“O Corcel Negro”
Miquéias era um rapaz no mínimo estranho.
Filho de evangélicos, talvez por isto do nome. Mas era um homem do mundo. Sua vida era voltada para o prazer. Não vivia em más companhias, pois era um solitário. Morava sozinho, em um sítio. Gostava de beber, fumar, e dançar. Visitava religiosamente a zona de baixo meretrício da cidade. Em seu sítio comercializava cavalos que conhecia como poucos. Desde que seus pais morreram, morava só em companhia de um velho casal de empregados. Com a morte do velho, a velha foi para casa dos filhos que moravam na cidade e não mais voltou. Pelas suas andanças na compra e venda de animais, trouxe um pessoal estranho para trabalhar com ele. Eram negros altos e todos tinham os olhos vermelhos injetados de sangue pareciam zumbis. Trabalhavam dia e noite não se via nenhum descansando. Só conversavam entre eles em língua estranha. Havia apenas uma mulher negra muito bonita, mas tinha cara de brava. Logo após surgir este pessoal, Miquéias trouxe também um corcel negro. Era um cavalo enorme tipo bretão, muito peludo. A sela usada era preta, Miquéias também se trajava de preto, no escuro só se ouvia o trotar forte do cavalo, com seus cascos enormes batendo nas pedras. Também os olhos do cavalo pareciam brasas de fogo. Cultuavam uma religião estranha pagã e de longe se ouvia seus tambores e gritos estranhos. Miquéias parecia um rei do congo, e seu bando. Quando passava pela cidade a galope parecia que sofria, e não dominava o cavalo, várias vezes as rédeas iam soltas e ele parece que temia o poderoso garanhão. Atrás vinha o bando seminu, chefiado pela negra que montava tão bem como qualquer um. Poucas vezes cruzou seu olhar com alguém, mas afirmam parece ele pedia socorro. Isto não durou muito tempo. Um dia de tempestade o corcel negro, com Miquéias seguidos pelo bando mergulhou num formidável salto em profundo despenhadeiro. Encontraram seu corpo sem vida no meio das pedras la embaixo. Só não havia sinal do corcel negro e o estranho bando. Dizem que do inferno vieram e para lá voltaram. O sítio foi abandonado e ninguém nem vândalos roubavam de lá nem um prego. Parece que todos ainda estão por lá e Miquéias parece não ser o chefe, mas prisioneiro do bando e sofre eterna mutilação. Verdade ou Mentira! O sítio existe eu mesmo vi, mas confesso que faltou coragem para dar uma olhadinha sequer, pois de repente, poderia me encontrar com Miquéias, o corcel negro e o bando e... Credo!
Oripê Machado