A cruz e o canino - Capítulo 11: Seminário
Santa Fé 1981
Antônio tomava seu cafezinho na sala dos professores. Ele dava aula de angelologia no seminário de Santa Fé, desde pouco tempo depois que voltou para sua cidade. Não gostava muito de dar aula, mas o fazia a pedido do bispo, que disse que seria bom para ocupar a mente e servir a Deus. Não tinha problema algum em ser professor, apesar disso.
Os alunos não davam trabalho na sala, e isso era uma das poucas coisas que mantiam Antônio em sala. Os jovens eram aplicados, alguns mais e outros menos, obviamente, mas não davam trabalho, no geral. Só havia um aluno com quem Antônio não simpatizava muito, ele não se atinha às aulas, e, mesmo assim, saía-se bem em provas. O nome dele era Eustácio, e ele sempre ficava no canto da sala, tinha poucos amigos e não falava muito. Antônio já conversara até com o reitor Adriano, que garantiu que Eustácio era um bom rapaz e que Antônio não precisava se preocupar.
Antônio saía tarde da escola, pois ficava estudando depois das aulas, mas ultimamente passou a ouvir ruídos durante a noite, e começou a desconfiar de ratos ou morcegos. Falou dos barulhos com o reitor, que chamou um dedetizador, mas este nada encontrou. Os barulhos continuavam a perturbar Antônio durante suas leituras. Uma vez, quando Antônio estava saindo da escola, ele ouviu um barulho de algo tombando, algo grande. O padre seguiu o som e entrou na biblioteca, onde uma das estantes jazia no chão, e os livros se espalhavam por poucos metros. Antônio ligou para a casa do reitor, do telefone de sua sala:
-Alô, Adriano?
-Alô. Boa noite.
-Boa noite. Aqui fala Antônio.
-Aconteceu alguma coisa?
-O senhor está muito ocupado?
-Não muito, pode falar.
-Venha para o seminário, você tem que ver uma coisa.
-Você tem noção de que horas são?
-É importante.
-Tomara que seja.
Adriano desligou o telefone, vestiu uma roupa apropriada e foi para o seminário. Levou 15 minutos para chegar, e encontrou Antônio na porta:
-O que aconteceu?
-Lembra-se dos barulhos, e de que nenhum bicho foi achado?
-Antônio, estou começando a achar que você está imaginando coisas.
-Definitivamente não, senhor. Me siga.
Os dois homens chegaram à biblioteca, e lá estava a prateleira caída no chão.
-O que isso significa!? - bradou Adriano.
-Senhor, acho que algum vândalo está entrando aqui à noite e causando esses problemas.
-Então teremos que contratar um vigia.
O reitor mal acabara de falar, e as luzes apagaram de repente, e o prédio ficou completamente escuro, envolto em sombras. Antônio pegou uma vela e uma caixa de fósforo no balcão da biblioteca, mas a luz da chama da vela era demasiado fraca, conquanto alumiasseo lugar.
-Quem está aí? - berrou o reitor. - Apareça, vândalo. Não quer que eu chame a polícia, ou quer?
Passos ecoatam no corredor, e o coração de Antônio disparou. Os passos ficaram cada vez mais lentos, até pararem. O corredor ficou em silêncio por um minuto até que uma criatura surgiu das sombras em direção a Adriano. Antônio pulou na frente do vampiro e jogou cera da vela nele. Os vampiros não sentem as queimaduras, mas a vela era benta, odiada pelos demônio.
O vampiro recuou, mas a quantidade de cera foi muito pequena, e ele logo retirou-a de cima de si e ergueu-se outra vez. Ele olhou para frente e só viu o reitor, mas não fazia diferença, atacá-lo-ia então, como atacaria qualquer pessoa, e foi andando até Adriano, que estava apavorado e paralisado, mas o que o vampiro não notou é que Antônio já estava atrás dele e enfiou-lhe uma estaca no coração. O vampiro caiu no chão, morto. Era um aluno de Antônio. Adriano, que nunca tinha visto um vampiro, estava boquiaberto, atônito.
-Ligue para o bispo. – disse-lhe Antônio.
-O que eu falo? - perguntou o reitor, desesperado.
-Conte que apareceu um vampiro aqui e que precisamos do padre Pedro.
-Está bem. - disse Adriano, enquanto ia para sua sala.
-E não se esqueça de que o queremos aqui o mais rápido possível.
-Bispo!
-Fale, meu filho.
-É Adriano, reitor do seminário. Apareceu aqui um vampiro. Antônio estava comigo e o matou. Ele pediu para chama o padre Pedro tão logo quanto possível.
-O padre Pedro está viajando e só volta amanhã. Ele pode ir àí depois de amanhã.
-E até lá o que faremos?
-Você e Antônio terão que ficar no prédio vigiando.
-Mas... aqui tem vampiros.
-Não se preocupe, Antônio é um caçador treinado.
-Não estou preocupado com ele, mas sim comigo.
-Ele te protegerá se algum vampiro aparecer.
-Não confio tanto assim.
-Se quiser ir embora, vá, homem sem fé, mas está fugindo da cruz que Cristo lhe deu.
-Então é para eu ficar aqui?
-De certo.
-Está bem. Adeus.
Adriano desligou o telefone e voltou para o corredor, onde Antônio estava.
-O bispo disse que o padre Pedro só virá depois de amanhã.
-Suspenda as aulas de amanhã. Ficaremos aqui até ele chegar.
-Mas... está bem. Já vi que não adianta discutir.
A noite seguinte se deu tranquila, mas Antônio e Adriano não dormiram direito, ficaram se revezando na guarda da escola.