Crônica Maldita

DEDICADA AO AMIGO: JÚLIO DOSAN. POR NOSSA AMIZADE QUE VAI COMPLETAR UM ANO.

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Escutei o bip do relógio marcando três horas da madrugada. Fiquei pensando um momento: “Ué, eu não estava dormindo?”. Meus olhos ainda fechados não me revelaram absolutamente nada, apenas a penumbra do ambiente ao meu redor. O cheiro da madeira do meu novo guarda roupas invadia todo o ambiente, inebriante.

Ouvi ao longe um solitário veículo passando pela avenida deserta. O cachorro do meu vizinho latiu, assustando um casal de felinos que insistia em encher a noite com seus ganidos de amor. Pude ouvir que a vizinha do outro lado ainda esta acordada e aparentemente, assistia o filme após o “Programa do Jô”.

Pensei em como minha vida era tediosa. Nada acontecia. Era mal amado, para completar estava com trinta anos, desempregado, e meu seguro desemprego estava pronto para acabar. Lembrei-me dos meus tempos de criança no interior, em que acordava de madrugada e ficava morrendo de medo dos seres da noite. Ouvia passos dentro da noite, uivos e vozes que eu simplesmente, não me interessava de saber o que era, pois estava congelado de medo.

A noite simplesmente passa e nada de Morpheus chegar. O nome do novo gerador de sentimentos é insônia.

Imerso nos meus delírios, notei que a luz do quarto acendeu. Mas, como? É impossível.

Um segundo depois e ela está apagada novamente, porém não fui eu que apaguei. Devo estar sonhando acordado. O suor escorre em minha testa.

Tento me mexer, mas não consigo. Estou paralisado, meu corpo não responde mais aos comandos do meu cérebro, começo a ter dificuldades para respirar, parecia que ia sufocar.

Ouço passos no corredor. Pensei, também, que morasse sozinho. O teto parece que desabará sobre mim, pessoas empurram cadeiras no andar de cima, mas minha casa não é duplex, simplesmente, não sei explicar o que é.

Tento abrir os olhos, mover os braços, não consigo. Pânico. O ar fica pesado, um cheiro nojento de carne podre toma conta do quarto. Os passos no corredor, finalmente, chegam até a porta do meu quarto.

Escuto o calmo ranger da fechadura. Para mim, ela não estava tão enferrujada, para gemer tanto assim, mas o que me importa é que alguém esta entrando no recinto onde estou dormindo e não posso fazer nada para me defender.

Sinto os passos chegando ao lado da minha cama. Sinto uma fisgada no pescoço. Estou sonhando? Espero que sim.

Sinto meu sangue ser sugado. Sinto a vida escapar do meu corpo. Felizmente, não dói. Apenas incomoda um pouco. Antes de desmaiar, consigo, finalmente, abrir os olhos. Vejo uma silhueta negra, pois está contra a luz que vem do corredor. Perco os sentidos, para qualquer um, estava dormindo tranquilamente.

Acordei com dores no pescoço, provavelmente, dormir de mau jeito, é muito ruim. Meus dias têm sido muito simples, passo o dia na rua atrás de emprego e passo o dia levando educados NÂOS na cara. Por que iria querer uma vida melhor?

De noite, a insônia me vem como fiel companheira. O sono leve não é suficiente para me fazer relaxar totalmente. Mais uma vez, os sentimentos de solidão e tédio me acompanham e só me resta ouvir os sons da madrugada.

Um avião corta o céu escuro da cidade como um som de trovão. Mais ao longe, ainda posso escutar o grito de algum boêmio apaixonado por sua amada, ou será que é um bêbado desvairado praguejando sua má sorte? Uma fina garoa começa a cair do céu lavando o asfalto e os pecados urbanos, mais uma vez lembro-me da infância no campo. Chuva sempre me lembra da minha meninice, era tão feliz. Pena. Eu não sabia.

Perdido nas minhas lembranças. Sou sugado de volta para o mundo real, o dom de passos, novamente, ecoam no corredor. No mesmo instante em que escuto o ranger da porta, meu pescoço volta a doer, parece reconhecer seu agressor de outrora. A figura avança calmamente, até o lado da minha cama e dessa vez o cheiro de carne podre é mais intenso, insuportável, mal consigo respirar sem querer colocar o jantar para fora. A luz acende sozinha e eu posso ver a imagem do meu agressor.

Um a figura pálida e alta que devia ter, aproximadamente, um e noventa me encarava. Ele tinha longos braços ao lado do corpo, uma pele amarronzada e despregada do corpo, muito nojenta. Seus olhos eram grandes e negros, sem pupilas, tive uma enorme sensação de vazio, ao olhar para aqueles olhos insalubres. Suas longas pernas se encaixavam em um tronco pitoresco e seco, pois podia ver os seus ossos furando a pele seca. Uma visão aterradora que me fez querer gritar.

Mas, nenhum músculo do meu corpo respondia, apenas pude arregalar os olhos e ver o monstro chegar cada vez mais perto de mim. Ele tocou minha barriga e rumou para o pescoço, novamente, senti uma leve espetada, mas agora na nuca; pequena dor me envenena. Então, dos olhos da criatura um enorme clarão alaranjado me cegou e, imediatamente, eu caí em sono profundo.

João Murillo
Enviado por João Murillo em 09/09/2011
Código do texto: T3208946
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