A Árvore Maldita
-Doutor, recebemos uma ordem para remover todas essas árvores para a futura construção do empreendimento de luxo. O Sr Américo quer isso para ontem.
-Sei Roberval, mas acontece que temos um problema -aquela árvore á direita, é centenária, não posso derrubá-la sem autorização da organização ambiental.
-OK, Doutor, o patrão tá puto da vida com sua insistência de preservar a árvore. Ele exige que o senhor dê continuidade ao projeto. Embora eu continue te apoiando, não derrube Dr Lucas, dê um jeito. Já te falei da história da árvore gigante lá. Vai sobrar para tu, se mexer com ela.
-Vou falar com ele.
-Acho bom Dr, senão vai sobrar para mim, cabra.
-Pode ir Roberval, peça para o Túlio trazer a grua imediatamente, temos muito trabalho pela frente.
-Precisar, só chamar.
Nesse instante Lucas, o engenheiro civil do projeto do shopping, liga para o seu chefe:
-Sr Américo, aqui é o Lucas.
-Fale, Lucas
-Não posso derrubar a árvore. O senhor pode levar uma multa altíssima, pois ela é centenária. Isso também não seria nada bom para a sua imagem.
-Não quero saber, Lucas! você está indo longe demais com essa maldita ideia de preservação ambiental. Foda-se o Ibama, os ambientalistas, esses merdas desses estudantes. Derruba logo essa porra, caralho! Que merda, homem! Se você não fizer o que peço, estará na rua. Tem certeza que você é engenheiro? porque está mais para granjeiro!!! parece um frango, porra!
Lucas engoliu em seco sua raiva e disse -Ok, Sr Américo. Prometo que amanhã derrubarei todas a árvores, inclusive a centenária.
-Escuta, Lucas. Não me ligue mais para reclamar dessa merda, pois pode considerar-se demitido. Entendido?
-Sim.
Américo bateu o telefone nervoso e pensou - não se faz mais homem como antigamente -um frangote com medo de derrubar uma arvorezinha..irritado foi até o bar e serviu-se de um vinho francês e jogou-se na poltrona- imaginava seu empreendimento lhe trazendo fama, dinheiro e sucesso.
Lucas estava possesso, era horrível lidar com homens mal educados, grossos e sem um pingo de respeito. Cansava-se de tanta humilhação por parte daquele homem. Havia construído um apartamento caríssimo para a construtora do Sr Américo, mas pensou que depois dessa obra iria pedir demissão -dinheiro nenhum valia tamanha humilhação. Tinha que ficar calmo, sua esposa estava grávida e não queria deixá-la preocupada.
Chegou em casa pálido. Sua esposa Safira, logo percebeu que não estava bem.
- Que foi querido?
-Ah, querida estou com problemas.
-Aquele assunto da árvore?
-Como sabe?
-Querido essa noite tive um sonho estranho. Por favor não derrube aquela árvore.
-Querida se eu não fizer isso perderei o emprego.
-Pois então, peça as contas.
- O que você sonhou, Safira?
-Por favor, Lucas prometa para mim, jure pelo bebê que estou esperando que não derrubará aquela árvore.
Lucas com a fisionomia contraída prometeu.
No outro dia chegou ao trabalho e ligou para o Sr Américo alegando que não derrubaria a árvore. Este, por sua vez o demitiu.
Lucas arrumou seus papéis para ir embora e foi até o mestre de obras Roberval, para despedir-se.
-Fui demitido, Roberval.
-Sei Dr Lucas. O Dr não quis derrubar a árvore. Fez bem, essa árvore é maldita!!
-Você vai derrubar a árvore Roberval?
-Eu Dr Lucas?
-Tá maluco, cabra? eu não disse ao senhor que essa árvore tem uma maldição, nenhum homem quer derrubá-la.
-Não acredito nisso Roberval, só não quis derrubá-la porque é centenária.
-Pense como quiser Dr, mas o senhor se livrou da maldição da árvore.
-Vou embora, qualquer coisa me ligue.
O mestre de obras ligou para o Sr Américo dizendo que não iria derrubar árvore. O homem ficou tão irritado que demitiu a todos. Desligou o telefone enfurecido e resolveu ele mesmo podar aquela árvore pois já tinha custado muito prejuízo. Pensava- Que porra de árvore é essa? Por que ninguém quer derrubá-la? iria fazer isso á noite, quando deu o horário, pegou o carro e dirigiu-se para a obra.
O relógio marcava 19:00h em ponto e a lua cheia iluminava a noite. O terreno da obra estava cheio de cimentos, canos, vigas, tijolos e todo o tipo de material de construção. Pensou- era absurdo parar tudo por causa daquela maldita árvore. Pegou o machado e trouxe consigo a serra elétrica, iria fazer isso o quanto antes. Chegou de frente a árvore. Era bonita com grandes galhos em vários tons de verde e parecia muito forte, uma coruja piava ali e um pássaro estranho passou em voo rasante. Ele olhou para ela com raiva e pegou machado com força disposto a dar o primeiro golpe. Quando ia desferir, gritou:
-Que merda é essa?
sangue escorria através de suas roupas, porém não sabia da onde até olhar para o seu corpo - o braço direito foi arrancado. Ele deu um grito do fundo de suas entranhas..a raiz da árvore saía da terra e puxava seu pé. Estava sendo arrastado. Congelou de medo. Enquanto debatia-se tentando se livrar daquilo, as folhas caíram como ácido em seu rosto fazendo feridas pustulentas que vazavam um líquido fétido e esverdeado. O cheiro de carne podre subiu até a suas narinas. Pedaços de sua pele descolaram-se do rosto e ele desesperou-se. A árvore deu uma balançada e emitiu um ruído tão sinistro que ele interpretou como se ela houvesse dito algo. Lá em cima, passou novamente aquele pássaro preto, era um corvo que observava tudo. Ele se rastejava como um verme, pois sabia que seria o prato daquele animal que o fitava com ferocidade. O corvo desceu e bicou seu olho direito e depois o esquerdo; esguichava sangue e ele em vão tentou segurá-lo, gritando e esperneando de dor. Finalmente o corvo voou rumo as sombras da escuridão levando consigo seus dois olhos. Ele gemia de dor, contorcia-se e dizia a árvore -Mate-me maldita! a árvore só emitia uns sussurros graves que pareciam gemidos dos mortos. Ele deitou-se de bruços na terra tentando aliviar a dor, mas foi puxado novamente pela grande e faminta raiz da árvore que dessa vez o engoliu, fora esmagado por ela lentamente com tal força que seus orgãos foram expelidos do interior do seu corpo rechonchudo e flácido. Agonizou sendo a apetitosa refeição da árvore que depois de matá-lo, vomitou seus ossos.
No outro dia, Roberval ligou desesperado para o Dr Lucas falando sem parar que o Sr Américo fora assassinado. O engenheiro comovido fora para o local onde tinham encontrado os restos mortais. A mídia anunciava como morte por vingança. Que fora um crime bárbaro e cruel. O delegado, investigador, perito vasculhavam a área tentando achar pistas e impressões digitais do assassino.
Lucas olhava aturdido para o movimento -nessa hora Roberval o abraçou e disse - Dr, eu sabia que ia acontecer isso.
-Como?
-Foi a árvore!
-Tá maluco? nunca diga isso a ninguém, vão querer te internar.
-Ele foi assassinado.
-Não foi não, Dr Lucas. A árvore o matou e vomitou os ossos dele como sempre fez com aqueles que quiseram derrubá-la.
-Que história horrível. Você assistiu a muitos filmes de terror e isso é uma lenda urbana.
-Como quiser Dr Lucas, mas eu já me vou.
O engenheiro passou pela árvore dita como assassina e olhou seriamente para ela, um arrepio percorreu sua espinha e resolveu sair dali. Lenda ou não, nunca mais queria pisar naquele lugar.
Chegou em casa, sua esposa o esperava para jantar.
Ela notou o seu rosto de preocupação e disse -Não se preocupe.
-Querida que crime bárbaro. Odiava aquele homem, mas o que fizeram foi cruel demais. Espero que prendam logo o assassino.
-Querido nunca vão encontrá-lo.
-Por que diz isso, Safira?
-Por que quem o matou, foi a árvore.
-Você também?
Nessa hora Dr Lucas olhou o parapeito da janela e o corvo estava ali olhando-o fixamente, levantou-se dirigiu-se até a janela e pode notar as duas córneas humanas trazidas pelo pássaro. Reconheceu os olhos de seu patrão; assustou-se, fitou os olhos do animal e viu a imponente árvore refletida na retina do corvo.