Dedo Duro - parte V

Emengarda estava magra, anêmica, com olheiras profundas - pois, não dormia. A menina a seguia o tempo todo pela cobertura. Com um tablet avisava aos patrões tudo a seu respeito. "Ela está no sanitário. Na cozinha fazendo o tempero. Foi dormir. Está no banheiro."

- Qual o seu nome pestinha?

- Dorinha, por quê?

- Você deve ser dessas adolescentes com sérios problemas mentais, uma psicopata. Deve ter uma personalidade fria, insensível e cruel...

- Eu, mesmo, não. Eu vi a sua poesia na cômoda, a que falava dos ricos, dinheiro e comida. Achei engraçada. sabe, não sou assim tão insensível, eu também escrevo poesias. Quero ser poeta quando crescer.

- Poetisa...

- Isso, quero escrever as mais cruéis poesias, como Fernando pessoa, não, não. Como Augusto dos Anjos e kafka. falarei de gente que come gente. Adoro falar de morte. falarei de você, vou escrever uma poesia em sua homenagem, quando se for.

- Pare de me torturar, me deixe em paz.

O odor de carne humana espalhava-se pelo quarto secreto. Chegou mais um corpo. Os demais foram jogados para os cães feito carne moída.

Estava ali um cadáver. A cabeça separada do corpo, braços e pernas. Uma visão macabra que a aterrorizava - fazia- beirar à loucura.

- Eu quero comida, quero comer carne..Emengardaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa, tou com fome.

Berrava o menino Dãozinho. Estava na sala jogando game. Adorava o jogo de Jogos Mortais.

- Vá cuidar do menino, pode deixar que eu corte esse. Depois prepara um bife suculento para ele. Temos carne fresca.

Dorinha parecia entrar em êxtase, ao observar o corpo retalhado. As partes separadas do corpo. Passava a mão pela pele do presunto, de forma lenta, como se quisesse prolongar o tato com a carne fria.

- Eu quero carne assada.

Dizia o menino, sem tirar os olhos do monitor do computador.

- Tem frutas. - Disse Emengarda.

- Quero carne assada.

"O demônio, so pode ser o demo a dominar essa família." Percebeu que as portas,a gora, viviam lacradas. Não lhe era mais permetido ir ás compras, ou passear com o cachorro. Ir á banca de revistas, ou levar Dãozinho à escola. Estava na clausura. Tinha uma certeza:

- Serei a próxima vítima.

Os telefones estavam com senha. O seu celular fora confiscado. " Como fugir? estava no último andar. As portas lacradas. Câmeras registravam o seu dia a dia. E a pestinha vivia na cola.

A muito custo conseguia manipular a carne, fatias, temperar. O odor que impregnava a cozinha lhe dava asco, vontade de vomitar. O menino ficava á beira do fogão observando - a e ficava de água na boca.

- Monstrinho...

- O que você disse? - Perguntou o garoto.

- Nada va pra mesa, ja ta pronto.

Viu o menino devorar a carne com voracidade animalesca. lambia os dedos e pediu:

- Quero mais...

Aprontou mais três grande pedaços. E, ficou das janelas observado a rua. O beco Vera Cruz era um terreno baldio, deserto e cheio de mato. Não comprovaram nada, parece ,do dedo humano ali encontrado. A polícia investigativa é falida, sabia disso. Os investigadores vivem se empanturrando de sanduíches e tomando cervejas. Têm preguiça até de atender a um telefonema na delegacia. Havia lido no jornal de que a cada 100 homicídios na Bahia investigado, apenas cerca de 10% é solucionado - mas, a depender, o criminoso dá o depoimento e vai responder o crime em liberdade - então , fogem. Quem vai esperar tempo ruim - a sentença de um juíz. " justiça burra" - observava.

Os patrões chegaram. Era o pior momento de sua vida. Teria que ir buscar as partes no freezer. A carne do pobre coitado que eles mataram, ou encomendaram a morte.

- Criamos, Emengarda um crime perfeito. Entrei no ramo da construção civil. na construção de um prédio,acontecem muitos acidentes com morte, infelizmente.

Todos riram, até Dãozinho, incentivado pelas gargalhadas da mãe e do pai - se quer sabia por que riram.

Emengarda baixou os olhos. O seu coração quase pára.

- Você precisa se alimentar melhor Emengarda, está perdendo peso. Noto a sua tristeza. Acho que vou te dar um presente. Vamos à praia neste fim de semana.

Como se tivesse lido a sua mente, ele emendou:

- Não pense em fugir. Um segurança estará de olho, entendeu? Além do mais, iremos para uma praia de nudismo que fica na linha verde. A praia é deserta. Não vai ter como tentar algo, e se tentar, pobrezinha ficará por la - morreu afogada, entendeu?

- Sim, senhor.

Sua patroa elogiou as pernas da empregada, os seios e a pele de brancura de nuvem, e até a bunda.

- O seu corpinho, Eme...me deixa de água na boca.

falou assim e deu uma risadinha daquelas. Emengarda desconfiava que tal observação nada tinha de desejos secretos relacionados ao sexo.

Ela quer é me comer, mesmo.

Emengarda foi levar a refeição do monstro do quarto secreto. Ele não gostava de que as luzes ficassem acesas. Deixou o prato cheio de carne suculenta por baixo das grades. Ele a olhou de forma diferente, daquela vez não parecia um animal.

- Você acredita no que eles dizem a meu respeito?

- Eu...eu...

- Eles mentem. Não sei o por quê de não terem me matado.

- Dizem que precisam de sua assinatura...

- Hum...então não tiveram como justificar a minha morte. Claro que não. Fiz um testamento. Caso eu morra, ou desapareça tem uma lista de orfanatos, creches e sociedades filantrópicas que ficarão com os meus bens. Sempre fui uma pessoa excêntrica, dirigia os negócios de longe. O meu sonho era ser escritor, um escritor secreto, desses que so os livros aparecem, entende?

- Então, os originais que ele leva para uma editora...

- Isso, eu escrevo...por isso suporto isso aqui.

- mas, e essa coisa de canibalismo...

- E uma coisa antiga na nossa família, secular.

Ele riu bastante, de forma descontrolada.

- Xi, voltou a ficar louco...

Disse a empregada, alto.

- Nada, estou bem. Riu de você acreditar nas bobagens que ele falou. Acredita que tenho mais de um século de idade? Que existe um tônico, elixir pra vida eterna e que desperta fome de carne humana.

- Não tem...

- Escute, gostei de você, não vou querer te comer, nem quero que eles te comam. Posso te ajudar, so quero que me diga uma coisa...

- O quê?

- Você é um dedo duro?

-

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 08/08/2012
Reeditado em 13/05/2014
Código do texto: T3820576
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