A Casa do Morro Uivante

Adelle e Luccio, irmãos órfãos, economizaram durante anos a fios para poderem comprar um lar. Depois de muito procurar, por vários lugarejos, enfim, a providência divina lhes apresentou a oportunidade da casa própria. era na Grã-Bretanha. A casa conhecida por Croglin Grange, em Cumberland, era alugada para os viajantes - depois de um assassinato no local, os que por ali passavam se recusavam ao pernoite na casa - outrora pousada para os mascates da região-, que pendia solitária no alto dos alpes. Ali o inverno era intenso e longo - apesar de longos anos abandonada, a sua solidez era evidente: tinha paredes de pedras pretas, uma lareira se situava ao centro da sala. Inúmeras janelas se distribuíam pelos cômodos. Adelle gostou da casa, ao vê-la de longe, de perto o seu aspecto era sinistro - tudo ali lembrava o antigo, o mofo - emoções que remetiam ao medo noturno - pressentiu.

- Minha nossa Luccio, tem um cemitério nos fundos.

O vendedor tentou remediar:

- Os mortos não incomodam, minha senhora, tenha medo dos vivos.

- Mas, é desagradável, um cemitério tão próximo da casa, não sei, Luccio, não devemos comprar...

-Senhora, tenho outros interessados na casa, caso não queira, não fecharemos o negócio. Posso ser sincero a senhora, o cemitério é antigo,

dos fundadores do lugarejo - aqui so é enterrado os idosos do local - estuda-se uma ampliação bem além da floresta e distante do rio.

-Contam coisas estranhas a respeito desta casa...

-Bom, a sua fama é do som assustador que que o vento faz quando aqui chega, após descer os alpes - soa como vozes humanas, confundem quem ouve - no mais, pura imaginação das pessoas.

-Sim, mas nos contaram a respeito da lenda...é claro, que não levei muito a sério, nos preocupa ter uma casa...

- Sim, diz a lenda :" ao ouvir o som das vozes não abra a porta, nunca - mesmo que a voz lhe pareça familiar..." - Ora, não vai deixar de comprar a casa por causa de uma lenda, minha senhora.

O irmão a segurou pelo braço, distanciaram-se um pouco do vendedor, Adelle não se sentiu bem, pois, o irmão a arrastou por entre as criptas. As lápides gastas, encardidas, verdes de limo. Então, o irmão lhe lembrou das estadias em muquifos, onde dividiam a cama com os ratos e baratas, onde as teias de aranha se espalhavam pelo cômodo - fora isso, muitas vezes tinham que ficar em quartos separados, pois, não aceitavam casais juntos, mesmo que fossem irmãos. A diária era cara, pagavam o pernoite, so podendo entrar para o repouso, após as seis horas da tarde. Luccio era fabricante de bebida alcóolica, Adelle costureira. Eram solteiros, por conta da falta de vida social - economizavam, com o objetivo da compra de uma casa. No lugarejo onde residiam e trabalhavam, os terrenos eram poucos, dedicados á lavoura, não podiam construir - na floresta tinha o perigo do isolamento e das feras selvagens. A mão de obra era cara para a construção, e não tinham tempo livre para tal.

Após a troca de poucas palavras, seguiram os três para a casa de registros, o dinheiro estava na casa de sua patroa que tinha a casa de costuras, por segurança. Providenciariam a documentação da propriedade. O cemitério nos fundos, era conhecido como Maltby, uma homenagem ao primeiro defunto, ali enterrado, o fundador daquele lugarejo escondido nas montanhas, um lenhador, outrora mascate, Sr. Maltby Cross Fox- falavam dele com muito respeito- era um homem religioso, bondoso, honesto e figura que prestava caridade para os carentes da região.

Tentaram esquecer o lado triste daquela aquisição. Providenciaram dividir o ambiente, de modo que a privacidade de ambos, fosse protegida. Ali tinha muitos quartos, cômodos diversos e um sótão, logo abaixo e um segundo sótão acima do teto de madeira e betume.

-Podemos fazer uma cerca de madeira, de modo que nos tire a visão das lápides do cemitério.

- Sugeriu a sua irmã, num lance de criatividade providencial.

- Não temos como fazer assim, de imediato. Ficamos sem dinheiro, gastamos todas as nossas economias, a mão-de-obra nos custará os olhos da cara, aqui se trabalha na lavoura ou nas madeireiras. Vamos isolar esta porta dos fundos, pode-se colocar cortinas nas janelas.

Ao falar do cemitério, Adelle sentia calafrios, e não ficava bem, tinha mal-estar inexplicável. Lembrou-se da lenda que dizia: " ao ouvir o vento, como se fosse vozes pedindo para abrir a porta, mesmo que a voz lhe pareça familiar, não abra a porta, jamais..."

Seguiram-se os dias. Os irmãos órfãos trabalhavam, e participavam do cotidiano do pequeno lugarejo. Adelle pensava, agora em arrumar um marido, e aconselhava o irmão a cortejar as moçoilas do local-era um lugarejo, de muitas solteiras. Ao abordar uma donzela do local, quando disse que estava morando na casa dos alpes, esta chocou-se, ficando rubra na face, pôs uma das mãos no seu peito e disse:

-Ohhhh, você e sua irmã estão morando na casa do morro uivante?

- Sim, compramos o imóvel.

Sem nada lhe dizer, a mocinha o deixou, afastando-se de forma apressada.

Johnny Bells não era um sujeito bem visto, por ali, onde todos trabalhavam na lavoura, ou nas serrarias. Outros caçavam ou pescavam. O comércio era intenso - havia sempre o que fazer de forma honesta. Johnny bells vivia na taberna bebendo, no carteado com os poucos desocupados, ou viajantes que por ali passavam.

- Deu tudo certo mais uma vez?

perguntou um dos seus comparsas.

- Sim, garfei toda a economia do casalzinho.

- Como consegue liberar a documentação? Eu não sei ler nem escrever...que eu saiba você, também ,não.

- Mas, tenho esperteza, coisa que você não tem.

A noite caíra naquele dia, de forma sombria. Sem estrelas e sem lua. fazia frio. Cuidadoso, apesar de estampar uma tristeza aparente no seu rosto, Luccio riu um pouco para a irmã, enquanto cuidava de acender à lareira para aquecer a casa. A irmã o conhecia bem, indagou:

- O que há? Você está diferente, noto uma tristeza...

- Nada...

- Você está triste, não teve um bom dia?

- Uma garota me recusou hoje, quando disse que morava aqui, nesta casa.

- Sei... a minha patroa não gostou, também. Até me ofereceu um quartinho nos fundos para morar.

-Hum, e o que ela disse daqui?

- Que o local é amaldiçoado. Falou que a metade das covas desse cemitério é de ex-morador daqui...

- Como assim? gente que morou aqui, e morreu de que forma?

- Assassinados, ou atacados por feras...disse-me que alguns foram encontrados com os corpos dilacerados, como se tivessem sido atacados por feras selvagens.

- So falta dizer que foi um lobisomem...

- Não brinque, Luccio. Estou amedrontada, podemos estar correndo risco de vida.

Luccio a tranquilou, dizendo que as portas e janelas foram reforçadas com trancas, e que na casa tinha duas armas de fogo, mais facões, e que ambos sabiam atirar.

- Deixe uma das armas no seu quarto. Não somos trouxas, quando soube da venda da casa e do que diz a lenda, tratei de criar artifícios para nos proteger - acha que vou deixar de nos proteger, prometi a minha mãe no leito de morte que cuidaria de você.

Mais um dia transcorria. Para agradar a irmã, Luccio fez uma pequena cerca, sacrificando o seu dia de descanso - a mesma tirava a visão das lápides do cemitério.

Muitas eram as histórias que contavam a respeito da casa conhecida como A Casa do Morro Uivante.

Um mascate fora assassinado por um colega de quarto que lhe roubou as mulas com as mercadorias e todo o seu dinheiro. O mascate foi encontrado no quarto esfaqueado. Enterraram-no nos fundos da casa, próximo ao túmulo dos primeiros ali, enterrados. Um viajante que ali aportou se suicidou enforcado, após um romance tempestuoso com uma prostiuta do local que lhe roubou todo o dinheiro - ficando na merda, ali retirou a sua vida, deixando a esposa e filhos na miséria.

Outros foram encontrados em avançado estado de decomposição - estavam mutilados, com as partes dos corpo separados.

- Você sabia de todas essas histórias, e mesmo assim, decidiu investir as nossas ecomomias neste local maldito?

- Desculpe, maninha, mas não havia outra alternativa. O dinheiro era pouco, e não temo o sobrenatural. Poderemos chamar o capelão para benzer o local e afastar os fantasmas daqui...

- Minha nossa, estou seriamente pensando, em te deixar aqui sozinho, e ir morar com a minha patroa - esta casa é amaldiçoada, pelo amor de Deus.

Cansada, e ao mesmo tempo ansiosa, Adelle não conseguia dormir, tinha a espingarda abraçada. Os olhos se dirigiam para todos os cantos do quarto. Manteve as cortinas cerradas, vez em quando se levantava, e olhava pela janela, puxando um pouco da cortina - parecia temer algo.

A casa estava ás escuras, so a luz da lareira dirigia uma luminosidade tênue pelo ambiente.

Adelle estava nervosa e amedrontada, não sabia ao certo se temia as coisas do mundo dos vivos ou do sobrenatural. Tinha a espingarda nas mãos. Abriu de leve a porta do quarto do seu irmão, este dormia de boca aberta, roncava. Para lhe pregar uma peça puxou-o pelo dedão de um dos pés, acordando-o.

- AAAAHHHHHH...

Gritou, saltando da cama.

- É assim que me protege? Dormindo feito um porco e mantendo a porta do seu quarto aberta? Caso alguém entrasse aqui você seria uma presa fácil.

Luccio não gostou da atitude da irmã - fez vê-la que estava se preocupando a toa, e com minhoca na cabeça. O Local era afastado da cidade, porém, tinha cães valorosos em volta da casa - confiava nos seus amigos fiéis. Havia posto grades medievais nas janelas. As portas tinham trancas reforçadas - eram portas fortes, de madeira maciça, porisso, podia se dar ao luxo de dormir de porta aberta.

Adelle não se deu por satisfeita, provavelmete, passaria uma noite em claro, de espingarda nas mãos. Destemida, confiando na sua arma, de posse de um candelabro, com vela subiu a escadaria na direção do sótão, e ali descobriu uma fragilidade na segurança: a grande janela estava sem as grades, as trancas estavam relaxadas, caso alguém pudesse ganhar o telhado entraria para o interior da casa, com facilidade.

- Mas, é um tolo, sempre deixa um rastro em tudo que faz, mas, qualquer um poderá entrar por aqui, não estamos seguros.

E, ali, ficou de forma desconfortável sentada numa cadeira, aguardando,aguardando não sabendo o que - até que adormeceu sentada. O vento frio que açoitava o seu rosto, entrando pela janela, que abria de forma pela força do vento a acordou de sobressalto.

Fechou a janela, pensando em colocar, ali uma cortina, e cobraria do irmão, que, de imediato tratasse de fechar aquela janela.

Johnny Bells parecia ansioso, havia perdido grande parte da porcentagem do dinheiro ganho da venda da casa. Os pequenos golpes não lhe permitia ter proventos que lhe desse uma vida de folga, de vadio. Muitas vezes bancava a bebedeira dos seus comparsas. Gostava de viver no puteiro. Precisava de uma nova iniciativa. Numa mesa regada á bebedeira, falou para os seus parceiros:

- Reza a lenda que: "o vento sussurra a voz dos mortos, ali na casa do morro uivante, caso ouça o vento chamando não abra a porta, mesmo que a voz lhe pareça familair...."

Todos deram gargalhadas, um deles indagou:

- E, caso abra a porta o que poderá acontecer?

" Serão levados para o inferno..."

(Continua)

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 05/10/2012
Reeditado em 06/10/2012
Código do texto: T3916748
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