A volta dos mortos
“ No dia que eu nasci, um vento frio e cinza varria as árvores, os papeis no chão e dava ao canto que eu estava, medo de sair, entrar no campo do frio, no campo do conhecimento. Conhecer é morrer. Conhecer é não saber, aguentar as trevas das dúvidas, e fortalecer os irmãos na sua angústia”
Li isso no bilhete que Durval me deixou. Mesmo com pouca idade achei exagerado, apesar de mais ou menos compreender. Ele foi embora e deixou apenas esse . Luto que dentro desse texto exista uma Outra mensagem, sublinhas, pedaços não alcançado. Depois de muitas esperanças ou de grande limitação. Não sei bem. Desistir de procurar algo a mais. Larguei a esperança e prontifiquei dentro do tempo, imerso na dor e da duvida do mundo. Fato esse que só me aconteceu, quando em momento de profundo desespero, reconheci dentro de cada palavra a minha incapacidade de alcança-la. Deste então, me tornei algo de vento, de medo, varrendo como o bilhete, o nascer de muitos homens.
Percebi que a cada nascimento, vem antes um profundo aperto, o vencer de um lugar, compressão do que eles são. Essa dor negada, vem de forma absoluta na desistência do momento. Quando a capacidade de sustentar se torna insuportável. Vem a destruição de fato pregressos, sem no entanto, anulá-los.Varre no interior do feto, uma vastidão de medo que vem das profundezas da existência. Varrendo corpo, estômago, nenhuma palavra nesse momento, nada tem significado. O terreno movediço treme de forma zonza, o mundo perde sua materialidade. Um bom viajante faz vôos em minutos, outros inexperientes, dias, anos as vezes sejam necessários. De repente, um dia numa profusão de dor, cólera e engasgo de flores, tudo explode. A renovação se dá. Flores são novamente flores.
O vento frio se acalma, a esperança renova, o bebê chora a bofetadas que não machuca. Faz viver. O viajante por sua mala no chão abraça seus amados, surpreendido pela sua volta.
Deixo um bilhete.