ARANHA

Antes tivesse a bota de James, esfarelado aquele inseto terrível, antes do que antecedeu aquele fatídico erro, tivesse a morte visitado a vida desgraçada de James... E o levado para o além...

Era... Uma manhã, igual a tantas outras, e arrastando uma perna, por causa de uma doença degenerativa, James levantou de sua cama de solteiro, deixando esparramados na cama os trapos que usava para se proteger do frio inclemente do inverno, na pia do banheiro com uma grossa camada de sujeira, apoiou suas duas mãos, braços esticados... Franziu a testa, mordeu os lábios, viu o quanto aquele abandono o fez envelhecer...

A velha torneira de bronze rangiu e despejou um filete de água em suas mãos que devolveram para o rosto, molhando a sisuda face coberta de barba salpicada de pelos brancos, grisalha e cansada, como a própria vida...

E exatamente na saída do banheiro que ela passou em sua frente, indo alojar-se embaixo do surrado sofá, parou pensativo, já a conhecia, mas hoje teria que liquidá-la, afinal estava já bem perto de seu quarto, não era dia e nem hora para pensar duas vezes... Caminhou ergueu o sofá, e viu quando ela veio em direção a ele, era uma bela aranha, negra como a noite, aveludada, bem nutrida, rápida...

A meio metro de seu pé acelerou o passo, James ergueu a bota e esperou que ela passasse embaixo para a execução sumária, mas ela foi mais rápida e quando ele baixou a bota que executaria a inimiga ela passou, a perna esquerda escorregou no chão úmido, desgraçadamente caiu com o corpo esticado, e num chicote em seu pescoço a paralisia desceu mansamente através dos membros, e tronco, demorando-se no quadril para depois enveredar para os membros inferiores abaixo, imobilizando as entranhas num silencio absoluto...

Deitado no chão movia tão só o pescoço, e girando viu a 15 cm dos olhos, ela, e cada vez mais perto, até sentir os seus longos pelos negros esfregar-lhe o nariz... Subiu em seu rosto como a reconhecer o terreno, ou subjugar o inimigo quase batido... Passou o pesado abdômen nos lábios de James, um leve gemido o fez esbugalhar os olhos, lia nos olhos negros da tarântula venenosa o antigo ódio a lhe metalizar a Iris, ia e voltava o olhar para James como a definir por onde começar a inoculação predatória...

James viu que o vulto negro desapareceu, e depois com algum esforço conseguiu olhar seu pé descalço, com a aranha em cima dele fazendo malabarismo ao inocular o veneno...

Depois de instantes viu os longos pelos penetrarem embaixo de sua camisa e com os mesmos gestos, inoculou veneno no abdômen de James... A inimiga matava seu opositor aos poucos e mesmo não sentindo a dor emanada das picadas, James sabia que depois delas a sua pele estaria roxa, negra, e horas depois necrosadas, a morte seria lenta e por causa da paralisia, indolor...

E assim perdido em seus pensamentos novamente sentiu arrastar-se em seu rosto a morte... Era o combate final, a derradeira batalha onde os soldados lutam sobre escombros e a dor não existe mais, porque quem quer que sejam os inimigos suas vidas, seus espíritos já pertencem ao infinito...

Pela ultima vez, James baixou o olhar em direção ao seu queixo, viu e sentiu a inoculação de veneno, logo abaixo da boca, depois na face esquerda, direita, a aranha subiu até sua testa , e como num brado de vitória umedeceu o lugar onde descarregou grande quantidade de veneno...Depois lentamente desceu como inebriada pelo êxtase da vitória, caminhou sobre os olhos, o nariz e finalmente com o corpo inteiro na boca de James, que lentamente a recolheu e a destroçou com duas ou três mastigadas...

Malgaxe
Enviado por Malgaxe em 06/01/2012
Código do texto: T3426677
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