Amor de Morte

André dirigia seu carro apressado pela estrada. Sabia que não teria mais chances com ela.

Seis anos haviam se passado desde que seu relacionamento tinha terminado, mas mesmo assim ele não conseguia esquece-la.

Ele levou sua vida normalmente, guardando dentro de si sua secreta paixão que resistia em se fazer sentir.

Havia resolvido ama-la até que o tempo o fizesse esquece-la, ou que a morte o levasse. O que viesse primeiro.

Não era uma escolha. Ele sabia que seu coração era mais forte e não lhe dava a liberdade de escolher.

Tudo seguiu bem. Até aquele e-mail chegar.

André tomou um susto e sentiu seu peito disparar quando viu aquele nome em sua caixa de entrada.

Priscila.

Lá estava aquele nome que ele tanto tentara esquecer. Ali, dentro da tela de um computador uma mensagem que podia mudar toda sua expectativa. Tudo aquilo em que ele sempre pensou esclarecido. Suas noites em claro, suas lágrimas derramadas.

Anos sem resposta para suas perguntas. Teria ela lido algum e-mail seu e respondido após tanto tempo?

Só havia uma maneira de descobrir. Sentido seu coração quase saltar pela boca ele clicou sobe a mensagem. Sua mão tremia e ele notou o frio contato do mouse com o suor de sua pele.

Agora finalmente saberia de tudo.

Desapontado, leu o seguinte texto: “Oie, tudo bem? Minha irmã disse que você está trabalhando com viagens agora? Eu e minhas amigas aqui do trabalho estamos pensando em ir pra algum lugar agora no feriado... O que você sugere? Bj e boa terça!”

Em um suspiro, André entrou no sistema de vendas da agência em que trabalhava e pesquisou alguns orçamentos.

"O que você esperava? - pensou- uma carta de redenção depois de todos esses anos?"

Colou os orçamentos no e-mail e antes de enviar a mensagem digitou:

"Bom, estão ai algumas sugestões... Espero que goste!!! E no mais, como vai a vida... Como vão as coisas?"

Demorou algum tempo. Demorou mais que algum tempo. André esperou ansioso por uma resposta quase que o dia inteiro, e quando já desanimado passou a pensar em outras coisas, eis que surge o alerta de uma nova mensagem em seu e-mail: De Priscila - RES: bom dia!!!

Ela havia respondido. Não se tratava de apenas um favor ou prestação de serviço. Ela tinha respondido sua mensagem. Com a mesma ansiedade de antes, abriu o e-mail, e surpreso leu:

“-Estou bem!!! Estes orçamentos... são meio caros... Mesmo assim valeu!! Estou trabalhando em uns projetinhos de informática na firma do meu namorado... E você, como está?

André sabia que ela estava namorando. Descobriu por seus amigos. Pedro era um cara legal, e ele pretendia não interferir na relação dos dois. A simples amizade dela, aqueles simples e-mails seriam mais do que suficientes para que ela ao menos fizesse parte de sua vida.

Os dias foram passando, as conversas ficando mais longas, os assuntos se renovando. André e Priscila conversavam normalmente. Ha tempos que ele não se sentia tão feliz.

Mas aquela felicidade tinha nome. Era Amor, que recluso após tantos anos estava despertando novamente.

Durante as noites em sua cama, André aproximava o notebook de sua cabeceira e admirava as fotos daquela mulher que tanto amava. Buscava em seu íntimo uma resposta que lhe calasse o porquê de não esquece-la, e após muito buscar uma razão, fechava os olhos e dormia.

O tempo passou. Havia mais de um ano desde que eles voltaram a se falar. Claro que não presencialmente. Todas as conversas eram feitas por e-mail, cada um de seu trabalho escrevia e respondia.

Até que o dia que ele tanto evitara chegou. Um longo e-mail com palavras sinceras foi enviado e não voltou.

Ele mandou outros e-mails perguntando se estava tudo bem, se tinha havia recebido sua mensagem, mas em seu íntimo, sabia que ela não iria responder.

Com os olhos vermelhos, ele lia o e-mail que escrevera. Sua declaração de amor.

Dois dias se passaram e ela não respondia suas mensagens.

Irritado, desiludido, André levantou-se de sua mesa, despediu-se de seus colegas e caminhou em direção ao estacionamento. A cabeça baixa, o ar de derrota e a triste curvatura de seus ombros demonstravam um misto de cansaço e desilusão.

"60 km - Fiscalização Eletrônica"

O ponteiro do carro estava a 140 por hora. Seu pé parecia querer atravessar o acelerador. Uma curva acentuada a direita se aproximava quando ele fechou os olhos e sentiu o impacto. Já era tarde demais quando tomou consciência de seu erro.

Dois médicos caminhavam conversando pelo corredor quando um deles abriu uma porta. Deitado sobre a cama André olhava imóvel para o teto.

-Desculpe amigo. Ela não atende nossas ligações.

O médico viu o aparelho de batimentos cardíacos disparar. Correu rápido em direção à cama e pegou o desfibrilador. André não respondia aos estímulos. Quando por fim o médico desistiu, uma linha continua apareceu no monitor. Neste momento, Priscila entrou no quarto, e ao ver aquele homem morto, se deu conta de que aquele era seu grande amor. Decidida, correu em direção à janela, e antes que o médico pudesse impedi-la, ela saltou.

40 anos depois.

Sentada em sua cadeira de rodas Priscila olhava para o vazio. Em seus ouvidos ecoava a voz de sua sobrinha que lia um texto qualquer. À medida que pensava em André, sua visão foi escurecendo. A voz de sua sobrinha se converteu em um grito de desespero. Os sons foram ficando para trás, e em meio ao seu ultimo suspiro, Priscila contemplou um sorriso. A espera havia acabo. A morte por fim unira o que jamais podia ter separado.

Bonilha
Enviado por Bonilha em 01/10/2012
Reeditado em 01/10/2012
Código do texto: T3910549
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