Pena de Morte - Capitulo XII - Mistérios revelados

“Não sei se a morte beira a vida, ou a vida beira a morte, penso que não existe nenhuma das duas, isso tudo não passa de uma perfeita e complexa ilusão.”

Esse conto dedico a meu maior amigo Mauro Alves e a minha mais querida leitora, Carla.

O asfalto machucado era banhado pelo liquido ácido que percorria sua pele negra. As nuvens acinzentadas estavam carregadas de uma morbidez assustadora enquanto clarões tal quais fendas no céu se revelavam em meio à cortina d’água que os cercava.

"Pena de Morte - Capítulo XII - Penúltimo Capítulo - Logo posto com o titulo original - E semana que vem, dia 07-07-12 o final dessa série."

Paulo Dutra ainda não entendia como aquele carro passara tão rápido por eles. Mal surgiu no radar e de repente acelerou de uma maneira completamente absurda, indo de encontro ao antigo prédio onde o clone se encontrava. Olhando pelo vidro o soldado mal via o estrago feito no lugar, mas sabia bem quem era o responsável por isso.

- Daniel!! - bradou - Hora de entrar em ação, senhores! – Ele disse em tom austero quando foi surpreendido por um estranho barulho. Algo havia batido contra o carro. Os soldados entreolharam-se confusos. Em meio ao som lascivo das gotas da chuva ruinosa, puderam ouvir um ruído diferente, algo realmente irritante aos ouvidos. Paulo olhava pelo vidro da porta quando foi surpreendido pelo rosto assustador da criatura que surgira da penumbra.

Era um rosto feminino, a pele parecia ter sido derretida em algum momento de sua vida, era quase plástica, como uma mascara de uma festa a fantasia. Seus olhos estavam cercados pela morte. Os dentes eram sujos, parte amarelados e pútridos, as gengivas inchadas, inflamadas e ensangüentadas. A imagem horrenda daquela figura de semblante magro, mas incondicionalmente forte veio à tona enquanto as unhas da mesma se arrastavam pela lataria do Furgão.

- Malditos nanoinfectos! – Rosnou Paulo ao ver a lataria do teto do veículo ser amassada bruscamente por algo que acabara de pular por sobre eles. A criatura começou a esmurrar a lataria, insanamente. O barulho era ensurdecedor e chegava agressivo aos ouvidos de quem estava dentro do veículo.

Pelo vidro os soldados ainda viam a figura grotesca farejando como se pudesse sentir o cheiro deles, mas ela não podia. O vapor se impregnando no vidro, ela tentava saciar-se, enquanto seu corpo repleto de cicatrizes ardia sob a chuva ácida que a atacava.

Num misto de desespero um dos soldados carregou sua arma e apontou para o teto, segurou-a com as duas mãos e preparou-se para apertar o gatilho, quando sentiu uma mão pousar sobre a sua.

- Você não quer fazer isso, soldado! – Disse Paulo. – Imagine o que os furos da munição dessa sua FN P90 fariam com o teto do furgão. Não é isso que você quer. Esse Furgão é a única garantia pela qual estamos livres desse martírio que essas criaturas estão vivendo lá fora. A pele deles é muito, mas muito mais resistente que a nossa. É como uma casca criada pelo tempo, e ainda assim eles estão imersos em dor. Quer sentir o que eles sentem ainda tendo sua racionalidade. Eles não tem isso, portanto ainda suportam tal situação. Não temos chance aqui, nem mesmo se pudermos assumir nossa forma. As cicatrizes serão irremediáveis – Concluiu Paulo tentando conter seu subordinado, mas ele sabia que aquilo só iria piorar.

O soldado sentiu seu dedo escorregar pelo gatilho, enquanto outros nanoinfectos chegavam e começavam a arranhar, morder e socar o furgão atrás de suas presas.

Paulo Dutra e sua equipe estavam cercados.

...

Mat e João se aproximavam, Ilmar permanecia sentado enquanto a dor ainda o visitava. Em sua mente ele guardava as lembranças de toda situação que estava vivendo desde o seqüestro do ônibus. Recordava-se das mortes que presenciara e do sarcasmo do assassino.

No ultimo congresso que os membros participaram ele havia sido contra a votação. Seu voto havia sido o primeiro, portanto, o que mais encorajou o restante a segui-lo. Ele conhecia o poder do homem que queria mudar o mundo, talvez aquilo fosse algo necessário, mas não era o correto. Ilmar saiu da sala oval sabendo que aquela guerra não acabaria ali.

De um lado estava a maioria que o apoiou, do outro um mísero grupo de membros corruptos que mal sabiam que tinham feito um pacto com o próprio diabo.

- Está tudo perdido! – Ele disse olhando para Mat e João, e naquele momento, apagou.

...

Num outro canto da falecida Rio de Janeiro, um homem se postava frente aos microfones. À sua frente jornalistas do mundo inteiro esperavam ansiosos pela coletiva. O homem empunhando sua bengala de cor prata subiu a pequena escadaria sendo escoltado pelo secretário de defesa e de outros dois soldados, um de cada lado. Sorriu para platéia que o observava silenciosamente até então. Ali estava um ícone, um herói, e muito em breve, segundo suas ambições, um Deus.

- Senhores e senhores, com sua palavra o Vice – presidente, Raul Reis Silva. – Disse o secretário o saudando e posteriormente sentando-se enquanto o homem olhava para os repórteres à sua frente.

- Amigos! Isso mesmo, amigos. É isso que todos devemos ser. Hoje não haverão mais segredos, e sim uma nova era. Aposto que estão se perguntando o porquê de eu convocar uma coletiva de imprensa nesse local. – Ele disse enquanto sua mão esquerda apoiava-se sobre a tribuna.

- Talvez o senhor queira anunciar a reinauguração da plim plim... – Disse um jornalista em tom irônico.

- Bem, estamos na sede, dessa que foi uma das maiores redes de televisão do mundo, ou melhor, do globo. Apesar de sua falência, afinal quem no mundo teria tempo para novelas, enquanto o sol estava desabando sobre suas cabeças. Essa era a real mina de ouro da Rede Globo. Obviamente a ficção sempre nos atraiu, os monstros, as vitimas, os vilões, e sobretudo as reviravoltas. É por isso que usei esse cenário.

- O que o senhor está querendo com isso, afinal? Isso é uma piada? Pensei que teríamos aqui uma revelação importante e em tempos como os nossos o senhor nos fala de telenovelas? – Questionou um repórter de bigodes espessos e um ar de autoridade. Mas algo bem abaixo que o de Raul.

- Telenovelas? Não meu caro! Acalme-se. – Ele disse tomando um pouco de água enquanto era nítido o balançar de seu copo, o tremer de suas mãos e suas rugas sobrepostas em sua pele. – O Projac sempre foi a fábrica de sonhos do brasileiro, e hoje é aqui que anunciarei ao mundo que a ficção acaba agora. Chega de monstros, chega de vitimas, de vilões. É hora de uma virada no jogo, senhores!! – Raul dizia enquanto os flashes chegavam quase imperceptíveis aos seus olhos. Ele estava tomado, possuído por uma idéia única, a de se tornar imortal.

- Virada? – Perguntou Ruth Braga, a repórter de São Paulo erguendo seu microfone.

- Como anunciado mais cedo, temos um novo assassino solto pelas ruas, na verdade um velho conhecido que fugiu da prisão. Daniel. Aquele mesmo homem o qual tentou me matar há mais de vinte anos atrás. Hoje, está nas ruas novamente. A minha equipe já está no encalço dele e pelas informações que acabo de receber eles estão prontos para capturá-lo e trazê-lo de volta até nós.

- E seu neto? – Perguntou Ruth.

- Bem, só um milagre pode salvá-lo das garras de Daniel. Ele quis me matar, e como fracassou, persegue minha família - Ele disse passando o lenço sobre a testa devido ao forte calor.

- Um minuto senhor. Desculpe, mas após a morte de sua filha, devido a falha no transplante o Senhor particularmente declarou guerra a ele. – Disse um dos repórteres enquanto as câmeras se voltavam para Raul, que se mostrou claramente nervoso com a pergunta.

Raul cerrou seu punho esquerdo, os dedos apertaram forte sua bengala, enquanto em sua boca o gosto amargo das lembranças descia entalado por sua garganta.

- Qual é seu nome rapaz? – Ele perguntou ao repórter, fitando-o severamente, mal conseguindo conter a ira pela pergunta impertinente.

- Arthur Novaes. – O homenzinho de chapéu respondeu prontamente.

- Bem, como é sabido por todos, minha filha tinha uma doença irreversível, um câncer que a mutilou de dentro para fora. O bom Deus nos abandonou há muito tempo atrás e eu me cansei de recorrer a algo que talvez sequer existiu algum dia, só porque algum idiota escreveu um livro e o auto-dominou de palavra sagrada. – disse Raul em tom de amargura – Após a revolução do sol tudo ficou muito claro para todos, não existe nada além de nós!! – Ele continuava com a voz cada vez mais ríspida – pois se tivéssemos um pai, como todos o chamavam, ele não permitiria jamais que todo esse caos acontecesse. E foi por isso que lutei tanto por minha filha, cheguei ao extremo, não desisti por um segundo sequer. – Em silencio todos acompanhavam cada gesto daquele homem. – Criamos “Vitória”, o primeiro clone humano, na busca de salvar a vida de milhões, não só de minha filha. E graças a esse homem, tudo foi por água abaixo quando ele a matou. Ele a levou com toda esperança que tínhamos. Toda nossa esperança! – Ele disse enquanto uma lágrima decaía de seus olhos, furtiva da atenção de todos , que a fotografavam e filmavam a cena, hipnotizados.

Certo de que o mundo o aplaudiria de pé, Raul controlava-se ao máximo. Ele precisava convencê-los de que aquilo era o certo a se fazer.

- O que tenho para lhes falar é que o homem vem tornando-se cada vez mais um animal em extinção e é chegada a hora de evoluirmos. E não somente isso, de criarmos um novo mundo, uma nova natureza. Junto de minha equipe renomada de cientistas tenho uma saída. Criaremos algo maior do que o ser humano, mais imponente, mais resistente!! Esse projeto tem o nome de DNA3 e será iniciado hoje em aproximadamente – Raul olhou em seu relógio, viu os ponteiros gloriosos e precisos assinalarem o horário atual – bem, agora exatamente em três horas.

- DNA3? Mas isso não se refere a clonagem? – Perguntou um repórter americano,

- Clonagem? Não amigo! Esse é um processo mais elevado. Digamos, estar ligado a criação. A clonagem deixou de ser prioridade há tempos. Nós simplesmente usamos o mesmo projeto para alterar o DNA humano, e não para criar uma cópia. Iremos adaptar essa nova raça, e toda uma nova espécie de criaturas. Plantas, cães, homens, mulheres, crianças, todos vivendo pelas ruas novamente livres do efeito dos UVA´s.

O que se seguiu foi um leve sopro de espanto fugindo das gargantas secas dos jornalistas que logo iniciaram seu alvoroço. Raul respondia as perguntas subseqüentes, enquanto em sua mente as imagens de sua filha a mesa de cirurgia retornavam como déjà vus, lembranças que ele tão bem conhecia.

“Lembranças de Raul – Vice - presidente do Brasil”

Raul desceu de sua limusine e entrou sendo escoltado por dois guarda costas. A figura imponente daquele homem passava pelos corredores causando um frisson nos que o viam. O presidente atual do Brasil acabara de entrar no mais sofisticado hospital da América Latina, o reconhecido e moderno hospital Israelita Albert Einstein.

Raul havia recebido a noticia de que sua filha não resistiria por muito tempo. Verônica, havia piorado muito nos dois últimos meses, e já faziam oito meses que o projeto DNA2, Vitória, havia sido seqüestrada. Entretanto a noite anterior ele recebeu uma estranha ligação de seu secretário de defesa dizendo que a clone estava á beira da morte.

- Como é? A acharam onde? Isso é impossível, ela está o que? – Ele não acreditava, mas o que o homem o dizia parecia ser algo surreal. Vitória havia sido achada a porta de um hospital, seu rosto foi reconhecido por um sofisticado programa de computador chamado “Interceptor” o qual rastreava imagens de um banco de dados global. A atendente olhou a mensagem na tela do monitor e a identificou como uma perigosa fugitiva da lei. Mas o que mais o assustava é que Vitória carregava consigo um feto de cerca de três meses, uma criança ensangüentada, como as pernas de Vitória que se encontrava em estado de choque, pálida e a beira da morte.

Em meio a um turbilhão de reflexões Raul chegou ao quarto onde sua filha se encontrava. Olhando pelo vidro transparente ele pôde ver as duas macas e mal foi capaz de diferenciar seus rostos. As duas mulheres deitadas e em estado debilitado eram incrivelmente idênticas.

Do lado de dentro da sala cirúrgica os médicos e enfermeiros estavam agitados enquanto no monitor cardíaco os dados eram cada vez mais alarmantes. Verônica permanecia de olhos fechados, gelada e completamente anestesiada enquanto Vitória de olhos abertos e aparentemente delirando chamava por sua filha.

Raul assistia a tudo confuso, como é que ela poderia ter tido uma criança, afinal quem a havia raptado e como ela escapou assim? Os questionamentos chegavam a ele que tentava organizar suas idéias, mas estava completamente aturdido, pois a razão e o coração se confrontavam de uma maneira terrível.

Tudo estava fora do controle nos últimos meses. Sua filha estava muito pior e a única chance de salvá-la havia sido tomada dele. Quando os seqüestradores entraram em contato ele foi muito claro, dizendo que recuperaria Vitória de uma forma ou de outra e não iria cair em um joguete para ser passado para trás. Havia ameaçado acabar com qualquer um que tentasse o impedir de salvar sua filha. Entretanto algo ainda pior surgiu. Uma onda de assassinatos premeditados, pessoas ligadas a ele e a seus interesses estavam sendo mortas de maneiras bizarras e inimagináveis. Até pouco tempo atrás ele não sabia quem poderia ser o autor desses crimes e rasto algum indicava essa pessoa. Mas em um galpão há algumas semanas atrás, o soldado Pedro o identificou. O assassino era justamente o parceiro do soldado e o homem que protegeu Vitória, seu nome era Daniel.

Ainda absorto em seus pensamentos Raul olhava para a sala de cirurgia onde Danilo acompanhava atento o transplante, tentando salvar a vida de Verônica. A incisão começou a ser feita. Vitória não sentia dor alguma, suas vistas estavam embaçadas, Foi quando viu uma mão pousar leve sobre sua testa e acariciá-la. Danilo estava de pé ao seu lado, vestido de branco usando trajes cirúrgicos normais. Ela apenas sorriu, um riso sutil de canto de boca, reconhecendo a imagem do homem que ela sabia que sentia algo muito forte por ela.

Raul continuava compenetrado, ao seu lado estavam os dois seguranças, feito dos postes parados fazendo sombra para que nada o afetasse. Ainda assistindo a tudo, o presidente esperava ansioso o final daquela cirurgia. Os sinais vitais de Vitória cada vez mais se perdiam daquele corpo.

- Logo você ficará boa minha filha, e milhares terão a mesma sorte que você. Criaremos clones para salvar vidas, e as doenças migrarão para bem longe daqui. – Ele sussurrou para si próprio quando algo estranho aconteceu.

Os dois seguranças caíram abruptamente aos seus pés. Ambos com dardos cravados em suas peles, de repente estavam desmaiados. Ainda olhando pasmo para o chão ergueu seus olhos vagarosamente, vendo o homem de chinelos havaianas, pijama hospitalar e carregando um suporte para soro regulável com rodízios cinza, onde havia uma embalagem de soro, da qual gota nenhuma caia. O homem ergueu as sobrancelhas e sorriu para Raul.

- O que foi? Nunca viu um doente antes? – disse ele apontando a arma – pois eu acabo de ver o pior de todos os doentes, senhor Presidente. Vim como a cura. – Disse Daniel olhando nos olhos de Raul que ainda surpreso tentava raciocinar.

- O que você quer aqui? – Perguntou o presidente.

- Bem, acho que não temos muito tempo, vim te buscar para um passeio. Daniel apontou a arma e disparou. O presidente fechou os olhos, mas o misero som do cano silencioso mal foi ouvido, até que o projétil chocou-se com seu alvo. A bala atravessou a parede de vidro, Daniel jogou o tripé que usara como disfarce contra o vidro e o mesmo se quebrou. O presidente abriu os olhos e aliviado viu que ainda estava vivo entretanto temeroso olhou para Daniel que ordenou que ele entrasse na sala.

- O que você vai fazer? O que quer aqui? Ela vai morrer, assim como a criança, ela não é real, não é uma pessoa, é apenas uma experiência! – Ele disse pulando a parte inferior que media não mais que sessenta centímetros de altura, era uma base onde o vidro ficava afixado. Os médicos e enfermeiros recuaram quando Daniel sacou a outra arma e apontou para eles.

- Afastem-se dela! – Ele disse olhando para Vitória. Olhou posteriormente para Verônica, e percebeu o quanto elas eram parecidas. Aquilo o fez pensar. O presidente acompanhava cada passo dele, porém inerte ele não podia fazer nada.

- Daniel! – Sussurrou Vitória como se gritasse, pois usava de toda pouca força que ainda restava. – Eles mataram minha filha e agora eu vou morrer. – Daniel olhou-a, abaixou a cabeça até ela e beijo-lhe a testa. Viu a incisão, o corte para retirada do fígado e olhou de volta para Raul.

- Então é assim que quer salvar a humanidade? Pra você ela é só uma experiência? Pois bem – ele disse olhando de relance para Verônica – Se é só isso que ela é, então tenho que matá-la, pois isso não vai acontecer nunca mais.

- Não, Daniel! – Tentou intervir, Danilo. Mas era tarde demais, Daniel colocou o cano da arma no peito de Vitória, fechou os olhos e um mundo de sentimentos tomou cada partícula de seu corpo. Ele pensou em tudo que havia visto e feito até ali, pensou no que Vitória havia lhe mostrado e no que ela havia lhe pedido, e disparou. O presidente tentou avançar e impedir, mas a outra arma estava apontada para eles.

- Você está morto seu idiota! – Disse Raul olhando para a filha e depois para Vitória, que abriu os olhos, arregalando-os e fitando Daniel, até que repentinamente desfaleceu-se. Como acha que vai sair daqui? – Perguntou o presidente sarcasticamente.

- Sim, estou morto – Daniel respondeu olhando-o nos olhos – Morri há alguns meses – disse ele olhando para Danilo e o presidente. Mas apenas Danilo sabia o real significado daquele olhar – Mas, como vou sair daqui? Bem essa é a melhor parte, você vem comigo Presidente, é hora de irmos rezar por sua filha, você precisa fazer um sacrifício, assim, quem sabe ela não viva.

“De volta a sala de imprensa”

- Senhor? Não respondeu minha pergunta. Daniel não estaria atrás de você para terminar o que começou na catedral há anos?

Raul despertou de suas lembranças e encarou o repórter, olhou no fundo dos olhos dele e então sorriu.

- Daniel será morto logo, e enfim pagará por todos seus crimes. Esqueçam ele, nossa prioridade é salvar o presidente e oferecer um novo mundo para todos nós e isso começa agora, senhores. – Disse ele despedindo-se de todos e descendo escoltado pelo secretário e pelos seus seguranças.

...

Daniel olhou para Mara, ela estava ali, tão perto dele e ele não sabia o que fazer. Olhou para suas pt’s, e em seguida pelo retrovisor viu os pés do clone, que caminhava em sua direção. Aquela não era uma boa hora para morrer – Pensou Daniel.

- Daniel, está me ouvindo não é? Aposto que está! Eu te subestimei meu amigo. – Dizia o clone caminhando lentamente enquanto olhava para os membros restantes que permaneciam quietos aguardando o que viria a seguir – Saia logo daí irmão, vamos terminar com isso agora, só nós dois! – Disse como se falasse com um grande e velho amigo.

- Quando sair daqui eu vou te matar, seu idiota! – Disse Daniel segurando suas armas.

- Bem, como você é amistoso, fique tranqüilo. Seremos rápidos, e logo que terminar com você tenho algo especial para sua amiguinha. - Ele disse sorrindo. Daniel olhou mais uma vez para Mara e engatilhou suas pt’s.

Mara tinha um corte na testa, estava inconsciente, ambos ainda estavam de cabeça para baixo. Daniel soltou o cinto de segurança e se posicionou de modo a que seus pés ficassem livres e investiu com toda sua força contra o pára-brisa. No terceiro golpe o mesmo se partiu e ele saiu engatinhando feito um bebê, arrastando-se pelos cacos cortantes, e se agachando próximo a dianteira do carro. Encostou suas costas no pára-choque do Mustang e respirou fundo direcionando seu olhar para as armas.

- Por que o medo Daniel? Estou desarmado amigo, venha me pegar, não é isso que quer, acabar com o que você criou há tanto tempo. O seu “eu assassino”, pois bem policial, aqui estou. – Disse o clone parando à cinco metros do carro e abrindo os braços, enquanto os membros restantes o acompanhavam.

...

- Merda!! - disse o soldado abaixando a arma enquanto Paulo o repreendia com o olhar – O que vamos fazer então? – perguntou.

A chuva continuava a cair, fina, mas ainda lesiva. Os nanoinfectos cercavam o furgão, corriam pelas ruas, procuravam abrigo, ensandecidos e famintos gritavam feito animais, proferiam seus gritos peculiares e sibilares chamando uns aos outros em completa agonia, como se tentassem se proteger.

Dentro do furgão cada vez mais os soldados ficavam acuados, presos pelo medo e a certeza de que logo estariam mortos. Perguntas instintivas chegavam buscando alternativas para a situação em que se encontravam. Como empunhar armas enquanto o ácido queimava suas peles? Até quando o furgão iria agüentar? Um turbilhão de sentimentos os envolvia quando virão outro furgão pairar no ar. Paulo Dutra fez sombreiro com a mão direita para tentar enxergar além da luz forte que o cegava.

- Ajuda! - Vibrou um dos soldados – mas logo percebeu que estava enganado.

...

Mat e João olhavam para o furgão abaixo deles. Estavam à cerca de oito metros do chão, planando no ar. Ilmar havia apagado, estava febril e delirando. Falava o tempo todo em Deus e o Diabo. A criação destruindo o criador. Falava coisas sem sentido para os dois. Suas pernas estavam repletas de bolhas, havia queimaduras que haviam arrancado-lhe a pele por completo em alguns pontos.

- Aqueles são eles? – Perguntou João.

- Sim, Paulo Dutra e possivelmente mais cinco homens. Estão cercados pelos nanoinfectos, o Mustang é esse ponto azul no monitor. – Disse Mat apontando o dedo para a tela do computador – Daniel e Mara estão naquela direção, dentro daquele prédio – ele concluiu apontando para o teatro.

João olhou na direção do prédio, a chuva impossibilitava uma visão melhor, mas ele podia reconhecer a fachada que via quando ainda era criança. Ali havia ido diversas vezes com seu pai. Aquilo o fez recordar da figura imponente dele e lembranças vivas chegaram como farpas ao seu coração.

- Que droga! Isso tem que acabar logo! – Ele disse olhando para Mat.

- O que foi João? – Mat perguntou completamente confuso.

- Nada garoto, são só fantasmas e já estou farto deles! O que vamos fazer? – Ele perguntou ansioso.

- Bem, tenho uma idéia! – Respondeu Matheus.

...

Flavio, o assistente de Mariano estava na sala central, onde as máquinas responsáveis pelo monitoramento de cada uma das alas do laboratório se situavam. Seus olhos voltados para o monitor enquanto ele permanecia sentado na cadeira que dançava de um lado para o outro enquanto seus dedos insistentemente conduziam o teclado, outrora ele manuseava o mouse, um clique ou outro. Compenetrado em seus afazeres, raciocinava.

Desde o primeiro dia que chegou ali, soube que trabalharia com um dos maiores cientistas da história Brasileira e do mundo. Mariano Flores era algo próximo ao soberbo, um homem que dispensava comentários e carregava uma trilha de descobertas além do imaginário humano. Muitos diziam que aquele pequeno homem tinha a chave da criação.

Enquanto os olhos de Flávio percorriam a pasta que acabara de abrir, ele sentia que estava cada vez mais perto. Olhou ao redor para ver se não havia ninguém suspeitando de nada, mas todos estavam focados no maior evento da história, uma nova página seria escrita.

Flávio sorriu para si mesmo, como ele podia ser tão esperto assim. Copiou a informação que precisava e fechou rapidamente a janela e quando deu por si, viu o reflexo de Mariano, que o encarava com um ar de intolerância.

...

Daniel olhou para o lado e viu-se acuado dentro daquele local. No chão os cacos do lustre central jaziam espatifados bem a sua frente. O som da respiração de Mara chegou alarmante, ela havia acordado.

Mara despertou meio a comum escuridão que a acompanhou por toda sua vida. Abriu os olhos, mas não enxergava nada. As mãos estavam vacilantes no ar. A detetive passou a mão na testa e pôde sentir e ver o sangue que ainda escorria lentamente por sobre sua pele, escapando de si própria sem nenhuma autorização. Deixou que sua mão direita deslizasse pelo seu corpo e encontrou um cinto de segurança, retirou-o e apalpou o ar enquanto chamava por Daniel.

- Fique quieta, Mara! – Ele sussurrou, mas ela não o ouviu e abriu a porta lateral do carro. O barulho do metal raspando o chão e rangendo graça as avarias que o mesmo sofreu denunciavam o movimento da soldado. Tudo foi muito rápido, tão rápido que Daniel mal teve tempo de reagir.

Mara saiu do carro e assim que se levantou, Daniel fez o mesmo, porém com as armas apontadas na direção do clone. Ele só não contava com algo realmente surpreendente, o clone estava de mãos vazias, enquanto Daniel sentiu-se completamente perdido mediante a imagem indigesta que seus olhos o transmitiam.

- Cuidado Mara! – Ele disse, mal percebendo que ela era apenas uma isca, porém Daniel entendeu isso tarde demais.

...

- O que você tem em mente? – perguntou João enquanto colocava uma compressa na testa de Ilmar. – Caramba, ele não ta nada bem – Ressaltou.

- Vai melhorar. Nossa prioridade é tirar o Daniel de lá e terminar logo com isso. Precisamos encontrar o doutor antes que – Mat parou e olhou para o vazio como se estivesse compenetrado nas profundezas de seus pensamentos - droga, antes que não haja nada mais o que fazer.

- Ta certo, e o que tem em mente? – insistiu João.

- Bem, ta pronto para uma boa briga? – Ele perguntou pegando sua Winchester. Mat apontou com os olhos para um canto do furgão, ergueu suas sobrancelhas e sorriu para o agente. O mesmo ainda sem entender nada sorriu de volta, pensando no que aquilo os ajudaria.

- Você é mesmo maluco! Mas, respondendo sua pergunta garoto, eu sempre estou pronto.

...

- Vamos ligar logo esse furgão e sair daqui!! – Disse um dos soldados que estavam apavorados dentro do furgão. Paulo sabia que não podia dar essa ordem, pois aquele trabalho não poderia ser interrompido. Ele tinha que encontrar outra saída. O experiente soldado olhou procurando para onde o furgão havia ido, mas eles não estavam mais ali, decerto os havia abandonado para morrer. O soldado sacou sua arma após ouvir o som do pára-brisas sendo atravessado pelas garras de um dos nanoinfectos.

A criatura de pele queimada posicionou suas garras contra a fenda, fazendo força em sentindo oposto, e abrindo o resistente policarbonato com as próprias mãos que se ensangüentavam enquanto o monstro enfiava seu rosto por entre a brecha e sua pele se rasgava, deixando-o com uma aparência incrivelmente assustadora.

- Maldição! Disse o soldado pegando a arma e dando um tiro na testa do nanoinfecto que morreu após dar um ultimo urro de dor – Você perdeu o juízo, eles vão nos trucidar! – Disse o soldado indo em direção aos controles.

- Tire suas mãos daí, rapaz! – Disse Dutra apontando a arma para ele. O soldado olhou a sua volta, mas nenhum dos outros quatro soldados arriscou-se a desobedecer Paulo. – Como vai ser garoto?

- Você está louco? Precisamos sair logo daqui! – insistiu enquanto outros nanoinfectos violentamente continuavam a tentar entrar no furgão. Em breve eles não teriam escolha.

- Pelo visto você não entende não é? Essa é uma tarefa com um valor muito maior do que o de nossas vidas, garoto. Portanto vou contar até três para que recupere seu controle! – Disse Paulo, imediatamente iniciando a contagem. O soldado olhou para ele confuso, queria tentar fazer algo, queria sair dali, mas os olhos de Paulo ficaram avermelhados repentinamente e naquele momento ele teve certeza de que Paulo estava falando sério.

- Ta certo! – Ele disse soltando os controles. Paulo abaixou a arma e num súbito instante uma das criaturas agarrou o garoto pelo buraco do para- brisa, puxando-o pelo pescoço enquanto Paulo o segurava pelas mãos e puxava-o de volta.

- Aaahhhhh!!! – Ele gritava enquanto sentia os dentes sendo cravados em sua carne e em seus músculos. As fisgadas chegavam ardentes e lamuriantes. Mais nanoinfectos começavam a puxá-lo como cães brigando por um pedaço de carne e o soldado levou consigo o pára-brisa. Caiu no chão enquanto as criaturas faziam o que ele temia, o massacravam vivo.

- Merda! – Disse Paulo vendo outro grupo preparar-se para atacar. – Preparar armas! – ele gritou enquanto as submetralhadoras eram apontadas para o vácuo, onde a chuva caia batendo contra o painel do veiculo e respingando em suas peles – Apontar! – Continuava instruindo os outros e aguardando o momento certo do embate - Venham logo seus merdas! – ele disse para as criaturas – Fogo!!!

As rajadas de balas saíram certeiras, penetrando nos corpos das criaturas seminuas, que os atacavam ordenadamente. Era estranho pensar que aqueles corpos em extrema decadência algum dia já haviam sido humanos.

A cada um que caía outros dois tomavam seus lugares. Os soldados a cada momento sentiam-se mais acuados enquanto o furgão estava completamente cercado.

...

- O que faz em minha mesa rapaz? – Mariano perguntou olhando para o monitor de seu computador a fim de encontrar algo que revelasse as reais intenções de Flávio. Há tempos ele desconfiava de seu assistente, mas até aqui eram apenas simples suspeitas. Flávio segurava um Pen Drive Streme key. Ele estava sentado e rodou a cadeira na direção do Doutor Flores.

- Desculpe doutor, estava tentando acessar a câmera do berçário, já que não tenho permissão de entrar lá. Estou tentando monitorar os fetos. Vi também que a estufa número um está com a temperatura dois graus abaixo do especificado, isso pode ser fatal para o processo de inserção – disse Flávio enquanto que suas mãos suavam e o Pen Drive escorria ligeiramente para dentro do bolso de seu macacão não tecido descartável, em cor branca, vestimenta comum para todos que freqüentavam aquele local. Seus olhos acompanhavam os de Mariano que permaneciam inquisitivos.

- Saia logo daí rapaz, deixe-me ver isso! – ele falou sentando-se e abrindo as câmeras – Deus do céu! Temos que iniciar o processo agora. – ele disse enquanto Flávio corria para chamar os outros.

...

Daniel sentiu como se tudo estivesse fora do lugar. Tudo aconteceu tão rápido, tão estranho e incomum.

Ele estava de pé, enquanto Mara apalpava o ar fugitiva de sua insegurança. Cega mas além de tudo hipoteticamente indefesa. Um sentimento protetor o tomou por completo e ele sabia que aquele poderia ser seu fim. Em meio a chuva sólida que o castigava, Daniel seguiu afoito sendo apedrejado, enquanto protegia seu rosto. Mara andava sem direção até que encontrou aquelas mãos tão conhecidas e tão semelhantes.

- Daniel! – Ela disse enquanto Daniel sentiu o impacto de uma pedra maior e caiu para trás. Sua visão ficou turva de repente enquanto os membros continuavam a atirar as pedras sem nenhuma piedade.

- Fique tranqüila meu bem, eu cuidarei de vocês! – Disse o clone enquanto Mara sentia um aperto mais forte em suas mãos. Ela sentiu-se presa, de costas para aquele que a segurava, sentiu uma língua tocar depravadamente seu rosto, quase a altura de seu queixo, subindo em um movimento agressivo, até despedir-se de sua pele sinuosamente.

O clone olhou para Daniel enquanto os membros apanhavam as pedras e continuavam a avançar contra ele que agora deitado de lado no chão quase que na posição fetal e desprovido de suas armas se defendia como podia, usando as mãos e braços feito escudo enquanto a dor chegava causticante.

Mara não podia fazer nada, estava presa nos braços fortes do clone que assistia a cena em meio ao êxtase de seus desejos. Seus olhos deslumbravam a cor do sangue que nascia das feridas que brotavam mórbidas a cada colisão. Daniel gritava e tentava se reerguer, mas a cada tentativa a guarda era baixada e as agressões chegavam ainda mais certeiras.

O clone lembrava-se de cada detalhe. Havia deixado todos prontos para atacar. Era essa a próxima pena de morte, o apedrejamento.

Ele olhou para o corpo caído em meio ao palco, o sangue à frente dos membros que permaneciam presos. Tudo estava perfeito, ao seu modo é claro. O corpo do mato-grossense Joelson Pereira estava debruçado sobre o piso do palco, suas mãos, rosto, roupas. Tudo estava tingido de um vermelho mortífero. O sangue jazia convertido em desespero na face do homem que estava queimado e carregava um semblante horrorizado. As pedras bateram contra seu corpo, intimamente. Um de seus olhos havia afundado, deixando a órbita aparentemente vazia, obscura e fria. Suas mãos e braços inchados, feito seus lábios, enquanto o rasto de sangue era visível, desenhando um mapa de seus lábios até se perder no piso. O homem estava estranhamente contorcido, inflexível e mórbido. Aquilo custaria a liberdade dos membros.

- O acordo permanece! – Disse o clone. – Agora fica fácil, eu liberto vocês e os soldados os resgatam, mas não entregarei o presidente até que eu tenha minha liberdade e principalmente, minha vida, uma vida só minha. – Façam sua parte! – Ele disse enquanto os homens entreolhavam-se munidos de suas pedras. Cada um lembrando de como tudo aquilo começou. O clone estava lá, no lugar de um maldito piloto.

Rendeu a todos e assim começou todo aquele caos. Sacou suas armas e colocou 12 membros para fora do ônibus, lado a lado enquanto os outros permaneciam trancados dentro do VCX.

- Cante! – Ele disse para o primeiro que tremia de medo – Cante traidor! Ele ordenou e o homem caiu de joelhos levando cinco tiros no peito. Mas aquilo não bastava, ele olhou para os outros e sorriu, apontou a arma para o corpo no chão e disparou novamente com o fuzil. O projétil atingiu a nuca e o corpo deu um arranque, as pernas tremeram e o sangue saltou do buraco como se estivesse fugindo de alguém. Os membros olharam para o cadáver no chão e começaram a vomitar, outros choravam enquanto o clone os olhava com desdém, e continuava sua matança.

Atirava sem piedade alguma enquanto os cinco membros conversavam entre si.

- Droga, e se ele nos matar! E se o plano der errado! E se ele for tão louco como o original. Raul pode estar errado! – Eles ainda cochichavam entre si, sentados próximos um ao outro.

Aquele era um plano muito arriscado e eles eram cobaias, nada mais que isso. Mas se não fosse assim, nada pareceria verdade. O clone entrou novamente no ônibus, parou de frente à todos, vendo o vasto corredor à sua frente. Quase dois metros de largura separando a todos e suas poltronas aconchegantes. Ele olhou para os cinco primeiros membros e sorriu enquanto sua armas eram apontadas na direção de todos.

- Felizes em me ver? – Ele disse sarcasticamente. – Bem, acho que todos me conhecem, ou ao menos já ouviram falar de mim, entretanto, que fique bem claro. Não me chamem nunca de Daniel, pois eu sou muito pior do que ele – O clone voltou os olhos na direção do clone do Presidente e sorriu mais uma vez – Então temos mais uma cópia muito bem feita. Não pense que sou ingênuo, você será minha garantia. Mas não se preocupe,tenho algo especial para você! – Ele disse enquanto o clone o olhava aparentemente pouco surpreso, e ao mesmo tempo dopado. – Encostem-se nas poltronas!! – ele ordenou apontando as armas, a principio alguns se mantiveram quietos. Em resposta a desobediência, disparou com a metralhadora, as balas perfuraram o teto do VCX apavorando a todos que prontamente atenderam sua ordem – Travar cintos de segurança – solicitou ele e todos se viram presos assuas poltronas – Segurança é tudo senhores! – Ele disse sarcasticamente.

O clone do presidente o olhou nos olhos, um olhar frio, feito o olhar do homem que ele viu pela primeira vez quando havia nascido no laboratório, o mesmo homem que o criou para um propósito, segundo ele maior do que tudo. Após tê-los prendido com o cinto, caminhou pelo corredor, dava para sentir o medo, o frio da morte correndo pela espinha dorsal de cada membro. Esses o acompanhavam receosos do próximo passo. O clone parou no meio do ônibus, abaixou-se, girou uma alavanca e uma espécie de alçapão se abriu.

O ruído do aço esbarrando um ao outro, o silencio nefasto sendo quebrado enquanto ele puxava cada elo trazendo consigo as correntes que tilintavam melancolicamente. O clone os acorrentou um a um, prendeu seus pés as poltronas e sorriu desgraçadamente. Olhou para o painel do VCX, e reconheceu cada comando, tudo como seu mestre havia lhe treinado. Mas o clone tinha outros planos e precisava de uma garantia.

Os membros olharam para Joelson, o clone os assistia enquanto eles permaneciam receosos. O mato-grossense estava com seus pés amarrados, pulava como uma criança que brincava de corrida do saco, mas não chegava a lugar algum. Era atração no centro do palco do Teatro Municipal. Quando ele começava a se afastar o clone atirava próximo a seus pés fazendo com que ele recuasse, enquanto a expressão de pânico tomava seu rosto e ele balançava a cabeça em sinal negativo, suplicando a todos que não o matassem. O clone absurdamente ria, gargalhava da cena.

- Vocês tem um minuto para terminarem logo com isso, ou eu mato todos vocês, e mato também o presidente – Ele disse apontando a arma para os membros.

Um dos membros apanhou uma das pedras e ergueu sua mão, olhou para o alvo e engoliu em sec. Ele nunca se imaginou preparado para aquilo, mas eram eles ou a oposição. Fechou seus olhos e imprimiu toda sua força em seu braço esquerdo. O canhoto lançou a pedra que acertou o ombro de Joelson que sentiu a pancada e abruptamente deferiu o primeiro grito de dor. O que se ouviu em seguida foi um aplauso vigoroso vindo do clone.

- Meus parabéns Renan Alves – E os outros começaram a atirar suas pedras enquanto o clone mal piscava acompanhando cada gesto imerso em dor. Os olhos brilhavam enquanto o representante do Mato Grosso recebia as pedradas. O homem caiu para trás após receber uma direto no olho, a pedra veio tão forte que afundou em sua órbita fazendo com que o fluido escorresse viscoso pela sua face. O castigo continuou enquanto os membros não paravam de atirar as pedras no homem, como se estivessem em transe. A morte chegou para Joelson lenta e dolorosa, enquanto seus colegas a administravam sobre a tutela do terrível assassino.

...

Paulo Dutra olhava para trás imerso em seu desespero. Estava sendo caçado, enquanto a chuva queimava sua pele. Seus olhos, avermelhados, a íris diferentemente da de todos os outros não estava avermelhada após a mutação, e sim carregava um tom mais carregado. Um tom púrpuro aterrorizantemente sangrento.

Atrás de si os corpos de seus ex-parceiros estavam entregues a fome degenerada dos nanoinfectos que os devoravam vorazmente, arrancando parte a parte de seus corpos. Paulo ainda pôde ouvir o grito de Ismael, era um soldado que ele mesmo havia treinado. Ismael levou um tiro não tão certeiro quanto os outros, a bala passou bem próximo de seu coração, mas o suficiente para manter-lhe vivo e entregue a toda aquela dor. Os gritos chegavam alucinados ao ouvido de Dutra que continuava vivo após ter usado sua própria equipe como isca.

Eles estavam cercados, Paulo olhou de relance o corpo de um deles ser abatido por dois nanoinfectos. Mesmo que a força deles fosse muita, os nanoinfectos estavam em maior numero. Não havia escolha, ele ordenou que eles cobrissem as portas do fundo do furgão e naquele momento as mesmas foram arrancadas. A cada saraivada de tiros, os monstros se aproximavam e eles se viam cada vez mais próximos da morte. Não haveria salvação para todos, foi aí que ele apontou sua arma contra as costas de seus soldados e os acertou. Aquilo foi a suficiente para que os nanoinfectos se empoleirassem neles feito urubus na carne seca, e dessem a ele míseros segundos para tomar dianteira e fugir após acertar em cheio dois deles que se debruçavam em uma das portas dianteiras. Paulo saiu em disparada em meio a chuva, atirando feito um louco enquanto os monstros surgiam de todos os lados e saltavam como bestas assassinas a sua caçada.

...

Mat e João olhavam para fora do furgão, enquanto Ilmar ainda permanecia desmaiado. Ambos pegaram as cordas que encontraram no furgão, pegaram as armas e saíram de lá caminhando na superfície irregular e molhada. Mat olhou para João que desequilibrado sentia os pingos tocarem sua pele.

- Pise nas juntas, se pisar no meio, já era! – Disse Mat sorrindo em meio a toda aquela situação. João em contrapartida estava trêmulo, de onde estavam podiam ver que um dos soldados era perseguido por uma multidão de nanoinfectos. João viu o mesmo cair e perder sua arma, dois nanoinfectos avançaram contra ele e o mesmo sacou sua faca e cortou a jugular de um, que caiu morto. A outra criatura pulou sobre ele enquanto os outros se aproximavam sedentos.

- Ei, vamos logo Agente Silva! - Disse Mat enquanto abria uma passagem para os dois. – Caramba! Não sei o que é pior, a ardência ou a coceira! – Disse Mat se queixando da chuva ácida que o afligia.

...

Daniel sentia que aquele era seu fim e via que não resistiria por muito tempo. O clone se afastava levando Mara consigo. Ela gritava inutilmente enquanto os membros impiedosamente atacavam Daniel.

- Onde ele está? – Perguntou o representante do Paraná, Osiel Cardoso.

- Lhes entregarei ele assim que meu rosto estiver pronto. E vocês tem muito pouco tempo. Quero uma cirurgia indolor, quero uma nova vida e um posto alto na segurança. Quero ser o salvador de toda humanidade junto de vocês, justamente o contrário do que Daniel sempre foi. Não sou um assassino, quem fez isso tudo foi ele, o que eu sou, é culpa dele!! E quando ele estiver morto, essa parte de mim morrerá junto dele

– Disse o clone olhando para Daniel e apontando sua arma obstinado a dar fim aquilo tudo.

...

Paulo Dutra estava sentindo a morte cada vez mais perto. A criatura o atacava enquanto ele sentia as garras cortarem seu pulso e o sangue brotar ligeiro. O cheiro de pele queimada, o odor da morte fresca a sua espreita. Enxergava os dentes amarelados, os olhos insanos da criatura que gritava feito o diabo em dias de fúria, enquanto abria sua boca tal qual um demônio faminto, louco para experimentar da carne fresca que estava a centímetros de seus olhos.

O nanoinfecto podia vislumbrar o pulsar das veias, podia inalar o aroma do sangue, e principalmente sentir o medo convidativo nos olhos de Dutra. Mas foi num lance de descuido da criatura que o soldado cravou suas mãos com uma força descomunal no pescoço do nanoinfecto. Suas unhas adentraram na pele do ex-humano de uma maneira bizarra e o sangue escapou ileso de vida alguma, misturando-se a enxurrada que corroia a pele de ambos.

...

O clone sentiu uma gota d'água tocar sua testa exatamente no momento em que se preparava para disparar. Naquele instante viu duas cordas penderem na altura do teto e pararem a poucos metros do chão. Abruptamente dois sujeitos desceram amarrados e atirando contra ele e os outros membros que pararam de atirar as pedras para se defender. O clone se afastou usando Mara de escudo enquanto João e Mat pararam presos pelos cintos. A corda tinha um nó na ponta que interrompeu a queda, eles soltaram a trava dos cintos e caíram apontando as submetralhadoras que encontraram no furgão. João olhou para Daniel e foi de encontro a ele andando de ré enquanto se via confuso com a imagem dos membros munidos de pedras como munição.

- Que merda está acontecendo aqui?? – Ele perguntou chegando próximo a Daniel e vendo-o repleto de sangue.

- Ei idiota! Pare aí! – Disse Mat ao clone enquanto apontava a Winchester para sua cabeça, deixando a submetralhadora cair no chão, já que com a Winchester teria melhor mira para abater o clone se o mesmo o desse alguma oportunidade.

O clone se escondia atrás de Mara, sua arma apontada para Mat enquanto seu braço contornava o pescoço de Mara que sentia o ar chegar cada vez mais escasso a seus pulmões. Mara puxava seu braço com suas duas mãos, mas a força do clone era algo fora do comum. Ela via seus braços, mas estava numa situação completamente atípica, debilitada e completamente sem alternativas.

- Calma menina! Logo você terá o que merece! – Disse o clone olhando para os lados e tentando raciocinar, ele sabia que Mat não arriscaria a vida de Mara, mas o problema maior dele era como sair dali.

- Ei Daniel! – Chamou o agente abaixando e vendo o sangue escorrendo da testa do condenado. Aquela imagem chegou até João como um maldito choque e ele apontou sua arma para Daniel num impulso.

- Assassino! – Ele disse enquanto um milhão de imagens passavam por sua mente.

- Você sabe mesmo lidar com a morte, garoto? – Perguntou o homem olhando nos olhos dele. – O candidato a agente penitenciário olhou ao seu redor. Vários outros candidatos estavam ali. Muitos até mais fortes que ele – Ele olhou de volta para o homem de bigodes brancos e respondeu com ar imponente – Eu vi meu pai morrer quando ainda era uma criança, a morte nunca me assustou depois disso, na verdade ela tem sido uma companheira para todos, não? Quem aqui não perdeu alguém? Senhor, estou preparado para esse trabalho, treinei arduamente para isso e passei em todos os testes psicológicos. Faço questão de ver cada um desses condenados morrer, e se for preciso mato eles com minhas próprias mãos! – As imagens alternavam em sua mente enquanto suas mãos tremiam. Os membros olhavam para João e mal entendiam o porquê dele apontar a arma para Daniel.

João agora estava em sua casa com sua mãe, quando dois homens de terno preto bateram a porta.

- Papai!! – Ele disse esperando que seu pai saísse de dentro da limusine, mas não havia limusine alguma, ao contrário disso duas sirenes piscavam sobre um carro negro feito a morte. – Sua mãe chegou até estava a porta e mal pôde esconder suas lágrimas que incontidamente saltavam de seus olhos. O garoto olhou para sua mãe e ela desviou o olhar. Naquele momento ele entendeu o que havia acontecido, seu pai estava morto. João subiu correndo as escadas e se trancou em seu quarto.

- Agente?? – chamava Daniel enquanto a dor chegava lasciva. João mal o ouvia, o dedo deslizando pelo gatilho, indeciso e tão resoluto em puxá-lo.

João continuava mergulhado em toda sua ira. Agora estava sozinho na rua, correndo em meio a uma multidão de pessoas. Carregava uma arma que seu pai havia lhe dado. Era apenas uma criança, um garoto que conhecera a dor de uma maneira incomum, se espremendo em meio as pernas da multidão que gritava em uníssono a palavra “Assassino”. João viu o homem que ele jurou matar com suas próprias mãos, carregou sua arma como seu pai havia ensinado e apontou para ele que estava de costas. O garoto empunhando o estilingue estreitou seus olhos, piscou um deles e atirou. A pedra acertou em cheio a nuca de Daniel, o condenado passou a mão por sobre a ferida, e eles trocaram um olhar que definiria tudo. Daquele momento em diante João descobriu que era capaz de qualquer coisa para ter aquele homem morto.

- Calma cara!! – Disse Mat tentando achar uma saída para aquela situação. Mara estava na mira do clone, assim como ele, se abaixasse a arma. Os membros continuavam ali, mas agora pareciam receosos em atacar, amedrontados pela winchester que a permanecia apontada para todos esperando o menor movimento possível. – Daniel é nosso amigo, agente.

- Assassino!! – Ele disse apontando a arma mais bruscamente, enquanto lamentações em formas de gotas escapavam de seus olhos amargurados e de repente assumindo um avermelhado ameaçador.

- Afinal, quem é você garoto?? – Perguntou Daniel se movendo lentamente enquanto a dor ainda o castigava. Seus olhos ardiam e os hematomas tomavam forma, trazendo consigo o inchaço e a ardência.

...

Tudo foi muito rápido, Daniel estava na mira de João. Mat estava completamente neutralizado, afinal tinha que proteger tanto Mara, quanto Daniel e ainda precisava conter de alguma forma o agente. O clone podia atirar a qualquer momento, mas ele ao invés disso não queria arriscar um tiroteio, se ele a perdesse ficaria sem trunfo algum. Começou a andar de costas lentamente, passo a passo aguardando a hora certa para sair dali, enquanto os membros permaneciam parados. Mas tudo aconteceu de uma maneira muito pior. O som do disparo chegou neutralizando a todos, que ouviram simultaneamente os gritos sibilares, e por fim Paulo Dutra entrou sendo perseguido por um grupo de nanoinfectos.

Os monstros entraram venenosos e seus olhos varriam o local enquanto eles aterrissavam de seus saltos sobre-humanos. As criaturas atacaram vorazmente enquanto a luta pela sobrevivência separara a todos.

Os membros começaram a correr pouco se importando para as armas de Mat, ou do clone. João olhou nos olhos de Daniel e algo o tomou. Uma estranha sensação de desconforto, um sentimento indescritível, algo que ele não sabia definir. O agente virou-se para Mat que estava cercado e então começou a atirar dando cobertura a ele.

Mat mirava e atirava com uma facilidade incrível, enquanto o clone continuava escapando junto de Mara. Entretanto agora ele tinha um aliado, Paulo Dutra o escoltava matando o máximo de criaturas possíveis. O soldado estava com o rosto quase irreconhecível, queimado e deformado. Eram cerca de vinte nanoinfectos. As balas logo acabariam. João e Mat continuavam a atirar, mas os monstros avançavam cada vez mais, rápidos saltando de um lado para o outro, movendo-se de uma maneira incrível. Desviavam de suas miras, atacavam com uma tática de caça subliminar, em duplas, em trios, em equipe. Era um maldito bando de uma raça extremamente evoluída e mortal.

Daniel arrastou-se até suas pt’s segurou suas armas e levantou-se imerso em dor. Olhou para Mara, ela estava sendo segura e arrastada em meio ao caos que se encontrava ali. Daniel abriu seus olhos, sentiu uma gota de sangue caminhar em seu supercílio, viu dois nanoinfectos indo em sua direção e atirou. Um tiro certeiro no peito de um deles enquanto o outro saltou livrando-se da bala e fitando-o com o olhar desejoso de seu sangue, o mesmo sangue que furtivo vazava de seu corpo.

João e Mat continuavam a disparar, cada vez mais acuados enquanto viam dois dos membros serem destroçados pelos nanoinfectos. Era uma carnificina sem igual. Paulo Dutra Fazia o que era possível. Atirava e se defendia, precisava do clone vivo para terminar sua missão.

Mara era necessária para o clone, mas até que ponto ele poderia carregá-la, até que ponto ela seria necessária como escudo. O clone queria usá-la contra Daniel, precisava dela para atrair o condenado, precisava ter um trunfo sobre ele.

- Deixe ela para trás! – Disse Paulo enquanto abatia mais um nanoinfecto, que caia a poucos metros deles. Outros chegavam, e a cada segundo que se passava eles se viam mais encurralados – Temos que concluir o plano! – Continuava Paulo.

O clone permanecia dividido entre sua vingança e sua sobrevivência. Olhou para Paulo e depois para Mara enquanto via Daniel atirar contra dois nanoinfectos. Mat e o agente estavam sem balas, o garoto lutava como um verdadeiro fuzileiro enquanto João em sua forma sobre-humana era encurralado por outros três nanoinfectos que rodeavam ele preparando-se para um ataque em conjunto.

Daniel ergueu sua arma, olhou na direção do clone e apontou. Mirou na cabeça dele, uma pequena brecha para matá-lo e preparou-se para atirar.

Mara estava indefesa, sentiu o cano da arma sendo comprimido contra sua nuca e o clone enfim se decidiu. Ele ia matá-la. Olhou para Paulo, o soldado frio era um bastardo de um assassino profissional. – Ele pensava e logo presumiu que ele seria sua saída dali. Virou-se para Daniel e sorriu. Foi quando sentiu uma cotovelada em seu estômago. Mara enfim havia conseguido uma brecha para revidar, mas não foi o suficiente para livrar-se dele. Ela sentiu uma de suas mãos livres e colocou-a sobre os olhos do clone.

- Vitória?? – Chamava Daniel enquanto Vitória se contorcia em dores. Daniel estava dirigindo o carro – Vitória?? – Ele continuava a chamá-la.

- Aaahhhhh!! – Ela gritava em meio ao seu sofrimento. – Me ajude Daniel!! – Ela gritava como uma garota de dezesseis anos que mal sabia o que fazer naquela situação. O sangue escorria entre suas pernas, ela estava deitada no banco de traz, as pernas abertas, enquanto a cabeça se recostava na porta traseira do lado do motorista.

- Não faça isso comigo meu amor!! Eu preciso de você! – Ele dizia enquanto chegavam a casa de Pedro. Suzana os recebeu a porta. A esposa de Pedro era enfermeira, havia feito dois períodos de medicina, mas desistiu de tudo quando se casaram. Achava que seria difícil conciliar um casamento com duas profissões que exigiriam tanto tempo dos dois. A mulher olhou para Vitória ainda descrente.

- Então essa é ela? – Ela perguntou atônita.

- Sim, a ajude Suzana. Pelo amor de Deus, a ajude! – Implorou Daniel enquanto Pedro chegava apontando a arma para ele.

- Eu preciso de sua ajuda, amigo! Acredite em mim, por favor parceiro! – Pediu Danie segurando Vitória no colo a frente da entrada da casa.

Pedro abriu caminho e eles entraram. Colocaram-na sobre a cama. Daniel segurou a mão de Vitória durante todo o parto. A criança nasceu prematura, e fraca. Foi mais de uma hora de pura agonia. Ambos em lágrimas quando tudo enfim acabara.

Vitória quase perdera a vida, estava tão debilitada, tão despreparada para aquilo tudo. Naquele momento Daniel percebeu o quão pouco Vitória havia vivido até então. Ele a olhou, beijou-a e pegou a criança no colo. A criança o olhava de uma forma estranha. O sangue ainda estava impregnado no corpo dela, junto com a placenta. E apenas naquele momento ele se deu conta que era uma linda menina.

- É uma menina, amor! Uma linda menina! – Ele disse enquanto Vitória mal tinha forças para erguer o pescoço. Pedro e Suzana acompanhavam cada detalhe, enquanto se mostravam encantados com a pequena criança.

- Eu sei – ela respondeu com a voz fraca – precisamos protegê-la deles Dan – Ela completou.

- O quê? – Ele perguntou, receoso.

- Você precisa protegê-la! Sabe disso! Prometa pra mim, Dan. – Pediu Vitória.

Daniel sabia do que ela falava, de todos os sonhos que tivera, de cada detalhe que lhe contara.

- Eu não posso perder você! – Ele disse sentindo que aquilo mais parecia uma despedida antecipada. Como se tudo já tivesse escrito em um maldito livro da vida, e seus destinos já estivessem previstos. – Você esta enganada! Não vai acontecer nada! – Ele insistia.

- Ela ficará com eles, Daniel. Quer que eu prove para você que sei do que estou falando. – Ela perguntou. – E naquele momento colocou as mãos sobre as de Daniel e então guiou as mãos dele até os olhos da pequena. – Veja por si só – Ela disse.

Daniel sentiu algo estranho, como se estivesse em transe. Tudo passou muito rápido, uma eternidade de acontecimentos em milésimos de segundo. Daniel viu tudo que Vitória tanto falava. Seu coração estava acelerado, a pulsação completamente fora de ritmo. Mas ele não estava ali, estava em um futuro catastrófico. Um mundo completamente diferente do que conhecia. O caos estava pelas ruas. Ele viu algo muito pior do que poderia imaginar. Mortes, assassinatos, viu sua filha e um laboratório, ele viu o próprio inferno.

- Deus!! – Ele gritou enquanto tirava suas mãos dos olhos da pequena fugindo daquela visão deturpada e sórdida. – O que foi isso? – Ele perguntou perplexo.

- É por isso que eu tive esses sonhos, Daniel. Nossa filha tem um dom muito especial, e através dela eu vi tudo aquilo, mas ela também tem uma carência. Ela é cega Daniel. Imagine o que ela vai significar para eles? Será muito pior do que foi pra mim, ou do que poderia ser. – Vitória dizia meio as lágrimas. – Ela será um rato de laboratório, uma cobaia. Eles a verão como o futuro, uma nova raça, tudo aquilo que ele quer já está feito.

- Eu já fui longe demais, não posso te matar? – Ele disse sem esperanças.

- Não importa o que eu quero, Daniel. Não importa o que o mundo vai achar de seus feitos. Nada disso importa. Tudo o que fez até agora, todas as mortes, você já viu o que vai acontecer. O que eu sei é que você fará tudo que for possível para protegê-la, e salvar o nosso futuro, o futuro de todos. – Ela disse.

Daniel olhou para a pequenina, tão frágil e tão poderosa. A segurava quase desengonçado, entretanto com um afeto suntuoso.

- Como a chamaremos? – Ele perguntou.

- Eu queria que seu nome fosse Mara. – Disse ela segurando-a no colo pela primeira vez.

Mara retirou a mão dos olhos do clone que a olhava, pasmo. Ele tentou apertar o gatilho, porém seus dedos não obedeciam as suas vontades. Um turbilhão de sentimentos tomando conta do clone. Ele olhou para Paulo, puxou Mara contra si e olhou nos olhos de Daniel que estava pronto para atirar.

Daniel olhou para o lado, ele tinha que fazer uma escolha. Mara estava nas mãos do assassino. Decidido ele apontou novamente a arma e disparou. O projétil chocou-se em cheio com a face do agressor. O mesmo caiu rodando aos pés de João. Mat estava caído no chão enquanto outro nanoinfecto avançava para cima dele. A criatura saltou e foi em sua direção quando um novo disparo acertou o peito dela. Daniel estava de pé, derrubando mais dois e livrando João e Mat.

- Precisando de ajuda? – Ele perguntou percebendo que os três estavam cercados, e o pior viu que Mara e o clone haviam desaparecido, junto de Paulo Dutra.

- Onde está Mara? – Perguntou Mat segurando suas facas enquanto um bando de nanoinfectos se agrupava ao redor deles fechando o cerco.

- Tive que fazer uma escolha. – Disse Daniel olhando para João – Acho que dessa vez a razão falou mais alto que o coração – Ele continuou.

- Por que me salvou de novo? – Perguntou João.

- Ainda não tenho motivos pra deixar que morra – ele disse enquanto os nanoinfectos gritavam prontos para atacar – tenho mais duas balas. – ele revelou.

- Merda! – Disse Mat. Daniel disparou e o som dos disparos foram abafados pelo som do furgão que entrou a toda força para dentro do Teatro atropelando os nanoinfectos e abrindo caminho para os três.

- Venham logo! – Disse Ilmar Candido após abrir a porta do veículo. Os três pularam para dentro enquanto ele atirava feito um louco com um das submetralhadoras. – Caramba, isso que é trabalho! – Ele comentou enquanto eles fugiram dali.

- O que vamos fazer agora? – Perguntou João.

- Precisamos achá-los! – Respondeu Daniel.

- Mas não temos Mara, se esqueceu? – Observou o agente.

- Ei, temos um rastreador. – Disse Mat.

- Então temos tudo que precisamos aqui – Concluiu Daniel olhando curioso para João – Agora agente,conte-nos você, quem é você afinal?

– Ele perguntou apontando sua arma para o agente enquanto o furgão seguia o rasto de VCX. Abordo dele O clone, Mara, Paulo Dutra e o clone do presidente, que continuava completamente inerte como se fosse criado para morrer.

Mara estava acorrentada na poltrona, suas estavam presas. Ela forçou-as trazendo as duas mãos que estavam algemadas para o bolso lateral de sua roupa enfiou uma delas no bolso e puxou o embrulho. O clone e Paulo Dutra estavam sentados a frente enquanto pareciam conversar com alguma outra pessoa através do comunicador. Foi naquele momento que ela tocou o objeto e as imagens chegaram a sua mente espontaneamente.

Continua...

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Sidney Muniz
Enviado por Sidney Muniz em 28/06/2012
Reeditado em 01/07/2012
Código do texto: T3749252
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