A Dona do Pingente

Os gritos de Renata podiam ser ouvidos por toda a vizinhança. Qual seria o tormento dessa moça:

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Renata era uma bela garota, de longos cabelos encaracolados. Aos quinze anos, estudava em uma escola pública, da pequena cidade de Japaratuba, perto de Aracaju.

Sorridente e conhecida por todos, Renata tinha um hábito no mínimo estranho para seus amigos: costumava passear no cemitério da cidade, ora para ler e estudar ou mesmo para relaxar. Seus pais consideravam aquilo tão absurdo que chegaram a proibir a garota de fazê-lo, apesar disso jamais tê-la impedido.

Em um desses passeios mórbidos, Renata viu um cortejo fúnebre levando uma velha moradora. Haviam poucas pessoas, talvez pelo fato de ser uma senhora muito pobre e sozinha. Conta-se que tal mulher era mãe solteira, e seu único filho havia morrido em um acidente de carro há mais de vinte anos. Desde então, tal mulher, por onde passava, carregava consigo uma correntinha de São Sebastião que era do seu filho morto.

Esta corrente foi colocada sobre o caixão da mulher, que seria enterrada em uma vala comum. No momento do enterro, a correntinha caiu sem que ninguém percebesse.

Renata estava acostumada com tal cena, mas de algum modo, aquela chamara sua atenção. Depois do enterro, Renata, que observava à distância caminhou até o local e permaneceu alguns minutos olhando fixamente para a pequena cruz de madeira. Era só mais uma pessoa morta, mas nem mesmo a moça compreendia o por que estava ali parada. Nesse momento, viu algo brilhante no chão. Quando se aproximou, viu a pequena correntinha prateada e acabou pendurando em seu pescoço por tê-la achado muito linda e considerar um desperfício deixá-la ali jogada.

Renata foi pra casa feliz da vida, como sempre. Diante do espelho ela olhava tal correntinha, a qual lhe despertava uma inexplicável admiração. Era feita de prata mas não tinha nada em especial, apenas o pingente de São Sebastião.

Dias depois, Renata estava mudada. Deixou de vez o hábito de passear no cemitério. Parecia estar deprimida, não tinha apetite para se alimentar e ficava a maior parte do tempo no seu quarto. A aluna exemplar passou a faltar nas aulas, a tal ponto que alguns professores a visitaram em casa para saber notícias.

O tempo ia passando e a bela garota adoeceu. Seus pais a levaram em vários médicos mas os exames não constatavam qualquer anormalidade. Um psicólogo sugeriu ser uma forte depressão mas não conseguia definir um tratamento.

Renata tomava medicamentos, sem sucesso. Nunca abria mão da correntinha. De repente, Renata começou a relatar que ouvia vozes. Alguns médicos diziam ser alucinações, e devido à forte anemia que contraíra, a garota morreria em breve.

Em uma noite, Renata estava febril e delirava. Em suas palavras ela dizia: "devolve, preciso devolver, ela o quer de volta". Na mesma noite, Renata foi internada em um hospital da capital, ficando em coma. Seu estado de saúde se agravava a cada dia e os pais, desesperados não sabiam o que fazer. Somente as lembraças das palavras ditas pela moça: "devolve, preciso devolver, ela o quer de volta".

Na madrugada do final de semana, uma estranha mulher entrou na sala de visitas. A velha, de aparência horrível procurava por uma moça de cabelos enrolados. Com essas descrições ficava difícil definir quem era tal paciente.

Em determinado momento passou uma maca com o corpo de uma jovem para o necrotério. A velha interrompeu o translado, sob os protestos de enfermeiros e médicos. Sem exitar, levantou o lençol e arrancou a correntinha com força, saindo tranquilamente pelo corredor. O médico chamou os seguranças, os quais correram atrás de tal mulher, mas estranhamente, ela havia desaparecido.

No domingo, quando Renata ia ser sepultada, seus familiares ainda não compreendiam onde havia parado aquela misteriosa correntinha, que a moça tinha tanto zelo. Nos fundos do cemitério, em uma vala comum, finalmente a velha poderia descansar em paz, ao lado da única lembrança do filho morto. Em algumas noites, é possível ver uma jovem, sentada sobre um mausoléu, lendo seus romances.

Paulo Farias
Enviado por Paulo Farias em 12/04/2012
Código do texto: T3608038
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