A viúva de Coxim
Na pequena sala, à meia luz, aquela biblioteca era tomada pelo silêncio, o silêncio da morte.
No meio, rodeado por oito cadeiras ali estava a urna, fechada e em meio ao velório apenas uma viúva sentada, a observar seu amor verdadeiro? Sim, pelo que as pessoas à volta pensavam, a ver tal casal, preso a um romance inesquecível. A verdade não era exatamente esta.
Há vários anos, ambos estavam separados, porém mantinham as aparências, principalmente para os amigos mais chegados.
Sob as quatro paredes, um convívio pesado, marcado por discussões e ofensas pesadas. As desavenças haviam começado anos atrás, devido à impossibilidade da esposa em engravidar, tornando-se ainda piores após a descoberta de uma amante, na vida de seu marido.
Devido a uma ocupação honrosa na câmara dos vereadores do município de Coxim, como político exemplar por dois mandatos. Natural de Campo Grande, o vereador era viciado em cigarros, e por onde passava sempre trazia consigo um maço, marca Field.
Entretanto, em meados de 2009 fora descoberto um esquema pesado de corrupção, sendo o nome de Armandinho Campos lembrado como o cabeça do esquema.
Sob intensa pressão popular, o político renunciou ao cargo público, não se safando das acusações, saindo humilhado do poder.
Passado tal episódio, preservar a imagem de casal perfeito já não faria mais sentido. Tais processos também lhe custaram a falência econômica, levando-o à miséria.
Jussara Campos, insatisfeita com a situação resolveu pedir o divórcio, após a mesma envolver-se com um sub-secretário de meio ambiente.
Falido e desprestigiado, Armandinho findou seu ciclo, atirando contra a cabeça em sua própria casa.
À despeito de tal homem sem moral, em seu velório quase ninguém apareceu. Para não tornar tal situação ainda pior, Jussara sentou-se em frente ao caixão, vestida de preto e com um véu sobre o rosto.
Solitária em tal salão, começou a sentir um forte arrepio dos pés à cabeça. Sua sensação se assemelhava a estar dentro de uma câmara frigorífica.
Assustada, dirigiu-se ao caixão lacrado implorando para que Armandinho partisse logo e a deixasse em paz. Mesmo assim o arrepio não passou.
Após o enterro as sensações continuaram a se repetir todas as noites. Ela sentia a presença de Armandinho em sua volta, apesar de não poder ver. Por vezes pedia para que ele descansasse em paz.
Na última noite de outubro, os arrepios vieram ainda mais intensos, acompanhados de ruídos e gritos, ecoados na casa sob penhora.
Jussara ajoelhou-se e começou a chorar atormentada, até ver um forte vulto, acompanhado de um imenso cheiro de enxofre. Sem saber mais o que fazer com tal presença do além, a viúva de Coxim ajoelhou-se pedindo perdão ao falecido e dizendo que também o perdoava, e para que este pudesse descansar em paz.
Após alguns minutos os barulhos cessaram, o calafrio passou e uma imensa sensação de paz deixou Jussara mais tranquila.
Sorridente com tal desfecho, a viúva saiu da casa rumo à padaria central. Ao atravessar uma das avenidas, um carro lhe surpreendeu, atropelando-a e matando-a no local. Populares tentaram socorrê-la e não deixar o assassino fugir, mas sob os olhares de todos o motorista simplesmente desapareceu.
Dentro do carro, um forte cheio de fumaça, algumas bitucas e uma carteira sobre o banco do passageiro, marca Field.