Destino Final

Destino Final

Nota do autor:

Este texto, por incrível que pareça, eu encontrei em um dos vários CDs que eu possuo em meu quarto. E o mais engraçado, é que enquanto o lia, não me lembrava direito de tê-lo escrito.

Por fim, após forçar a memórias diversas vezes, me recordei de que, este é um dos primeiros contos que me aventurei a escrever, isto quando eu tinha apenas 12 ou 13 anos de idade.

Preciso reforça-lhes, de que este texto está sendo publicado aqui em sua totalidade e da forma que o encontrei, sem absolutamente nenhum tipo de correção. Portanto, já peço, de antemão, as minhas mais sinceras desculpas por qualquer eventual erro tanto gramatical, quanto ortográfico ou até mesmo narrativo.

Aproveitem

E boa leitura

Desde de pequeno eu aprendi que um homem de verdade conserva suas amizades verdadeiras e destrói as falsas, e era isso que eu fiz. Meus únicos amigos, Hugh e Cassey sempre estiveram ao meu lado, éramos amigos desde o jardim quando eu me mudei para cá, e desde então nunca mais nos separamos uma vez por semana todos ia possar na casa de alguém, sabe, para fazer coisas que todo garoto normal fazia, comer pizza, falar de garotas afinal tínhamos 15 anos e os hormônios estavam a flor da pele, hoje em especial era o dia da minha casa.

- Qual você acham mais bonita?- perguntou Hugh com a boca suja de molho de tomate - a Penélope ou a Wendy?

Um coro quase que ensurdecedor falou o nome de Wendy, ela era sem duvida nenhuma a garota mais bonita da escola, tinha cabelos loiros e olhos azuis, uma bundinha de dar inveja a qualquer inveja atriz de Hollywood e um sorriso de matar.

Hugh que era um pouco, digamos, obeso ou se preferirem acima do peso normal contorceu o rosto em uma careta de nojo, ele nunca gostara de Wendy, para falar a verdade era gamado em Penélope que por motivos que Cassey e eu desconhecíamos era meio... Gamada nele também.

- Ta legal - disse Cassey passando a mão nos seus longos e loiros cabelos e ajeitando os óculos no nariz - vamos mudar de assunto... Quem assistiu Arquivo X ontem à noite?

- Eu assisti - disse eu alegre, tentando relembrar em qual aventura o Agente Fox Molder e a Agente Dana Scully se meteram na noite passada - foi divertido... Adorei a parte que eles entraram no milharam e depois as abelhas...

- Isso, aquilo foi o bicho - disse Hugh.

- Garotos - disse minha mãe abrindo a porta de meu quarto - acho que já está na hora não é?

- A mamãe, não podemos dormir mais tarde.

Ela fez uma careta e depois disse alegre:

- Tudo bem, mas não façam barulho, seu pai está tentando dormir, certo?

"Certo!" Respondemos alegres.

- Sabe o que eu queria agora?- disse Cassey quando minha mãe fechou a porta de novo - ver um fantasma vindo pelo corredor com suas correntes... Buuuuu.

- Pare com isso Cass - disse Hugh amedrontado.

- A Meu Deus, como vocês são bobos - eu disse - fantasmas não existem!

Era o que eu pensava, era o que eu acreditava e era nisso que eu acreditaria durante toda a minha vida, bom, pelo menos até aquele dia.

- Hei, garotos - gritou minha mãe do portão de casa, estávamos brincado na rua e logo corremos até ela – será que vocês poderiam ir comprar pão e leite para mim?

- Claro!- respondemos em coro.

- Obrigada – disse ela sorrindo e entregando o dinheiro para mim – tragam um pacote e uns dez pães, certo?

- Claro mamãe - eu disse.

- A propósito - disse ela quando saiamos - terça que vem será o dia de quem?

- Minha senhora Mcnillan- respondeu Cassey - vai ser na minha casa!

Demos um berro de alegria, quando chegava o dia de ira até a casa de Cassey eu e Hugh adorávamos, a mãe dele era, digamos, mais liberal, lá podíamos folhear revistas pornográficas como quem folheia jornal e assistir a filmes de terror até altas horas da noite, e a mãe de Cassey nem ao menos reclamava. Infelizmente ele gostava mais de ir a minha casa, sempre achei que ele não gostava daquela liberdade toda, ele sempre gostou de ficar preso a regras e isso eu jamais irei entender.

Quando enfim chegamos à panificadora, que ficava a quase dez quadras da minha casa o sol já estava quase se pondo, e uma fila enorme dava voltas na entrada.

- Com licença?- eu disse cutucando um homem que se encontrava no final da fila, ele tinha cabelos grisalhos e um olhar sério -para que é esta fila?

-...Comprar pão -disse ele meio carrancudo e se virou.

- E agora?- perguntou Hugh amedrontado -vai demorar demais.

- Vamos ter que esperar -disse Cassey.

- "Vamos" não - eu disse para eles entrando na fila de espera -se vocês quiserem podem ir para casa, já está tarde e vai ficar mais ainda, depois eu volto sozinho.

- Claro que não- disse Hugh- eu vou ficar aqui com você.

- Eu também -disse Cassey batendo nas minhas costas de leve - afinal, minha mãe foi em uma reunião e vai voltar bem tarde.

- É e meus pais disseram que ia passar na sua casa por volta das dez da noite para me buscar -disse Hugh olhando a fila.

- Ótimo!- exclamei alegre.

Quando chegou nossa vez já haviam passado quase duas horas, a lua estava cheia e alta lá fora e um vento de cortar estava uivando.

- O que vão querer?- perguntou a moça do balcão a sorridente.

- Um pacote de leite e quinze pães, por favor.

- Um minuto -disse ela desaparecendo pela porta aos fundos.

- Alan, hei, Alan - disse Hugh - você está vendo que horas são?

- Não, porque?

- Já passam das oito horas! - exclamou Cassey horrorizado.

- Meu Deus - eu disse olhando em volta, a panificadora estava vazia.

- Aqui está -disse a mulher do balcão me forçando a voltar a realidade -são 3 Reais.

Entreguei o dinheiro a ela e saímos de lá quase que correndo. As ruas estavam desertas, era assim que elas ficavam em pleno outono em Curitiba, depois das oito horas da noite quase ninguém saia de casa e principalmente em uma quarta-feira dia em que todos estavam cansados de seus trabalhos e queriam que o fim de semana chegasse logo para poderem descansar.

Fomos caminhando vagarosamente pela rua Antonio de Paula e quando chegamos na rápida que a cruzava atravessamos e chegamos ao um longo campo de futebol que por vezes era cheio de crianças de nossa idade mas agora estava vazio e escuro, atrás dele havia uma grande e sombria floresta e na próxima rua ninguém se arriscava a entrar, era uma rua quase que assombrada que atravessava a floresta fechada, era de terra e não tinha casas, pessoas morreram ali por varias vezes e ninguém se arriscava a passar por lá. Um Homem, o único que vimos vinha andando em nossa direção quando passamos o campo.

- Hei, moço- chamou Cassey- que horas são?

Ele nos olhos assustado, pelo jeito estava amedrontado com a idéia de passar perto daquela rua.

- Oh, sim, são 21:30- disse ele consultando o relógio e voltando a caminhar.

- Meu Deus do céu!- gritou Hugh - minha mãe vai me matar.

- Eu sei disso, a minha também - disse eu tentando manter a voz calma.

- Só tem um jeito gente - disse Cassey calmo.

- Qual?- perguntamos assombrados.

- Vamos ter que atravessar a Rua - disse ele ainda calmo. O banque que levamos quase nos fez gritar de pavor.

O que Cassey propunha me fez tremer dos pés a cabeça, jamais faria aquilo, apesar de achar que fantasmas não existiam eu ainda tinha medo de passar por lá.

- Corta essa - disse Hugh quase branco de pavor.

- Eu acho que devíamos sim - disse Cassey se sobrepondo.

- E porque ?- perguntei.

- Vejam caras, essa rua quase cruza a cidade, e desse jeito poderíamos evitar passar por varias ruas, contornando dez quadras, e em quase meia hora estaríamos em casa, talvez menos.

- Não sei não - disse Hugh

Eu pensei melhor e cheguei a conclusão de que Cassey estava certo, iríamos ser poupados de uma boa bronca, sem falar que do jeito que os pais de Hugo eram ele com certeza jamais voltaria a dormir em nossas casas. Ainda me lembro do sufoco que foi, convence-los a deixar o filho dormir em minha casa.

- Olhem lá - disse Hugo baixinho apontando para o norte da rua, de onde tínhamos vindo.

Descendo a rua, rindo feito cães assassinos vinha uma gangue de ladrões, tinha ouvido falar dela, eles eram os piores ladrões que alguém já tinha visto na face da Terra, um deles, o mais alto que usava um colete de couro, possivelmente roubado , apontou para nós e todos riram e começaram a caminhar mais rápido.

- Eles vão nos roubar - gemeu Hugh.

- Não seja idiota - falou Cassey rispidamente - não temos nada para ser roubado.

- Para falar a verdade - eu disse amedrontado- tem uma só coisa... Nossas vidas.

- Vamos entrar pela rua - disse Cassey com energia - rápido, antes que eles nos peguem.

Todos nós concordamos e começamos a correr até a ruazinha que adentrava silenciosamente por entre o mato e as arvores, virei-me e vi que todos da gangue começaram a correr atrás de nós, com certeza não queriam nos perder, talvez fossemos sua única diversão naquela noite prequiçossa.

Entramos pela rua, nossos pés fazendo um estranho barulho ao se encontrar com o terreno pedregoso da rua.

- Vamos continuar, turma - disse Cassey correndo - eles vão entrar atrás de nós, com certeza.

- Não- disse Hugh - vamos esperar eles irem e depois voltamos.

- Você ficou burro – falei - se não entrarem vão ficar no campo nos esperando ou quebrando as grades, e se continuarmos em frente logo estaremos em casa.

- Isso mesmo - disse Cassey sorrindo.

Corremos até ficarmos cansados, nossos pés pareciam estar nos matando. Olhei em volta quando paramos para descansar, a floresta tinha ficado mais fechada e o único som era o farfalhar das folhas ao serem tocadas pelo vento, tudo estava muito escuro, mas havia alguns postes em poucos pontos da rua, estes eram de troncos e mantinham uma única lâmpada que pouco iluminava.

- Vamos caminhar agora - disse Hugh.

Começamos a caminhar pela estrada, de quando em quando eu me virava para olhar em volta, com medo de que algo pulasse de dentro da mata e nos atacasse.

Não demorou muito para que víssemos dois faróis vindo do longe.

- Vejam... Graças a Deus - disse Cassey - agora é só pedirmos carona!

O carro se aproximou e ficamos mais alegres ainda, era uma viatura da policia, mas era diferente, era um modelo mais antigo do que as viaturas que rondavam pelo nosso bairro ultimamente, era um modelo de carro que eu sinceramente desconhecia, pois todas as viaturas do bairro eram da Volkswagen, gol´s ou outros tipos de carro.

" One, two , tree, four " a musica chegou aos nossos ouvidos, reconheci-a no mesmo instante, era " All Together Now" dos Beatles , tocava alta e estridente. O carro parou bem em nossa frente, e um policial saiu de dentro, tinha bigodes grande e loiros e usava óculos escuros.

- O que vocês fazem aqui?

- Bom... Senhor - falei, sempre fui o que tinha mais jeito com as palavras - estávamos fugindo de uma gangue que queria nos pegar e entramos aqui, sabe, para fugirmos deles, e também porque esse era um ótimo caminho para nossas casas.

- Ótimo - repetiu ele devagar, olhou para baixo, talvez pensando, depois levantou a cabeça - podem vir conosco, levamos vocês para casa.

Sorrimos uns para os outros e entramos no carro, dentro da viatura havia mais um homem, mais baixo e de nariz pontudo, sorriu para nós, nos sentamos no banco de traz e o policial entrou.

- Bruce - disse ele para o outro - esse garotos ai precisam de uma carona para casa.

- Certo - disse Bruce - para que lado fica?

Eu apontei a direção e ele deu a volta com o carro e seguiu a rua, os pneus triturando as pedras abaixo de nós.A musica continuou e tocar.

Passados mais ou menos uns trinta minutos Cassey me cutucou nas costelas.

- Alan - disse ele assustado- veja só o que eu encontrei aqui atrás.

Eu olhei para sua mão, ali estava uma carteira de identidade, só podia pertencer a Bruce, me aproximei mais e li:

ASTOR BRUCE MCaURTHY

NASCIDO EM: 21 DE JANEIRO DE 1924

Meus olhos pousaram na linha que mostrava sua data de nascimento.

- Isso não é possível- disse Cassey - ele deve ter agora uns 76 anos.

Virei-me novamente, o medo tomando conta de meu corpo.

- Hei, senhor - eu disse e os dois se viraram - posso perguntar suas idades?

- Para que quer saber garoto?- perguntou Bruce.

- Achei vocês muito jovens para serem policiais - menti rapidamente.

- Bom, eu tenho 44 - disse Bruce, meu olhos arregalaram – não sou tão velho assim, filho.

- Eu tenho 28 - disse o de bigode – não é o que podemos dizer de “jovialidade” – deu um leve soco em Bruce e os dois caíram na gargalhada.

- Meu Deus - Cassey exclamou.

- O que?- perguntou Bruce para Cassey.

- N-nada- disse ele gaguejando- vi uma coruja e odeio corujas.

Calculei mentalmente e percebi que isso não era possivel realmente.

Do outro lado na janela direita, Hugh parecia estar congelado, olhava compenetrado Bruce dirigir.

- O que houve Hugh?- perguntei me debruçando sobre Cassey.

- Veja... Veja as mãos dele - disse baixinho apontando para Bruce.

Quando olhei tive vontade de gritar, as mãos dele estavam todas ensangüentadas, e sua mão direita estava sem três dedos.

- Hum... Sr. Bruce - chamei e ele se virou - o senhor viu o que aconteceu com suas mãos, estão cortadas ou algo parecido.

Ele se virou e olhou carinhosamente para mim.

- ah, não adianta garoto - ele disse dando uma olhada nas mãos - jamais iram sarar, faz 32 anos que tenho isso, e jamais vai sarar.

Olhei assustado para Hugh e Cassey que pareciam petrificados.

O outro policial se virou depois que Bruce voltou ao volante e olhou-me com um sorriso desanimado.

- Sabe garoto, também tenho um desses machucados que jamais iram cicatrizar - quando ele terminou meus olhos revistaram-no por inteiro e quando achei que ele estava apenas brincando reparei em sua barriga, ali havia um profundo rasgo no uniforme e podia-se ver um grande rasgo de carne na barriga, ali o sangue ainda parecia "fresco", como se ele tivesse levando um tiro ou algo parecido e este tivesse lhe atravessado.Olhei para Cassey e Hugh e estes pareciam ter visto o mesmo que eu, Hugh parecia sufocar um grito e Cassey olhava para baixo com profundo desagrado.

- Precisamos fazer algo - disse Cassey de repente para mim - estes dois, estão... Estão... Mortos!

- Também acho isso.

- Já sei o que fazer - eu disse quando me ocorreu uma idéia.

Cochichei meu plano no ouvido de Cassey e este passou o mesmo para Hugh que sorriu e chamou o policial de bigode.

- Senhor, queria fazer xixi - disse Hugh apertando o "pipi".

- Tudo bem garoto - disse ele dando um tapinha no ombro de Bruce que encostou o carro.

- Eu também quero - disse Cassey.

- E eu também - eu disse quando Hugh abria a porta.

Saímos os três do carro, caminhamos com medo até o mato da beira da estrada, neste ponto a noite engolia a floresta ao fundo e a lua brilhava no alto do céu, fomos até um poste que se encontrava a nossa frente e ali fingimos fazer xixi.

- E agora?- perguntou Cassey.

- Quando eu falar... Corram para a floresta - falei fingindo abrir as calças.

- Você está louco?- perguntou Hugh olhando para mim assustado.

- É o único jeito!

Escutei o barulho da porta da viatura se abrindo, devíamos estar demorando demais e de certo os dois "policiais mortos" estava vindo até nós, era agora, só podia ser, tinha de ser.

- AGORA!- gritei e corremos em disparada, entrando na floresta.

Abrindo caminho por entre o mato que crescia e desviando das arvores entramos cada vez mais na floresta que parecia estar no ajudando.

- hei... que merda vocês pensam que estão fazendo?- escutei Bruce gritar.

- corram!- gritava Cassey- corram.... como se suas vidas dependessem disso!

- Cass...- gritei em resposta- acho que nossas vidas dependem disso de verdade!

Corremos por quase dez minutos e depois paramos em uma clareira, a luz da lua iluminava quase tudo ali, desde um tronco caído no centro e alguns pedaços de madeira caídos ali.

- e agora?- perguntou Hugh ofegante.

- vamos voltar- eu disse respirando forte- mas por um outro caminho.

- acho melhor caminharmos pela floresta e depois tentar encontrar a estrada de novo.

- putz! o que será que eles eram?- perguntou Hugh enquanto caminhávamos pela floresta escura, alguns galhos batiam em nossos rosto e logo meu rosto tinha vários cortes e arranhões, olhei para os dois e estes também tinham cortes e arranhões nos rostos.

- acho que estavam mortos- disse Cassey afastando um galho estrondoso e nos deixando passar.

- para onde eles iriam nos levar de verdade?- perguntou de novo Hugh, e isto estava começando a me encher , para falar a verdade eu não queria mais falar sobre o ocorrido, e estava tentando esquecer.

- acho que para o inferno!- falei cuspindo as palavras, Hugh se calou instantaneamente e só falou de novo quando chegamos a mais uma clareira.

- o que são aquelas pedras lá no final?- perguntou novamente Hugh e dessa vez não fiquei com vontade de arrancar as viceras dele.

Olhamos e logo vimos um amontoado de pedras e lapides na clareira.

- é um cemitério- disse Cassey correndo até a clareira.

- que droga!- resmungou Hugh- detesto cemitérios!

Algumas das poucas lápides estavam quebradas e particularmente duas delas nós chamaram a atenção, eram maiores do que as outras e pareciam mais novas, Cassey caminhou lentamente até elas enquanto eu ficava com Hugh que agora começava a espremer meu braço.

- pessoal- chamou ele - acho melhor você virem aqui.

Corremos até ele, Hugh enfim lagou meu braço. Ele estava apontando para as lápides uma expressão de tomava conta de seu rosto.

- leiam ali.

Nos aproximamos da primeira lápide , a da esqueda e lemos em voz alta:

Suas memórias reinaram para sempre em nossos corações ..

Astor Bruce MCaURTHY

# 21 de Janeiro de 1924 + 15 de Julho de 1968

Jhonathan Ligter

# 5 de Março de 1940 + 15 de Julho de 1968

- Meu Deus- murmurou Hugh baixinho.

Meus ossos pareciam ter congelado, minha boca ficou seca e senti que iria desmaiar, hoje era o dia 14 de julho e amanhã faria 32 anos que aquele homens haviam morrido, nós, eu, Hugh e Cassey tinhamos pega carona com homens mortos há mais de trinta anos!

- Acho melhor voltarmos a caminhar- disse Cassey olhando em volta- já deve ser tarde e a essa hopra todos devem estar a nossa procura.

- é..- falei assustado- inclusive aqueles dois fantasmas.

Me arrepiei ao escutar aquele nome vir de minha boca, "fantasmas" isso me assustava , por mais que eu não acreditasse isso ainda me assustava.

Caminhamos mais ainda por entre as árvores velha e seus troncos malcheirosos , a cada passo que dávamos o terreno ficava cada vez mais úmido.

- agora acho que podemos voltar para a estrada, não é?- perguntei para Cassey, ele me olhou e deu um breve sorriso.

- é , também acho isso, vamos por aqui.

Caminhamos por entre varias plantas estranhas e quando finalmente encontramos a estrada ela estava totalmente deserta, sem nenhum sinal de carro ou de Bruce e seu companheiro.

- e agora ?- perguntou Hugh assustado.

- teremos que ir para casa- falei- depois acho que vou tentar esquecer tudo o que aconteceu aqui.

- ciranda, cirandinha , vamos todos cirandar....

Eram vozes de crianças, e pela altura do canto não deviam estar longe.

- o que é agora hein?- perguntou Hugh bravo- esse lugar é mal-assombrado

De repente , uma luz apareceu sobre nossas costas, como faróis , estávamos preparados para correr caso fosse a viatura de policia atrás de nos novamente.

Por sorte não era, um ônibus escolar apareceu bem atrás de nos, escutei o barulho dos pneus frearem, em sua lataria estava escrito : COLÉGIO ESTADUAL ROCKWOSS

A porta de entrada se abriu:

- hei garotos- chamou uma voz de homem.

Com medo eu fui até lá, um homem, que aparentava não ter mais do que 40 anos estava sentando ao volante usava um boné com escrições que eu não podia ver.

- o que vocês fazem aqui há uma hora destas?- perguntou ele, sua voz parecia como o ronronar de um gato.

- nós... nós- começou Cassey que vinha se juntar a mim- estávamos apenas indo para casa.

- para casa é?- repetiu o velho com desconfiança- querem uma carona.

Lembrando do que ocorrera quando aceitamos uma carona de quem passava naquela estrada eu rapidamente falei.

- não... muito obrigado.

O velho chegou mais perto, onde a luz era mais forte e podíamos ver melhor seu cansado rosto.

- então tudo bem- disse ele tirando o chapéu em um gesto de cumprimento.

Pude enfim ver o que estava escrito em seu boné, isso deixou os pelos da minha nuca totalmente arrepiados, olhei para Cassey e ele também parecia sentir o mesmo:

Suas memórias reinaram para sempre em nossos corações...

ASTOR E JHONATHAN

A porta do ônibus se fechou e o ronco do motor ficou mais alto,o ônibus partiu lançando poeira em nossos rostos. Quando a poeira baixou vimos o vulto de Hugh aparecer e desaparecer na floresta.

- Ah Deus- disse Cassey alarmado- aquele imbecil está entrando na floresta!

- HUGH!- gritamos ao entrar na floresta a sua procura, este lado dela era mais denso e escuro e havia mais nevoa do que de costume.

As arvores ali pareciam nos observar , seus galhos eram altos e nodosos e os troncos pareciam podres.

- e agora?- murmurei enquanto Cassey e eu olhávamos em volta- ele deve ter se perdido, vamos fazer o que?

Cassey colocou a mão na cabeça e a esfregou.

- me deixe pensar.... me deixe pensar- ele repetia freneticamente- vamos nos separar.

- não- falei com meu coração quase saindo pela garganta- assim vamos nos perder de novo.

- e então vamos fazer o q....

Cassey mal pode terminar sua frase, escutamos um barulho vindo das arvorés a nossa direita.

- Hugh!

- ciranda , cirandinha, vamos todos cirandar.....

Enquanto Cassey ficava na retaguarda em me aproximei mais e mais da moita que se mexia enquanto cantava, preparados para correr ao menor sinal de perigo chegamos perto da moita.

Com um forte puxão afastei a moita para longe arrancando-a, sentada atrás dela estava uma garotinha que aparentava ter menos de sete anos, usando uma longa camisola, seus cabelos eram longos e negros e seus olhos estavam estranhos, girando fora das órbitas.

- vejam eu tenho um neném! - disse ela levantando uma boneca de pano para nós como se quisesse nos mostrá-la, suas mãos estava ressecadas e quase que podres.

- corra Alan- disse Cassey ao meu ouvido.

Sem pensar em nada corremos o maximo que pudemos, vários galhos batiam em nossos rostos, o que fazia os cortes que havíamos feito antes se aprofundarem e sangrarem cada vez mais.

Chegamos a uma grande arvore onde , sentada em um tronco estava uma bela mulher trajando um longo vestido, os cabelos loiros lhe caiam por sobre os ombros. Por de trás dela Hugh saiu, olhando em volta como bobo.

- Hugh- chamei apavorado- saia dai!

Eles nos olhou assustado.

- hei garotos- disse ele se sentando no colo da mulher- vejam- disse apontando para ela que sorria para nos- ela é minha nova amiga, Ivy .

- sai logo!- gritou Cassey- ela vai te matar.

A mulher olhou para Cassey como se o estudasse, depois se curvou para Hugh e lhe falou algo no ouvido, ele se levantou e abaixou-se para pegar algo que não podíamos ver.

- vocês estão fazendo do pior jeito garotos- disse Hugh se aproximando, quando passou por uma clareira pudemos enfim ver o que ele trazia levantando nas mãos , uma faca!

- o que você vai fazer? - perguntei assustado com a expressão no rosto de Hugh.

- o que eu devia ter feito a muito tempo atrás- disse Hugh começando a correr até nos.

- CORRA ALAN!- gritou Cassey se abaixando, Hugh chegou perto dele e ergueu a faca no ar, um som oco de madeira ecoou pela floresta, em um segundo Hugh estava estirando no chão, Cassey havia dado um jeito nele.

- vamos logo- eu disse agarrando Cass pelo braço- ele vai acordar logo,logo.

Eu a frente indicando o caminho e Cassey atrás correndo feito doido, depois de minutos correndo pela floresta escura , tropecei em algo no chão e cai, Cassey que vinha atrás bateu os pés em mim e tombou no chão com um banque surdo.

- o que houve?- gemeu ele.

- bati em alguma coisa- falei levantando.

- o que deve ser- nos abaixamos e olhamos melhor, era um corpo.

Usava calças jeans e uma camisa xadrez vermelha, era Hugh.

- como isso pode acontecer?

- eu não sei, acho que talvez estávamos correndo em círculos.

- e agora? o que vamos fazer?

- talvez nos podíamos voltar para a estrada, pelo menos por ali podemos andar em linha reta e chegar a algum lugar.

Quando nossos pés pisaram novamente na estrada esta estava tão fia como antes, um vento gélido tocava nossos rostos, a lua estava alta no céu e iluminava mais ainda do que antes.

- já deve ser tarde- disse Cassey.

De repente uma pontada de dor e remorso bateu em meu coração, o que iríamos fazer com Hugh.

- Cass, e quanto ao Hugh?

- acho que ele já deve estar morto -disse ele sombriamente , olhando para a lua.

- você está louco?

- não, você é quem está.

- olha , eu não vou ficar aqui discutindo com você- me virei e recomecei a entrar na floresta, ele me segurou pelo ombro e me virou- se você quiser ir, vai ir sozinho.

- ótimo

- pois bem, se você morrer lembre-se de que eu lhe avisei.

- eu não vou fazer o que você quer, não vou deixar meu amigo sozinho.

Cassey se virou e recomeçou a andar pela estrada.

- vejo você em casa..... se estiver vivo! - e começou a gargalhar alto.

Quando Voltei a clareira o corpo de Hugh não estava mais ali, assustei-me com a possibilidade de que ele poderia ter ido embora para nunca mais voltar, de repente comecei a pensar que Cassey estava certo, talvez ele já estivesse morto

- HUGH!

- eu estou aqui!- gritou a voz de Hugh vindo de trás da estranha arvore na qual a mulher de cabelos loiros estava antes.

Me aproximei com cautela e meus medos e anseios se tornaram verdade, Hugh encontrava-se caído, um pedaço de madeira fincado em seu peito, ele sorriu quando viu me rosto. Disto eu jamais iria me esquecer, o sorriso que Hugh lançou a mim, seu ultimo sorriso.

- Alan.... fuja!... fuja enquanto à tempo... ela me matou... e vai te matar se você continuar aqui por muito tempo.

- não posso- disse chegando mais perto dele e me ajoelhando ao seu lado.

Sua respiração estava lenta e fraca, seus olhos estavam semi-cerrados e o local do ferimento estava sangrando, a madeira ainda estava fincada em seu peito.

- onde está Cass?- perguntou Hugh suspirando.

- ele foi embora.... não sei o que houve mas ele disse que você já estava morto.

- de um certo modo eu já estou.

- não fale isso..

- escute!, quero que você vá embora agora! ela esta vindo, e vai fazer o mesmo que fez comigo , o mesmo que fez com os policiais a anos atrás, o mesmo que fez com aquele motorista de ônibus.

- o que ela fez com eles? - perguntei quase chorando.

- ela os matou.... matou, entendeu?

- eu não posso fazer isso- falei, as lagrimas escorriam pela minha face.

- vai agora!

Sem poder evitar levantei-me, Hugh me olhou nos olhos de um modo profundo que ainda hoje me choca, respirou profundamente e fechou os olhos. Ele havia morrido, na minha frente, e agora em diante?, como seria viver sem meus amigos? onde estaria Cassey?

Com essas perguntas latejando em minha cabeça sai da floresta, a estrada estava totalmente vazia e agora a nevoa que pairava pela floresta se apoderara também da estrada. Continuei meu caminho lenta e silenciosamente, quando minhas pernas estava começando a deixar de me obedecer eu finalmente avistei o outro lado, uma rua movimentada, mas que neste momento estava vazia, com certeza era ChipFalls, corri o máximo que pude para sair daquela maldita estrada. Não vi o menor sinal de Cassey ou de alguma outra pessoa, e como não pude evitar novamente chorei como um bebê, triste pela morte de meu amigo, rezava para que eu estivesse errado mas quando chequei em casa e minha mãe veio correndo até mim com os olhos vermelhos tive certeza de que aquela noite tinha sido totalmente real.

Enfim no outro dia encontrei com Cassey no colégio, ele estava abatido como nunca estivera, combinamos em contar a mesma história para todos, de que uma gangue tinha nos pego na estrada e eu e ele tínhamos conseguido fugir mas infelizmente Hugh não. Dois dias depois, com buscas incessantes da policia atrás de Hugh eles finalmente o encontraram, morto, perto da floresta, no seu funeral não pude chegar perto do caixão , que estava fechado, minha mãe disse que tinha falado com a mãe de Hugh e ela a havia lhe explicado que tinham fechado o caixão porque seu rosto e corpo estava desfigurados.

Eu e Cassey fomos motivos de fofoca e olhares atentos por mais ou menos um ano e depois que uma garotinha havia sido atropelada na frente do colégio ela se tornou motivo de fofocas, logo Cassey arranjou uma namorada, Penélope, eles transaram e ela engravidou e nunca mais o vi, ele estava sempre ocupado com o trabalho e depois que junto uma quantidade de dinheiro os dois se mudaram de Curitiba e foram para Santos. Eu também conheci uma garota e a namorei por um ano e meio e depois ela foi embora e nunca me deu noticias.

Sempre vou ao cemitério , visitar Hugh, fico ali sentando por horas falando de minha vida na esperança de que ele me ouça, consegui um bom emprego em uma gráfica e agora recebo mais do que já recebi em todos os meus empregos juntos, logo vou me mudar para o Rio de Janeiro quem sabe e talvez lá eu encontre a garota dos meus sonhos e me case, depois irei voltar para Curitiba para rever meu velho amigo Hugh... hum, talvez.

Ainda tenho medo de passar por perto daquela estrada, ela continua lá, o prefeito da cidade diz que ainda a mantém porque assim a floresta não é desmatada, mas todos sabem a verdade, e a verdade é a de que alguns operários foram mandados para lá, sabe, para averiguar terreno e etc. mas nunca mais voltaram.

Ainda tenho pesadelos com aquela fatídica noite, as vezes nele vejo Hugh debruçado sobre um tronco caído chorando, então ele se virá para mim e diz que ele jamais vai esquecer eu ou o Cass.

Mas enfim, está é a minha história, toda ela, continuo sozinho, sem amigos, porque afinal eu deveria ter conservado as minha antigas amizades ao invés de ficar a procura de outras. Tenho saudades, muitas saudades, e Deus sabe o quanto , das noites nas quais eu Hugh e Cassey ficávamos conversando sobre peitos e etc. até altas horas da noite, de quando fazíamos guerra de travesseiros , de quando escutávamos os Beatles e ficávamos dançando feito bobos. Afinal, amizades devem ser conservadas feito flores... ou arvores de uma floresta.

Adeus Cass, adeus Hugh...

Suas memórias reinarão para sempre em meu coração.

R. L. Urbanski - Curitiba - (sem data)

R L Urbanski
Enviado por R L Urbanski em 20/11/2011
Código do texto: T3345601
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