Insônia ( A Locomotiva)

"A emoção mais antiga e mais forte da

humanidade é o medo, e o mais antigo e mais

forte de todos os medos é o medo do

desconhecido."

H.P Lovecraft

As sombras da noite, elas sempre estão aqui para me atormentar. O medo do desconhecido é meu companheiro em noites tão frias como essa. O ponto de convergência de tudo isso se passa em minha mente, em meu ego.

As noites passam, mas o tique taque do relógio me desespera. Insônia. Descompasso, mais um cigarro acesso, mais um pouco de café. Aqui dentro, já não sei mais o que é realidade, sonho, alucinação ou devaneio. Não me sinto mais linear. Sou um desconhecido em meu próprio mundo. Minha vida é como um carrossel, rodando e rodando, mas as noites são sempre inúteis, sempre solitárias e meu consolo é aceitar-me nessa rotina.

Certa vez, enquanto me desesperava pensando, incondicionalmente, entre as fronhas pálidas de meu leito, bem ao longe, ouvi um barulho. Um ruído se sobrepunha ao do relógio, ele se fazia presente sobre o grau de lucidez da minha mente. Um som alucinado que parecia uma locomotiva, a todo vapor, vindo ao meu encontro.

Imediatamente, senti os pelos do corpo arrepiar-se.

Meu deus, o que era aquele som? Por que varava a noite e rasgava minha calmaria? Sabia que ninguém mais o sentia. Mas, não descobri se era um pesadelo ou uma ilusão, pois não tinha certeza se dormia. Apenas, ouvia o som tortuoso, que agora, aproximava-se do meu quarto. Pude ouvir quando adentrou, tornando-se ensurdecedor. Senti-me um covarde, pois não tive coragem para abrir os olhos, cerrei-os ainda mais. E, o som continuou, entretanto, agora me adentrava.

Não era um som qualquer, pouco mais que um ruído seco e não se fazia constante. Começou a rodar em minha cabeça, circundando-a, enlouquecendo-me. Finalmente, senti o calor extremo de engrenagens etéreas parando, bem perto do meu pescoço. Um bafo quente terrível, imediatamente, encharcou-me de suor.

Ouvi passos e gritos. Alarido, Algazarra, Celeuma. Pessoas chamando por nomes que eu não conhecia. Ouvi ganidos de coisas desconhecidas e o canto de alguns pássaros, sabia que não eram deste mundo, pois, não eram doces melodias, mas um angustiante gorjeio, como o infortúnio de quem sofre com dores do passado. Gritos infantis e de velhos, eram medonhos, pois, lamentavam horrivelmente.

Um grito amargo soou ao fundo. Imediatamente, chamou-me a atenção, pois alguns segundos depois, ouvi-o novamente. Concentrei-me nele, parecia vir de mais longe que os demais, porém, a cada novo chamado, ficava mais próximo. Destinado a me assombrar, o grito chegou mais e mais perto, finalmente, notei que seu emissor chamava por mim.

Um novo arrepio percorreu-me a espinha. Os pelos de minha nuca levantaram-se, saudando o medo que tomou conta de minha alma. Uma descarga de adrenalina subiu em direção ao meu coração. Meu cérebro atordoado, não raciocinava mais.

Por sobre a voz que chamava meu nome, escutei outro som. Esse sim, me fez conhecer a verdadeira sensação de medo. Causou-me Suor Frio. Tive mais medo. Não era um grito, não era nem sequer uma voz. Lembrou-me um rugido, mas não de fera. Parecia um suspiro dos portões do inferno.

Minha respiração ofegante causava-me náuseas, a curiosidade deslizou-se em mim. O que era aquilo? Quem chamava meu nome?

- Por Deus, alguém me ajude! – minha mente covarde clamava desesperada por socorro.

Do fundo de toda essa balburdia, um som se fez poderoso, soterrando todos os demais. Era como um Trovão, mas sabia que não passava de uma voz. Ordenava.

Imediatamente, ouvi um estampido, como que uma salva de canhões. Cerrei mais ainda os olhos, pois, estremeci com aquilo.

As engrenagens voltaram a soar, preparavam-se para partir.

Ouvi novos gritos. Esses menos assombrosos, até faziam-se suaves. Passos apressados silenciavam-se, calmamente. Ruídos cessavam-se. Tudo se aquietava, ficando apenas, o barulho insano da Locomotiva preparando-se para partir.

Finalmente, o som ecoou em minha cabeça e até altas horas da madrugada pude ouvi-lo. A Locomotiva afastando-se, indo assombrar outro lúgubre insone.

João Murillo
Enviado por João Murillo em 17/04/2012
Código do texto: T3618366
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.