele pedaço de vidro polido e emoldurado. Não conseguia acreditar nisso! Eu aqui, deitada em minha cama, empunhando um espelho dado, por uma velha completamente desnorteada, pretendendo fazer um desejo. O que o desespero não faz com as pessoas. Mas eu precisava tentar. Se desse certo, beleza!Se não, azar.
Teria que arcar com as conseqüências. Que muito provavelmente não seriam nada leves. Suspiro. Vida de adolescente é nada fácil. Sabia que aquilo era uma completa loucura, contudo, eu tinha que tentar.
Encaro a minha gêmea do outro lado espelho, e peço:
--Espelho... —estaco, por vergonha. Aquilo parecia ser muito idiota. Porém tinha que tentar salvar o meu boletim hemorrágico. -- Desejo que as notas vermelhas que tenho em meu boletim transformem-se em notas boas, melhores...
Ao dizer isso algo de muito impressionante acontece: as pedras da haste do espelho começam a reluzir fortemente. Como se de certa forma houvessem adquirido vida. Olho os desenhos que ali foram cinzelados. Passo o indicador por sobre os relevos das figuras, sobre tudo a de um sátiro e... Ai! Perfuro meu dedo ao encostar no chifre da figura.
Imediatamente, num reflexo inconsciente, levo o dedo à boca na tentativa desesperada de estancar o sangue. Argh! Que gosto horrível. Gosto era de ferrugem! Preocupada, pego do espelho e verifico se não está com alguma parte com ferrugem. Felizmente, não estava. Apesar da boa notícia, algo me chama a atenção. É que as pedras que antes luziam vivamente, agora estavam frias e apagadas. Completamente sem vida. Manuseio-o bastão do espelho em busca do maldito ferrão que furara meu dedo. Não o encontro.
Uma coisa que a velha tresloucar não falara pé que quanto tempo demora a um desejo ser realizado...
Nesse momento ouço passos subindo a escada. Quem poderia ser?Papai e mãe haviam saído. Neide a nossa empregada folgara e Beto meu irmão chegaria lá pelas seis horas da tarde. Então quem era? O único modo de eu saber era abrindo a porta... Sou corajosa, não tenho medo!
Não tenho medo?Na verdade um pouco... Vai se fosse um ladrão... Ah! Isso é impraticável num condomínio onde a vigilância é realizada, vinte e quatro hora por dia. Decido abrir a porta (nesse momento minhas pernas tremelicavam feitas varas verdes) torço a maçaneta e... Tento gritar mais alguém tapa minha boca.
***
--Há, há,há... —ria meu namorado. —Você precisava ver a sua cara Su... Parecia ter visto um fantasma.
Tá não era bem um fantasma e sim o cretino e bobo alegre de meu namorado. Que raivaaaa! Ele havia me pregado um susto. Como não tinha pensado nisso antes.
-- O que você esta fazendo aqui? Não era pra você estar no curso de inglês?— pergunto já enraivecida. Acho que ele percebeu e parou de rir.
-- O professor faltou então por isso não houve aula. E quis fazer uma surpresa pra você...
Estávamos no meu quarto. O espelho estava ainda estava em cima da minha cama e ele curioso como só me pergunta:
-- É seu?—assento a cabeça. De quem mais poderia ser. Ele pega no espelho.
-- Que legal... Parece um daqueles espelhos do tempo da realeza...
-- Sim, parece mesmo... Fora uma velha mendiga louca quem me dera-o.
Ele me olha com uma interrogação na cara.
-- Sério... é mais pura verdade.Estava voltando da escola quando ela me ...
Contei toda a história pra ele, omitindo a parte dos desejos claro.
-- Hehehe... Vamos ao cinema hoje?
Digo sim?Digo não? Eis a questão. Anuiu-o a cabeça. E beijo-o.
***
O cinema, ontem, com Fabrizio ontem fora muito bom. Assistimos ao filme inteiro agarradinhos. O dia hoje estava uma maravilha. Bom quase. Se não fosse o dia da reunião dos pais e a entrega do boletim. Mamãe não havia ido à primeira reunião do ano e com isso não queria deixar de ir nesta. E pra ela meu boletim estava plenamente saudável, sem risco de morrer de hemorragia. E devido à expectativa, estou aqui deitada, em minha cama roendo nervosamente as unhas dos dedos. Procuro o espelho debaixo da cama. O pego e fico a olhar ele. Estaria ferrada ou salva?
Foi quando a porta do meu quarto abre. Era mamãe com um cenho duro, inflexível. Boa coisa não era. Sempre quando franzia o cenho era porque algo estava de errado.
-- Suzanne preciso falar com você....
-- Pode falar mamãe... —digo voz quase sumindo já esperando pelo pior.
-- Eu e seu pai lhe esperaremos lá, na sala...
Droga... Boa coisa não era. Seria exilada do convívio social de minha família? Seria encerrada num monastério onde monges não falam e ficam imóveis naquelas posições como replicas do Buda gordo? Não seria bem pior...