MSS - Cuide bem do seu amor.
Acordamos um pouco atrasados, segunda é assim mesmo. Me troquei rapidinho e gritei para Jaque que eu a esperava na garagem do prédio.
Trabalhamos próximos e para economizar, vamos os dois num carro só, é apenas meia horinha de casa até o trabalho.
Sabe... Estamos casados há sete anos e atualmente não estamos muito bem. Sei que não estou tendo muita paciência, mas ela parece fazer de tudo pra me irritar, ai não tem jeito, acabo hostilizando-a com palavras torpes.
Depois de vinte e oito minutos contados no relógio ela desceu.
_ Caraca meu?! Estamos atrasados, você não vai noivar! – disse eu, ligando o carro e bombando o acelerador.
_ Se você quisesse ir, porque não foi? Eu tenho carro, mas também existe taxi, metro e ônibus, você não precisava ficar me esperando pra me encher o saco. – retrucou a Jaque abrindo o aparador de sol com espelho e terminando a maquiagem.
Lembro-me dos primeiros anos, adorávamos a companhia um do outro, dormíamos naturalmente todas as noites “de conchinha”. Saíamos muito, conversávamos, dançávamos, namorávamos muito. Agora é insuportável até assistir televisão ao lado dela.
_ Filho da puta, aqui pra você!!! – Gritei, mostrando o dedo para um cara que me deu uma fechada e quase bati.
_ É por isso que nossa vida não vai pra frente! É por causa desses palavrões que você vive falando! – Interrompeu-me ela, diminuindo o volume do rádio.
Isso deu início à discussão diária. Nossa, é extremamente estressante e irritante. A voz dela ecoa dentro da minha cabeça, batendo nos cantos e rebombando nos meus tímpanos o que faz com que eu grite e fale muito palavrão.
_ Vai tomar no seu cú, cala sua boca porra, porque você não morre?! – Tentei encerrar a briga.
_ Vai você tomar no cú, você e toda sua família! – Jaque, falou cruzando os braços e virando o rosto para fora do carro.
Me subiu um calor pelo pescoço e meus olhos ficaram vermelho na hora, eu sei o que viria em seguida, eu iria gritar, chorar, bater no volante, ou seja todos tiques de nervosismo que costumo fazer, mas, decidi que hoje não iria cair na armadilha dela, apenas fiquei quieto e num disse nada, faltam apenas dez minutos para chegar ao trabalho dela.
Chegamos, até que enfim. Não sei por que, ao estacionar bem próximo à guia, me deu uma vontade enorme de pedir desculpas e dizer o quanto a amo.
Dizer o quanto gosto de vê-la dormindo, que adoro vê-la enchendo a boca de doces e tentando falar, que adoro beijá-la embaixo do chuveiro, e acariciar seu corpo nú, que adoro a gargalhada dela rindo das minhas piadas sem graça, que adoro quando terminados de fazer amor e ela por cima me abraça forte e diz que me ama. Dizer que, todas as vezes que brigamos, em questão de segundos eu me arrependo.
Me deu vontade de dizer tudo isso, mas não vou dar o braço a torcer. Sou sempre eu que peço perdão.
_”Hum”, tchau! – disse ela secamente segurando a maçaneta da porta do carro.
Estranho, respondi, mas tudo ficou em câmera lenta, tal como o filme “Matrix”. De repente deu pra escutar o barulho da câmera dos meus olhos ficando lenta.
Eu via os esguichos de agua da torneira do bar do outro da rua, percebi uma mosca voando em volta do cesto de lixo na calçada, notei as nuvens passando lentamente, consegui ler os lábios de uma pessoa falando ao celular do outro lado da rua, senti o cheiro do café forte na lanchonete a frente e tudo isso ao mesmo tempo.
Ela terminou de sair do carro, ficou de pé e ajeitou a saia.
Eu olhava sua silhueta gostosa e maravilhosa, ainda em câmera lenta e:
Lentamente, vi o carro em cima da calçada acertando seus quadris e;
Lentamente, a prensando contra a porta do meu carro e;
Lentamente, com o corpo dela arrancando a porta do carro e;
Lentamente, prensando ela contra o poste a uns 5 metros à frente e;
Lentamente, a parte de cima de o seu corpo destacar-se da de baixo, e;
Lentamente, o carro que a atropelou abraçar o poste com ela dentro do capô, e;
Lentamente, seu último olhar para mim.
Deveria ter me desculpado, deveria ter me despedido, não podia tê-la deixado sair do carro sem um beijo, não podia tê-la deixado sair do carro, não podia tê-la mandado morrer.
Turbilhão de pensamentos em minha cabeça, mas o fato é:
“Quando levantamos não sabíamos que seria nosso ultimo dia.”
Cuide bem do seu amor.
Meu nome é Marcio Santos Siqueira, guarde bem esse nome, pois esse é o início da minha vingança.