“A Vingança dos Escravos”.
De todos os afrodecendentes, Chicão, era o que mais sobressaía. Com quase dois metro de altura, e uma compleição física invejável, era admirado por todos. Aos homens inveja, as mulheres, cobiça. Mesmo sendo descendente direto de um rei Hatuzzi, era moreno claro. Era protegido pela patroa e as patroazinhas. Aprendeu a explorar o próximo, dificilmente trabalhava. Toda vez que devia fazer um serviço pesado, havia a intervenção da patroa, ou das patroazinhas, para fazer algum serviço interno (namorar). No começo com certo recato, depois aprendeu a explorar e vendia caro seus dotes para as sinhazinhas. Com a facilidade de comunicação acabou sendo o elo de ligação entre os escravos e os patrões. Aí aconteceu o obvio, o negro virou branco. Ao invés de interceder em favor da senzala, virou um crítico ferrenho. Dentro de brevíssimo tempo, virou capitão de mato, (caçador de escravos). Acho que moral Chicão nunca teve e piorava dia a dia. Parece que tinha ódio dos escravos. Toda vez que trazia um fugitivo, aplicava castigo exemplar, muitas vezes até matando o fugitivo barbaramente. Sua fama cresceu tanto que, só de ouvir seu nome já causava comoções nos escravos. As negras fugiam dele, até as brancas começaram evitá-lo. Aquele rapaz forte e bonito passou a ser forte e mau. Quando voltava de mais uma caçada, com um escravo sendo arrastado por seu cavalo. Entrou no pátio da casa grande feliz. O safado do fugitivo dera trabalho, mas pagou caro a ousadia. Foi nesta hora que percebeu, estava no lugar errado. Tudo ali estava diferente. O pátio parecia o mesmo, mas as casas pareciam mais velhas, tudo parecia abandonado. Desceu do cavalo e arrastou o fugitivo até o tronco no centro e prendeu-o com grilhões. De repente ouviu o canto guerreiro de vingança. Os negros cantavam quando iam atacar outra aldeia. Mas isto era na África, não existia mais. Foi quando uma lança vindo sei lá de onde cravou próximo de sua bota. Sacou das costas seu garruchão e preparou para o combate. Não era covarde, mas preocupava não saber quem o atacava. Logo em seguida uma seta zarabatana espetou o tronco ao seu lado. Tanto a lança ou a seta teriam dado cabo dele. Acho que queriam antes dar-lhe uma lição. Das inúmeras portas foram surgindo velhos, crianças, enfim todo tipo de gente. Detalhe, estavam mortos. Pessoas que de alguma forma fora ele o assassino. Atirou em um velho que caminhava à frente. O tiro pegou no peito e o velho caiu. Caiu e se levantou cantando. Era o cântico Vodu. De vingança. Largou a arma e tentou chegar ao portão. No portão apareceram mais pessoas, todos estropiados, sem braço, perna, com parte do corpo em decomposição. Alguém o agarrou pelas costas. Ao tentar tirar o braço do agressor, ele desprendeu-se do corpo, mas o homem continuava tentando agredi-lo. Chegavam mulheres crianças todo tipo de gente, mas gente morta ou mortos vivos. Ele foi despedaçado. Depois todos foram se afastando, só ficou ele preso nos grilhões do tronco onde prendeu tanta gente. Os patrões não conseguiram substituí-lo de imediato, mas com o tempo o povo se esquece e provavelmente teremos outro Chicão, até os escravos se vingarem novamente.
Você pode acabar com o criminoso, pois com o crime é impossível.
Oripê Machado.