Espantalhos
Me lembro que toda vez que ia visitar meus avós quando criança, chegando ao sítio onde moravam, eu já ficava apavorado pois sabia que eles estavam lá, espalhados pelo meio das plantações.
Pareciam me olhar como se eu tivesse culpa, como se eu tivesse colocado eles ali, tomando chuva e sol.
Eles me davam muito medo, quase beirando o pavor.
Sabia que sempre estariam lá. Os espantalhos do sítio.
Mas isso foi há muito tempo, eu ainda era um garoto e meus avós eram bem ativos ainda, sempre trabalhando no sítio.
O tempo passou, me tornei adulto e meus avós se tornaram simpáticos velhinhos e contrataram pessoas para cuidarem do sítio. Hoje eles passam o tempo vendo TV e aguardando a morte chegar.
Me mudei de cidade e poucas vezes fui visitá-los.
Essa noite acordei assustado e desesperado.
Tive um pesadelo hoirrível. Sonhei que o espantalho saia do milharal e me perseguia, e eu era ainda criança no sonho.
Era como se meus temores de infância tivesse se tornado realidade.
Ao acordar tudo parecia tão real. O medo, o desespero de ser perseguido por um espantalho era assustador demais.
Eu sabia que ele queria me matar, não sabi porque, mas sentia isso.
Não consegui mais dormir o resto da madrugada pensando no sonho.
Imaginei meus avós lá no sítio e aqueles espantalhos na plantação.
Por mais absurdo e bizarro que a ideia pudesse parecer, isso me assustou.
Pela manhã, me levantei e mesmo sem ter noção do que estava fazendo, quando dei por mim já estava no carro me dirigindo para onde meus avós moravam. Era algo automatico, como se algo me atraísse para lá.
Sentia um arrepio toda vez que o pesadelo voltava à minha mente.
Depois de algumas horas dirigindo, cheguei ao ponto onde eu deveria pegar uma estrada de terra que levava a uma região onde ficava o sítio deles. Logo comecei a avistar várias silhuetas de espantalhos em várias outras propriedades pelas quais passei. Estava lá imóveis, como se vigiassem tudo o que ocorria por ali.
Após um bom tempo por essa estrada cheguei ao sítio de meus avós. Tudo estava como eu ainda era garoto, as plantações, o portão de acesso, as velhas árvores, tudo estava lá. E eles também.
Me aproximei da casa, estacionei em frente. Achei estranho não ter visto nenhuma pessoa trabalhando no sítio, mesmo sendo um dia normal de trabalho.
Senti uma sensação estranha ao descer do carro e me aproximar da casa.
As portas e janelas estavam abertas. Ao subir os degraus que davam para a varanda novamente senti a estranha sensação, uma mistura de medo com susto, um desejo de dar meia volta e sair dali.
Chamei por eles mas ninguém respondeu.
Entrei. A TV ligada e ambos sentados no sofá de costas para quem entra na sala.
Achei estranho. Tive medo. Um cheiro de carne podre no ar. Um peso no ar.
Fui me aproximando devagar. Quando os vi quase minhas pernas me deixam sem amparo e uase vou ao chão.
Era dificil acreditar no que meus olhos viam.
Meu estômago revirou e achei que fosse vomitar.
Ali sentados estavam dois espantalhos. Um casal na verdade.
Suas mãos de palha seguravam uma faca e estavam sujas de sangue.
Imediatamente me veio à mente a imagem dos espantalhos que vi na plantação quando me dirigia para a casa.
Eu não queria acreditar no que minha imaginação me mostrava.
Era impossível, era algo bizarro e grotesco. Mas de repente notei uma mancha de sangue no chão, como se algo tivesse sido arrastado da sala para fora. Algo ou alguém.
Sai correndo e tropeçando nos móveis. Precisava me certificar de que minha imaginação estava errada.
Corri até o carro e dirigi até à estrada onde avistei os espantalhos. Estacionei e corri desesperadamente em direção aos espantalhos.
Quando me aproximei vi algo que nunca imaginei ver em miha vida. Os espantalhos eram meus avós.
Estavam lá, com as barrigas abertas e suas entranhas escorrendo até o chão. Seus olhos haviam sido arrancados ou comidos pelas aves. Suas mão foram arrancadas e trocadas por palhas.
O pesadelo tinha se tornado realidade.
Fiquei ali parado sem saber o que fazer nem sei por quanto tempo.
Fui até a delegacia da cidade e relatei toda a história.
Os policiais que me atenderam se entreolharam e me pediram que voltasse para minha cidade que eles resolveriam o caso. Fiquei transtornado com essa atitude.
Eles disseram que não havia nada que eu pudesse fazer ali.
E de repente me senti totalmente estranho e como se estivesse dopado, me despedi deles e me dirigi ao carro.
Voltei para minha casa. Só me lembro de estar estacionando o carro em frente á minha casa.
Não sei se isso tudo foi real ou um pesadelo. E não pretendo voltar lá par descobrir.
Só sei que meu carro estava muito sujo de poeira e que havia palhas enroscadas no para choques.
E às vezes ainda sonho com os espantalhos, mas no sonho sempre eles estão indo embora para algum lugar.
Ainda tenho medo deles.