Sexta-feira 13 em Parabapiacaba
O livro de encantos, sobre a cabeceira despertava o mais perverso desejo. A promessa de superar sua feiúra, obesidade e antipatia em troca de alguma oferenda eram muitas. Bastava que Vanessa fizesse tudo conforme o combinado.
Em um dos encantos do livro, estava escrito que se ela oferecesse um sacrifício humano, fossem familiares ou amigos próximos, seus desejos seriam atendidos mais rapidamente. Conquistaria beleza, dinheiro e sucesso.
Naquela sexta-feira 13 tudo parecia muito banal. A vila de Paranapiacaba trazia consigo muitas histórias fantásticas. Os espíritos que habitavam cada uma daquelas casas de madeira, os trilhos da velha estrada de ferro e principalmente um espírito inglês, que morava no relógio, tudo fazia sentido.
Entretanto, Vanessa temia dar algo errado e preferiu um sacrifício mais ameno, envolvendo um animal de estimação de sua irmã Clarice. Não podia dar errado. Os gatos são animais bonitos e importante era em tal sacrifício haver sangue.
Em um golpe certeiro, a pequena bruxa apunhalou o felino de dois anos de idade, matando-o sem dar chance de se defender ou fugir. No encanto, estava escrito que a garota deveria colocar a cabeça do animal morto em um prato de porcelana, juntamente com rosas vermelhas e uma vela acessa na encruzilhada da Avenida Fox.
Na manhã seguinte, Clarice estava inquieta procurando seu gato. Seus hábitos noturnos o faziam vagar pela vizinhança madrugada adentro, mas pela manhã sempre retornava para comer. Vanessa permaneceu quieta, até o momento que uma pequena formação de pessoas viu o prato com a oferenda, escandalizando-se. Ao ver a cabeça de seu animal, Clarice entrou em pranto, jamais imaginando que sua irmã fora a responsável por tal ato desumano.
O importante é que Vanessa finalmente conseguiria conquistar seus objetivos. O livro era claro, e certamente os resultados positivos viriam na primeira segunda-feira, do quinto mês, naquele ano. Aliás, o peso de matar um animal era muito menor do que matar um ente querido.
Na noite do primeiro domingo, no quinto mês daquele ano, Vanessa não conseguia dormir, talvez tomada pela ansiedade de sua possível conquista do dia seguinte, ou quem sabe um verdadeiro tormento estivesse tomando conta da moça. Ao se revirar em sua cama, Vanessa enxergou um estranho vulto, ou era uma sombra? Era mais do que isso. Havia alguém sentado em sua cama, pois era possível sentir o peso próximo aos seus pés. Toda arrepiada cobriu sua cabeça com o cobertor, mas mesmo assim ainda dava para perceber alguém puxando as cobertas. Um pequeno feixe de luz, vindo do farol de um trem de carga que seguia para Cubatão penetrou pelas frestas da janela, refletindo o rosto da horrível criatura naquele quarto.
Era um ser estranho, cor marrom e ainda pior, com rosto de gato, semelhante ao gato que fora morto. O terrível medo de Vanessa já havia alcançado os piores níveis, e mesmo que tentasse gritar, parecia que sua voz jamais sairia. Então o terrível mostrou olhou-a fixamente, dizendo que tudo havia sido feito corretamente e que Vanessa haveria de conquistar seus desejos, porém isso lhe custaria muito caro, pois ela trocara o sacrifício humano por um animal.
Na manhã seguinte, chegou uma carta registrada pelos correios endereçada a Vanessa. Dentro dela, um cheque no valor de treze milhões de reais. Ao dirigir-se ao banheiro, Vanessa notou em seus braços a presença de muitos pêlos. Quando olhou no espelho começou a gritar. Seu rosto estava coberto de pelos e bigodes, e seus olhos, em tom amarelo a deixaram com uma face monstruosa. Ela havia se transformado em um ser terrível, com características de um gato.
Saindo em silêncio de sua casa, Vanessa atravessou os trilhos e esperou até que próximo trem viesse, jogando-se à frente e morrendo de forma cruel. Ao ser encontrado, seu corpo já não mais apresentava tais características estranhas.
Horas mais tarde, um animal vagava as suas da antiga vila. Seria o gato de Clarice?