Poder Absoluto!
Lord Acton: O Poder Corrompe e o Poder Absoluto Corrompe Absolutamente!
Aquele quadro causou-me pavor desde a primeira vez que o vi. No entanto, percebi que era a única pessoa a carregar aquela impressão. Não havia, à primeira vista, nada no mesmo que remetesse a qualquer tipo de horror. Em verdade, tratava-se de uma peça muito bonita. Uma exuberante árvore exibia flores amarelas situada no topo de pequena elevação acinzentada. Ao fundo desenhava-se uma terrível tempestade em um céu violáceo. A moldura era colossal. A pintura possuía quase dois metros de altura tendo um metro e meio de largura e enfeitava o hall de entrada do nosso condomínio de apartamentos.
O prédio era antigo, da década de 40, mas um clássico e elegante edifício situado na zona mais nobre da cidade. Várias edificações da mesma época foram demolidas, mas aquela estrutura sobrevivera ao assédio do tempo e da especulação imobiliária. O que me apavorava era o fato de, a cada vez que por ele passava, ter a nítida impressão de que as nuvens ao fundo mudavam de forma e, além disso, esboçavam uma face demoníaca que apenas eu conseguia ver.
Certa vez fiquei com minha noiva admirando-o e ela achou que eu estava ficando louco:
- Não vejo nada, meu bem. Somente nuvens. Belas nuvens, aliás.
Fiquei frustrado. Certa noite de tempestade, quando chegava da rua, após deixar o carro com o manobrista, apoiei uma das mãos na moldura enquanto verificava o estado da sola do meu sapato. Acreditava ter pisado em substância pouco digna. Nisso, senti uma mão grotesca, musculosa e peluda, saltando das nuvens da tela e puxando-me para o interior da pintura. Gritei de pavor e medo. Lutava bravamente segurando na moldura, mas a mão era por demasia forte e vi que seria devorado por um buraco negro que se abrira diante de meus olhos sugando tudo com uma força descomunal. Nisso, percebi duas órbitas oculares medonhas dentro do buraco e um raio foi projetado pelas mesmas lançando-me longe até bater com as costas na parede contrária a quase oito metros de distância. Enquanto desfalecia, vi que uma forma esfumaçada saía da moldura e se dirigia para mim. Apavorado, mas sem forças, senti-me sufocar com aquele vapor adentrando-me as narinas e causando um mal estar que levou-me a desfalecer...
Acordei apavorado e debatendo-me. Logo fui seguro por mãos fortes. Aos poucos voltei à calma e percebi que estava em um leito hospitalar. Diná, minha noiva, era uma das pessoas no quarto, além dos meus pais e alguns amigos. Os enfermeiros me venceram com seus músculos possantes e tive que ser medicado para me acalmar...
Os dias foram passando e me dei conta do que ocorrera. Disseram que, ao entrar molhado no hall, sem querer, encostei em uma tomada ao lado da moldura e fui lançado longe por poderoso choque. Tive sorte, disseram. O natural seria ter ficado grudado, mas alguém lá em cima gosta de mim, disseram. Tudo passou por um terrível acidente, conforme todos queriam acreditar, mas eu sabia da verdade. Uma verdade absolutamente estranha para ser compartilhada.
Por cautela, ainda ficaria alguns dias no hospital.
Deixaram-me sozinho à noite. Querendo dormir, ouvia o ronco perturbador do meu vizinho de quarto: um homem gordo que sofrera uma intervenção graças ao apêndice inflamado. Era um tipo desagradável que soltava flatos nojentos enquanto dormia. Mesmo distante, podia ouvir seu ronco, e o som dos flatos. Fui ficando irritado. Concentrei meu pensamento com energia e, sem o saber, simplesmente bradei:
- Gostaria que você explodisse, seu gordo!
Quase que instantaneamente o ronco parou. Poucos segundos depois um estrondo terrível tremeu as paredes do aposento e encheu de pavor o hospital. Alarmes soaram e luzes piscaram. Foi um verdadeiro corre-corre nos corredores. Levantei-me cambaleante e dirigi-me para a porta. Ao abri-la, pude perceber que a porta do quarto do meu vizinho fora lançada com força contra a parede oposta. Avancei e olhei par seu leito. Logo em seguida corri para meu banheiro para vomitar. Havia restos do homem por todo o quarto. Literalmente ele explodira. Senti-me mal, mas, ao mesmo tempo, não podia acreditar que era agora dono de tamanho poder. Tudo devia ter sido uma terrível coincidência e tal feito não seria possível...
Depois daquela noite de caos e pânico no Hospital Central, voltei para a paz do meu apartamento. O quadro estava lá, imponente e, reparando bem, pude ver nas nuvens o desenho da figura de um ser grotesco, com faces deformadas esboçando um estranho e medonho sorriso. Um gélido frio percorreu-me a espinha e subi no elevador apoiado por Diná e meus pais.
Deixaram-me só, a meu pedido, embora insistissem para dormir aquela noite comigo. Não sentia que seria prudente. Se realmente houvesse algum poder em mim, talvez não fosse seguro ter pessoas queridas por perto. Senti vontade de fumar e procurei por um cigarro em todos os meus esconderijos. Como os médicos haviam proibido, pelo menos até que me recuperasse, mamãe e Diná deviam ter feito uma limpeza. Resolvi sair para comprar uma carteira.
Cumprimentei o porteiro alegremente. Andei algumas quadras e achei um bar aberto. Fiquei feliz ao caminhar pela rua tragando aquele pedaço de morte lenta. Ao descer do meio-fio, uma motocicleta em alta velocidade tirou um fino em mim derrubando o cigarro e o isqueiro. Por pouco não me matou. Senti que o motoqueiro não se importou e acelerou ainda mais. Irritado, bradei:
- Morra, desgraçado!
Naquele mesmo instante sua moto acelerou a toda pela avenida. Percebi, mesmo a distância, o terror do homem que não tinha mais domínio sobre a máquina não conseguindo fazer uma curva próxima estatelando-se contra a murada em frente. Sabia do resultado. Em pouco, apesar do avançado da hora, pessoas correram ao local. Calmamente segui de volta ao prédio...
Estava ansioso para voltar ao trabalho. Graças à recente onda de prosperidade nacional, ganhava bem como corretor de imóveis, mas queria mais. Será que aquele meu poder conseguia influenciar os outros? Na entrada do prédio comercial onde ficava a imobiliária, resolvi testar minha nova capacidade de ¨interferir nos destinos alheios¨. O porteiro do prédio era fanático pelo Flamengo. Após saudações inicias e cortesias prestadas pelo meu acidente, puxei assunto e, concentrando-me no Vasco da Gama, perguntei-lhe:
- Qual o melhor time do mundo?
- Vaassscooo! – Disse quase cantando e em voz alta. Outros funcionários próximos olharam-no assustado. O homem não podia acreditar que dissera aquilo e logo tentou corrigir, mas saiu outro Vaaasssco! Era muito divertido, mas deixei-o em paz e logo voltou ao estado natural de adoração.
A partir daquele dia eu não perdia mais nenhuma venda. Todos os negócios eram fechados rapidamente. Ficava cada vez mais próspero e, em breve, seria promovido a sócio. No entanto, nem tudo eram flores. Em uma certa manhã, que nunca irei esquecer, chegou-me um estranho e anônimo pacote pardo. Sentei-me na minha sala e, para meu espanto, diante dos meus olhos, vi fotos indecentes de Diná em lance amoroso com meu melhor amigo. Uma onda terrível de dissabor e ódio subiu-me pela entranhas. Sem atinar direito, não tendo ainda controle sobre meus desejos e a minha ira, pedi irrefletidamente pelo que não devia:
- Quero que tudo vá para o inferno! Naquele mesmo instante, labaredas intensas espalharam-se pela sala e por outras contíguas. Somente sei que fui uma das primeiras vítimas e o protagonista daquele terror que consumiu o Joelma estando agora a arder nas labaredas de minhas terríveis memórias...
O prédio era antigo, da década de 40, mas um clássico e elegante edifício situado na zona mais nobre da cidade. Várias edificações da mesma época foram demolidas, mas aquela estrutura sobrevivera ao assédio do tempo e da especulação imobiliária. O que me apavorava era o fato de, a cada vez que por ele passava, ter a nítida impressão de que as nuvens ao fundo mudavam de forma e, além disso, esboçavam uma face demoníaca que apenas eu conseguia ver.
Certa vez fiquei com minha noiva admirando-o e ela achou que eu estava ficando louco:
- Não vejo nada, meu bem. Somente nuvens. Belas nuvens, aliás.
Fiquei frustrado. Certa noite de tempestade, quando chegava da rua, após deixar o carro com o manobrista, apoiei uma das mãos na moldura enquanto verificava o estado da sola do meu sapato. Acreditava ter pisado em substância pouco digna. Nisso, senti uma mão grotesca, musculosa e peluda, saltando das nuvens da tela e puxando-me para o interior da pintura. Gritei de pavor e medo. Lutava bravamente segurando na moldura, mas a mão era por demasia forte e vi que seria devorado por um buraco negro que se abrira diante de meus olhos sugando tudo com uma força descomunal. Nisso, percebi duas órbitas oculares medonhas dentro do buraco e um raio foi projetado pelas mesmas lançando-me longe até bater com as costas na parede contrária a quase oito metros de distância. Enquanto desfalecia, vi que uma forma esfumaçada saía da moldura e se dirigia para mim. Apavorado, mas sem forças, senti-me sufocar com aquele vapor adentrando-me as narinas e causando um mal estar que levou-me a desfalecer...
Acordei apavorado e debatendo-me. Logo fui seguro por mãos fortes. Aos poucos voltei à calma e percebi que estava em um leito hospitalar. Diná, minha noiva, era uma das pessoas no quarto, além dos meus pais e alguns amigos. Os enfermeiros me venceram com seus músculos possantes e tive que ser medicado para me acalmar...
Os dias foram passando e me dei conta do que ocorrera. Disseram que, ao entrar molhado no hall, sem querer, encostei em uma tomada ao lado da moldura e fui lançado longe por poderoso choque. Tive sorte, disseram. O natural seria ter ficado grudado, mas alguém lá em cima gosta de mim, disseram. Tudo passou por um terrível acidente, conforme todos queriam acreditar, mas eu sabia da verdade. Uma verdade absolutamente estranha para ser compartilhada.
Por cautela, ainda ficaria alguns dias no hospital.
Deixaram-me sozinho à noite. Querendo dormir, ouvia o ronco perturbador do meu vizinho de quarto: um homem gordo que sofrera uma intervenção graças ao apêndice inflamado. Era um tipo desagradável que soltava flatos nojentos enquanto dormia. Mesmo distante, podia ouvir seu ronco, e o som dos flatos. Fui ficando irritado. Concentrei meu pensamento com energia e, sem o saber, simplesmente bradei:
- Gostaria que você explodisse, seu gordo!
Quase que instantaneamente o ronco parou. Poucos segundos depois um estrondo terrível tremeu as paredes do aposento e encheu de pavor o hospital. Alarmes soaram e luzes piscaram. Foi um verdadeiro corre-corre nos corredores. Levantei-me cambaleante e dirigi-me para a porta. Ao abri-la, pude perceber que a porta do quarto do meu vizinho fora lançada com força contra a parede oposta. Avancei e olhei par seu leito. Logo em seguida corri para meu banheiro para vomitar. Havia restos do homem por todo o quarto. Literalmente ele explodira. Senti-me mal, mas, ao mesmo tempo, não podia acreditar que era agora dono de tamanho poder. Tudo devia ter sido uma terrível coincidência e tal feito não seria possível...
Depois daquela noite de caos e pânico no Hospital Central, voltei para a paz do meu apartamento. O quadro estava lá, imponente e, reparando bem, pude ver nas nuvens o desenho da figura de um ser grotesco, com faces deformadas esboçando um estranho e medonho sorriso. Um gélido frio percorreu-me a espinha e subi no elevador apoiado por Diná e meus pais.
Deixaram-me só, a meu pedido, embora insistissem para dormir aquela noite comigo. Não sentia que seria prudente. Se realmente houvesse algum poder em mim, talvez não fosse seguro ter pessoas queridas por perto. Senti vontade de fumar e procurei por um cigarro em todos os meus esconderijos. Como os médicos haviam proibido, pelo menos até que me recuperasse, mamãe e Diná deviam ter feito uma limpeza. Resolvi sair para comprar uma carteira.
Cumprimentei o porteiro alegremente. Andei algumas quadras e achei um bar aberto. Fiquei feliz ao caminhar pela rua tragando aquele pedaço de morte lenta. Ao descer do meio-fio, uma motocicleta em alta velocidade tirou um fino em mim derrubando o cigarro e o isqueiro. Por pouco não me matou. Senti que o motoqueiro não se importou e acelerou ainda mais. Irritado, bradei:
- Morra, desgraçado!
Naquele mesmo instante sua moto acelerou a toda pela avenida. Percebi, mesmo a distância, o terror do homem que não tinha mais domínio sobre a máquina não conseguindo fazer uma curva próxima estatelando-se contra a murada em frente. Sabia do resultado. Em pouco, apesar do avançado da hora, pessoas correram ao local. Calmamente segui de volta ao prédio...
Estava ansioso para voltar ao trabalho. Graças à recente onda de prosperidade nacional, ganhava bem como corretor de imóveis, mas queria mais. Será que aquele meu poder conseguia influenciar os outros? Na entrada do prédio comercial onde ficava a imobiliária, resolvi testar minha nova capacidade de ¨interferir nos destinos alheios¨. O porteiro do prédio era fanático pelo Flamengo. Após saudações inicias e cortesias prestadas pelo meu acidente, puxei assunto e, concentrando-me no Vasco da Gama, perguntei-lhe:
- Qual o melhor time do mundo?
- Vaassscooo! – Disse quase cantando e em voz alta. Outros funcionários próximos olharam-no assustado. O homem não podia acreditar que dissera aquilo e logo tentou corrigir, mas saiu outro Vaaasssco! Era muito divertido, mas deixei-o em paz e logo voltou ao estado natural de adoração.
A partir daquele dia eu não perdia mais nenhuma venda. Todos os negócios eram fechados rapidamente. Ficava cada vez mais próspero e, em breve, seria promovido a sócio. No entanto, nem tudo eram flores. Em uma certa manhã, que nunca irei esquecer, chegou-me um estranho e anônimo pacote pardo. Sentei-me na minha sala e, para meu espanto, diante dos meus olhos, vi fotos indecentes de Diná em lance amoroso com meu melhor amigo. Uma onda terrível de dissabor e ódio subiu-me pela entranhas. Sem atinar direito, não tendo ainda controle sobre meus desejos e a minha ira, pedi irrefletidamente pelo que não devia:
- Quero que tudo vá para o inferno! Naquele mesmo instante, labaredas intensas espalharam-se pela sala e por outras contíguas. Somente sei que fui uma das primeiras vítimas e o protagonista daquele terror que consumiu o Joelma estando agora a arder nas labaredas de minhas terríveis memórias...
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