Pesadelo da Luz - I
Parte I - Bem vindo ao limbo
"Estrada bloqueada" lia-se na placa desgastada à frente. E agora ter que dar a volta. O retorno ficava a quilometros dali e qualquer um desrespeitaria as regras e seguiria em frente (Não só uma garota de 18 anos como ela). Talvez, mas não era o caso. Não era necessário nenhuma placa para avisar o bloqueio da estrada. Não havia um final para a pista. Que diabos teria acontecido ali? Tão deserto. O que explicava a estrada ter sido literalmente destruída? Quantas coisas coisas podem acontecer no topo de uma colina que arranque a pista do caminho? Aqueles destroços não são simples árvores bloqueando a estrada. É uma cratera que leva unicamente ao abismo. Não há pessoas, não há veículos acidentados, não há respostas. Vinha a quilometros por hora, o conversível amarelo. O carro derrapou bruscamente inclinado. As rodas dianteiras rolando furiosas colina abaixo. O barulho do freio quebrava o maldito silêncio. A porta se abriu com um estalo e ela pulou fora, no mesmo instante em que o chão se despedaçou levando as rodas, o motor,o celular e todo o resto para o fundo do abismo. Amanda suava frio. O coração a mil por hora. Abaixou-se e tentou ver o destino do automóvel. Nada além de neblina. Nem mesmo o som de uma explosão. Então ela se levantou, olhando em volta. "Alguém?" Deu três passos cambaleando a frente. A visão embaçada enxergava pouco mais de meio metro a frente. "Alguém?" A voz enfraquecida. E logo caiu desmaiada.
Agora o ruído do vento uivava em seus ouvidos. Ela abriu os olhos lentamente. O corpo sujo de cinzas. Tossiu e sentiu o ar seco, dominado por fumaça. Tudo estava envolto a uma neblina modorrenta. "Tem alguém aí?" o eco da voz retornava fantasmagórico. Amanda levantou, um pouco tonta, caminhou sem rumo de volta à estrada. Estava perdida. Perdida e sozinha naquela colina. A idéia de que nunca a encontrariam ali começou a perturbá-la. Ela correu depressa. Nada era visível agora. Olhava para os lados e apenas uma cortina cinza esbranquiçada. Correu ofegante, enquanto gritava por todas as direções. "Alguém aí?" O tempo passou e o desespero crescia. Fazia mais d euma hora que corria de volta, e até agora não encontrava nada além da névoa de cinzas. Foi então que bateu em algo. Um barulho metálico. E perceeu ser um enorme portão. Apesar da neblina podia ler claramente: "Bem vindos à Silent Hill" gravado no velho portão enferrujado. Estava trancado. As grades do arame impediam a passagem dela. Mas não por muito tempo.
Amanda tossia incessantemente, as cinzas caindo sobre seus longos cabelos ruivos. A pele tão branca a confundia com o cenário. Ela segurou-se firme nas grades e pôs-se a escalar. Nunca havia escalado uma grade antes. Subiu meio desajeitada, as mãos cortando no ferro enferrujado. Passou para o outro lado e pulou; caiu no chão coberto de fuligem, e logo se levantou limpando o sobretudo azul marinho. No chão, duas manchas de sangue. Suas mãos molhadas. Ela seguiu a estrada a diante e chegou a uma enorme avenida. Casas, prédios e lojas por toda parte. Nenhuma pessoa. "Graças a Deus." ela correu até o a delegacia na esquina. Na calçada ela pode ver que estava fechada. Assim como as outras lojas. Não havia nada aberto ali. O lugar tinha um aspecto de abandonado como ela nunca viu antes. "Alguém?" - ela gritou - e o retorno do eco congelou sua espinha. Ouvia sons estranhos, como coiotes uivando de longe. Começou a ficar assustada. Olhou para o final da avenida. Nada viu, além de névoa. Precisava de um telefone. Puxou a maçaneta com força, mas em vão. A porta estava trancada. Ela deu uma última olhada ao redor e então fez a volta até a vidraça ao lado, coberta pelas cinzas. Catou uma das madeiras apodrecidas que barravam as janelas e tacou no vidro. O silêncio foi quebrado pelos estilhaços caindo no chão em mil pedaços. Amanda se assustou, olhou para trás. Ninguém. Então subiu com cuidado na vidraça quebrada e pulou para dentro. O silêncio era incrivelmente mais modorrento. Não havia sequer o barulho do vento ali. Ela examinou a mesa e o balcão. Nada além de chaves e uma papelada parcialmente queimada. Entrou no outro cômodo. Parecia ter sofrido um incêndio tudo aquilo. Não havia nada. Ela tossiu e voltou à avenida deserta. Onde estavam as pessoas daquele lugar? Ela não mais gritou. Agora tinha medo. E pelo contrário, tentava fazer silêncio ao caminhar pela calçada, olhando as lojas destruídas. Os olhos apertados tentando encontrar alguma coisa que pudesse ajudá-la. Deu a volta pela avenida e entrou na rua à esquerda. Esquerda, direita e depois esquerda novamente. Estava perdida. "Que lugar é esse?"
Ela correu até o prédio mais próximo. Abriu a porta, estava aberta. "Olá!" Chamava enquanto adentrava o hall. Algo chamou sua atenção na parede. Um enorme quadro. Uma pintura antiga e queimada, onde podia-se ler: "O medo do sangue tende a criar o medo da carne." O interruptor logo abaixo. Ela apertou, mas nada. Com certeza não haveria de ter luz elétrica naquela cidade. Ela olhou o relógio, seis e meia da tarde. A pouca claridade despedia-se lá fora. Tinha de agir rápido. Havia uma grande escadaria apodrecida e em cinzas no centro. Não tinha escolha. Não sabia o que fazer. Subiu lentamente os degraus segurando-se no corrimão sujo. Foi quando seu coração disparou. O barulho de uma sirene de incêndio foi ativado em algum lugar lá fora. Era insuportável a altura do som. Ela tampou os ouvidos desesperada. E não parava. Como uma ambulância, insistia em tocar. Amanda deixou escapar um grito desesperado. Havia alguém ali, não estava sozinha. Subiu as escadas correndo, o barulho dos passos abafados pela sirene. Mas antes que pusesse os pés no piso superior, aconteceu. O local tornou-se escuro de repente. Tudo havia enegrecido. Nada mais ela enxergava. A luz foi engolida pela noite. Não era estranho, nada mais era estranho naquele lugar. As mãos de Amanda tateando a frente, em busca do corrimão. O barulho alto enfim parou. Agora tudo estava escuro. E um pequeno barulho surgiu lá em baixo. A porta se abrindo. Amanda se assustou e tropeçou no degrau, rolando escada abaixo. O estrondo quase tão alto quanto o alarme. Sentiu um calafrio sinistro. Tinha certeza. Fosse o que fosse não poderia gritar porque não estava sozinha...
(Fim da Parte I)