Em Busca do Braço Perdido parte 4

Em Busca do Braço Perdido parte 4

Jorge Linhaça

- Então abri vossos ouvidos e fechai os vossos olhos e prestem atenção no que virem e ouvirem...disse João.

Aquelas palavras ecoavam funestamente na mente dos presentes...se já havia apreensão no ar, esta agora transformara-se em puro pavor..."fechar os olhos e prestar atenção no que vissem" soava como mergulhar nas profundezas do inferno e encarar o demônio de frente.

- Há muitos anos atrás, precisamente setenta vezes sete anos, havia aqui uma grande fazenda cujo senhor era sanguinário e cruel para com seus escravos. a chibata comia solta ao menor deslize, os instrumentos de tortura não descansavam em dia algum.

Quando ninguém mais acreditava que o tal senhor pudesse sobrepujar os mais vis atos que houvera cometido um certo negro canhoto conseguiu apoderar-se da chibata nas mãos do capataz que castigava cruelmente uma negra no troco e empunhando-a atingiu , além do capataz e alguns capangas, o rosto do tal Senhor, deixando-lhe uma cicatriz que o acompanhou pelo resto de seus dias.

Enquanto João ia falando, as imagens iam invadindo a mente e os olhos dos ali reunidos.

Era como um filme a passar em uma tela em 3D.

- Dominado o escravo, apesar de sua grande força e habilidade, e depois de cruelmente espancado, o senhor mandou coloca-lo no pelourinho enquanto pensava num castigo à altura para aquele escravo prepotente. Havia de ser algo inédito, capaz de estampar para sempre o horror nos outros escravos tornando-os ainda mais submissos e obedientes.

-Depois de muito pensar, após cuidar da própria ferida, veio-lhe a súbita idéia de um castigo macabro e permanente.

-Mandou amarrar o escravo fortemente ao tronco, de forma que todo o seu corpo com exceção de seu braço esquerdo ficasse envolvido pelas cordas apertadas a ponto de tirar-lhe mesmo a respiração.

Reuniu todos os escravos à volta do instrumento de tortura, acorrentados uns aos outros pela garganta de modo a evitar alguma improvável rebelião.

- Um de seus capangas chegou trazendo um cavalo dos mais fortes que existiam na fazenda. Sob o olhar aterrorizado dos demais escravos e mesmo de alguns capangas, o braço do negro foi atado à cela do garanhão de modo que uma certa folga houvesse na corda que os separava e unia ao mesmo tempo...

Nesse instante as almas dos presentes à casa de Madame Sayonara já estavam congeladas, o suor lhes escorria nas faces crispadas pela angústia e pela antevisão do terror que se aproximava. Quando João dava uma pausa a imagem em suas mentes se congelava mas a imaginação percorria os mais intrincados labirintos da quase insanidade imaginando cada qual o passo seguinte da trama macabra.

- O fazendeiro de a ordem de enxotarem o cavalo, que , assustado com os tiros dados para o alto, saiu em disparada e, sem muito esforço, levou atrás de si o braço do pobre negro.

A cena foi tão dantesca que os presentes à reunião se viram gritando junto com os outros escravos da fazenda um grito de horror uníssono capaz de propagar-se até as profundezas do próprio inferno assustando o costa-oca.

A corrente que os unia a João foi quebrada e a sessão interrompida pois nenhum deles reunia condições de ver mais naquela noite.

Retornaram às suas casas quase que enlouquecidos e mal conseguiam comentar com os que lhes esperavam do lado de fora sobre a sua macabra experiência.

Madame Sayonara também havia esgotado suas energias e marcou para dias depois o retorno daqueles que tivessem coragem de ver o que viria depois daquilo.

continua...ou não...depende de sua atenção...que mais terá para dizer/mostrar o João?

Salvador, 17 de fevereiro de 2012