Entre os Mortos - Parte II

Andaram até á praia de mar Grande, talvez 300 metros de distância da praça. O local á noite era deserto, apenas um dos quiosques aberto - onde um pequeno grupo de pessoas, talvez, nativos, tomavam algumas cervejas e escutavam as velhas e chatas músicas bregas do momento. O céu fora tomado pela nebulosa, tornado- em tom de cinza, anunciando, talvez uma noite de chuva torrencial. O mar estava revolto, as ondas se chocavam na areia com fúria - um espetáculo belo e amedrontador para se vê.

-Olhar o mar á noite na sua escuridão avassaladora é amedrontador, não sei como conseguem sair em pequenos barcos para pescar.

Observou Sadinoel.

- É, mesmo, sempre tive medo do mar, e à noite pior ainda.

Respondeu Euclides.

Sentaram-se numa das mesas encardidas e peguentas de cerveja ali derramada. O chão estava emporcalhado de lixo e areia da praia - era um piso de cimento barato, repleto de rachaduras.

Euclides tomava um refrigerante, nunca tivera simpatia pelas bebidas alcóolicas. Sadinoel bebericava um cerveja.

- Não beba muito, a bebida pode alimentar fantasias quando estiver no casarão. A mente humana se transforma com esses estimulantes.

Alertou, Euclides, com autoridade.

- Bobagem, não bebo muito e so tomarei umas duas cervejas, e olhe la, além do mais está frio, cerveja so no calor do verão, vai cair uma chuva de primavera.

Quatro cervejas, dois refrigerantes e um papo voltado para as coisas do mundo extrafísico.

- Os mortos se recusavam a abandonar a vida que tinham quando estavam no mundo dos encarnados, os que não posseuem a devida evolução moral, espiritual, por aqui ficam participando da vida dos "vivos".

- Não acredito...

- Fiquei sabendo que aquela praça foi num passado remoto um cemitério de escravos, e tem mais, dois crimes aconteceram na pousada. Um marido ciumento matou ali a esposa, por ciúmes e depois se suicídou. O outro foi um assalto seguido de assassinato de duas turistas inglesas num dos quartos do primeiro andar.

- Ora, Euclides, não tente me amedrontar, não temo o sobrenatural.

Retornaram debaixo de um chuvisco para a pousada. Andavam de forma apressada - apesar da chuva era uma noite de nuances e de imagens cheia de poesia. As ruas estavam desertas, sequer um carro passava. O comércio local ja fechava as portas. Os turistas ja se encontravam recolhidos em seus quartos naquela noite sem o eterno climal de verão que ali reinava.

O clima do sinistro se manifestava ja ao observar o velho casarão, em destaque na rua, era recolhido e desbotado, de arquitetura antiga, transpirando o medonho em suas dependências. Morcegos em vôos rasantes, nervosos por sobre o telhado, entravam e saiam, de forma frenética pelas janelas. O sombrio lai, dominava, um breu amedrontador.

Entraram, após baterem na porta, ali havia uma alça metálica, de ferro chumbado, que servia de campainha - tinha que ser chocada com a madeira da porta, de forma incessante, até que o velho ouvisse o ruído do metal se chocar contra a madeira pesada da porta.

- Estamos sem energia elétrica, senhores. Desculpem-me, mas, teremos um resto de noite á luz de velas. Uma rede sofreu um curto aqui na rua, ja acionei a companhia de energia, mas, creio que vai demorar um pouco, talvez nem tenhamos luz por hoje. Desculpem-me se demorei a abrir a porta, diante desse chuvisco incessante, é que estava fechando as janelas dos quartos.

- Perdoa-se em um local paradisíaco, que pequenos contratempos aconteçam, que diferencie um pouco o local da cilização.

respondeu Euclides, com elegância.

- Não se importe com isso, estamos bem, foi uma noite agradável, apesar da chuva.

Falou Sadinoel, tentando ser simpático.

- Teremos uma noite bucólica, confesso que adorei, era o que estava faltando, uma noite sem iluminação, estou em busca de experiências com as coisas do além, quero me aprofundar nas minhas pesquisas, pretendo até fazer registros e, em seguida escrever um livro.

Disse, Euclides, com entusiasmo, exibia uma câmera de filmar, outra fotográfica.

- Eu quero dormir, so isso.

- Senhores, não se preocupem com a falta de luz elétrica, deixarei que hajam velas e luminárias artificiais pelos corredores e demais dependências. Esquentarei água para o banho e encherei as banheiras.

Parecia ser uma noite enriquecida com os elementos de oportunidades para o sinistro, o assombro. A sala, os corredores, demais cômodos disputavam a luz com as sombras. Em cada canto do grande e antigo casarão parecia esconder algo de inusitado, assutador, que seria favorecido pela escuridão. Alhure áquela situação do ambiente, Sadinoel sentou-se na namoradeira da sala, que estava tomada pelas sombras, e ali ficou em silêncio, como se aguardasse a presença do inusitado. O seu irmão se dirigiu pelo banheiro, o velho caseiro preparava o banho dos seus hóspedes. Admirava a falta de comentários dos irmãos com relação ao aspecto amedrontador do ambiente. " Até quando será assim"? - perguntava-se, enquanto observava as primeiras bolhas surgirem na água, dando sinais de que ja estava fervente, pronta para o uso.

Fim da segunda parte.

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 23/09/2012
Reeditado em 26/09/2012
Código do texto: T3896960
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