Dias Inglórios - Cap.2 Dias Negros

14/08/2016

Mais um dia. Uma nova chance ou não, pensei amargurada. Estava novamente naquela sala mal iluminada, cercada de cadáveres, fria e sozinha. Doutor Roberto chegaria em uma ou duas horas. Tomara que fique doente por um mês, pensei para logo em seguida me sentir estúpida como uma criança. Estava concentrada em meu trabalho quando o meu carrasco apareceu na porta. Usava um jaleco grande demais para alguém tão magro, mais ninguém ousava avisá-lo. Os longos dedos finos apertavam uma velha prancheta cinza.

-Bom dia – Murmurei sem olhá-lo.

- Por Deus, Mulher. Porque esse mau humor tão cedo – Ele falou fingindo uma alegria que eu sabia não possuía. O meu carrasco tinha um senso de humor sombrio e cheio de ironia.

Não fiz questão de responder, apenas peguei minha prancheta em cima de uma mesa de metal e comecei a verificar os corpos. Aquilo não era minha função, pensei segurando as lagrimas que já começam a queimar meus olhos querendo sair. Aquilo realmente não era minha função. Meus amigos estavam andares acima prescrevendo receitas e tendo um dia realmente de um médico e ali estava eu, de castigo por ter deixado Doutor Roberto me pegar falando mal de uma cardiologista do Hospital. Hoje estava fazendo seis dias desde então.

- Então.. – O carrasco falou se recostando em uma das geladeiras cheias de cadáveres e dando uma leve olhada na prancheta - Manoela –Ele disse com a voz dura, me encarando nos olhos - Espero que esses dias aqui, sozinha nessa sala você tenha pensado que aqui nesse hospital. Não falamos de colegas, falamos de pacientes. Falamos de Receita, cirurgia, doenças, curas, tratamentos. Espero que você entenda isso.

Eu me endireitei e sustentei o olhar que ele me dava. Eu sabia que teríamos aquela conversa, engoli em seco.

- Me desculpe - Eu comecei a dizer séria – O que eu disse foi impróprio e desnecessário. Prometo que não vai se repetir, Doutor Roberto. Estarei focada a partir de agora, somente nas receitas, tratamentos e curas para os pacientes.

-Espero – Ele disse – Espero que seja realmente assim daqui por diante. Pode voltar para emergência. Ficarei de olho em você.

-Obrigada – Falei agradecida e me atrevi a dar um leve sorriso.

Fui em direção a pia e retirei luvas e objetos de higiene. Não teria que agüentar aquela sala escura, fria e fúnebre novamente. Havia passado tempo demais ali, sozinha. Apenas, eu e os corpos mortos. Quando me virei para encarar doutor Roberto novamente a porta foi aberta abruptamente.

- Hoje tá uma loucura – Um enfermeiro falou empurrando uma maca com um corpo coberto – Doutor - Ele cumprimentou, dando um leve aceno com a cabeça.

- Jorge – Doutor Roberto respondeu se aproximando e puxando o lençol que cobria o morto - Porque você está trazendo esse corpo para cá? Merda! – Ele falou com nojo, soltando o lençol e se afastando do corpo – O que aconteceu?

- Parece que esse gringo surtou, Doutor – Jorge falou se encostando perto da bancada onde estava e limpando o suor que escorria por sua testa.

Me Aproximei do corpo e dei uma olhada. O corpo estava coberto de sangue e a cabeça esmagada, o que havia restado, estava mergulhada em sangue e enormes pedaços de cérebro, sujeira e ao que me parecia areia.

- Segundos os socorristas que foram atender o chamado – Jorge Continuou a dizer – Esse sujeito aí tava caído na calçada quando chegaram. Eles verificaram duas vezes, segundo um deles disse. Estava pronto para trazer pro Hospital, quando o sujeito levantou e mordeu o braço de um deles. O jeito foi matar o rapaz, Doutor. Não teve jeito dele soltar, só quebrando a cabeça do sujeito mesmo.

- E o socorrista ferido? – Perguntei curiosa.

- Lá em cima na emergência, Doutora – Jorge respondeu se virando para pia e lavando as mãos.

Fiz menção de ir para porta, mas lembrei do doutor Roberto e dei uma olhada cautelosa para ele.

-Pode ir – Ele Disse com os olhos fixos no corpo do recém chegado.

Eu assenti com a cabeça e sair da sala. Subir as escadas correndo, finalmente, eu pensei enquanto subia. Quando finalmente conseguir chegar no andar da emergência estava ofegante e vermelha. Empurrei a porta e me deparei com o caos.

Kat Novasco
Enviado por Kat Novasco em 14/01/2012
Código do texto: T3440658
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