Prelúdios Vampirescos - A história de Hannah Ventura
Meu nome é Hannah Ventura, mas nem sempre foi assim.
Nasci em 1796. Meu nome era Mireille Hélène Perrin. Meu avô havia servido nas tropas Napoleônicas, e meu pai ainda serviu no finalzinho desta época. Vivi até meus 25 anos em uma família francesa tradicional. Minha mãe me treinava p´ro serviço doméstico, e eu só queria saber de receber aulas de espada com meu pai. Ele nunca ligou muito pras burocracias sociais não, e nem se preocupou em me casar cedo. Aos 19 anos, meu primo e amigo cortejou-me e solicitou minha mão ao meu pai. Não vi problemas com isso, levando em conta que além de ser o maior pederasta que já se obteve notícia na história da França, ele ainda por cima era extremamente rico. Casamos-nos, e vivemos como "capa" um do outro. Ele namorava os rapazolas que encontrava pelas periferias sujas de Paris, e eu continuava treinando minhas tão queridas armas brancas. Quando meu marido, primo e amigo e eu já havíamos decidido fazer um esforço a mais e trazer juntos uma nova vida ao mundo, eu já tinha lá meus 21 anos. Em uma noite de porre(para ambos), concebemos o ato que vinhamos evitando desde nosso casamento, e encomendamos a vinda do moleque ao mundo. (Peço desculpas se acabar usando alguns termos de baixo calão, a propósito. Os anos me tornaram um tanto quanto coloquial).
Contratamos os melhores serviçais para cuidarem daquela vida que nem eu nem ele valorizávamos tanto assim. Auguste era mais um troféu para exibir para a tão exigente e maçante sociedade do que um filho realmente. Enquanto isso, eu já havia cortado o cabelo, colocado uma atadura nos seios, e agora me divertia em clubes de esgrima por Paris, derrotando homens bem mais fortes que eu.
Aos 25 anos(o ano era 1821, o ano em que o grande conquistador Napoleão Bonaparte, uma das personalidades que mais apreciei, partiu do mundo dos filhos de Adão.), em uma noite de bebedeira em um bar Parisiense, um certo homem muito desaforado se atreveu a passar a mão em mim, e eu prontamente o desafiei para um duelo de espada. Outro homem que ali bebia, observava tudo em seu canto, enquanto eu raciocinava um meio de conseguir uma arma, já que não carregava a minha comigo, e o bêbado saliente estava devidamente armado. Aquele homem do canto era Count Germaine. Lindo, sedutor, charmoso e imponente, Germaine se aproximou de mim, e me ofereceu a própria espada cordialmente.
-com a condição de que você o derrote -sussurrou ele em meu ouvido com sua voz rouca e grave.
Destruí meu oponente de forma que nem eu imaginava ser capaz. Deixei-o gravemente ferido no chão, atraindo a atenção da polícia. Germaine notou a movimentação ao meu redor, e em um reflexo muito rápido, enfiou-me carruagem a dentro, e ele mesmo guiou o veículo para longe dali. Nos encontramos então em uma rua mais deserta, e ele me disse que estava sinceramente impressionado com meus dotes. Não estou muito afim de ficar contando blá blá blá de abraço. Vocês sabem o que aconteceu depois. Ele me abraçou, e foi morar em minha casa, com meu marido e filho. Pierre não fez grandes perguntas, e eu até acho que ele gostou muito da presença de Germaine em casa, levando em conta que por diversas vezes despertei na madrugada com os gemidos dos dois no quarto ao lado. Tanto fazia, sinceramente(nunca compreendi muito bem pra que serve um pênis se não para engravidar).
Minha besta acordou de maneira diferente das demais. Perdia o controle facilmente, e Germaine, por ter me abraçado quando tinha apenas 29 anos de abraço(que somados aos 20 que possuía ao ser abraçado somavam 50), também não podia me explicar a razão desde ocorrido. Buscaríamos explicações depois, no entanto, pois era muito divertida a nossa vida de Bon Vivant boêmios e descontrolados. Tocamos o literal terror na noite...saíamos abraçando jovens, só pra vê-los tentar escapar de nós, e depois os matávamos ao nosso bel prazer. Caçávamos as prostitutas da cidade para vê-las tentando nos seduzir, e depois decapitávamos, torturávamos, ou simplesmente nos alimentávamos delas(foi nessa época que Germaine e eu desenvolvemos o costume de só nos alimentarmos de fato de prostitutas), e gostávamos também de invadir residências e dizimar a família inteira, quando algum membro havia nos injuriado anteriormente. Pierre foi transformado em carniçal. Um carniçal é um humano que toma o sangue de um membro(ou vampiro, em termos chulos) e assume alguns poderem em níveis mais brandos, além de conservar-se jovem enquanto durar a fonte de seu poder(ou seja, enquanto o membro "viver"). Era ele quem protegia nossos corpos enquanto dormíamos de dia, e que cuidava das finanças. Germaine e eu éramos mais irmãos do que "pai" e "filha" de fato. Desenvolvemos, cada um de nós, habilidades distintas. Eu era bem mais forte, e ele bem mais sedutor. Éramos igualmente rápidos. Eu via auras e os sentidos eram mais peculiares para mim, e ele aprendeu a resistir danos em seu corpo com facilidade.
Nos divertíamos tanto escapando dos olhos da Camarilla(na época a seita que regia a cidade nem desconfiava dos anjinhos milionários da mansão Perrin.) que nem notamos quando Auguste, aos 16 anos, fugiu de casa. Não fez muita diferença para nós. Germaine, com seu charme e lábia de mestre, se envolveu com uma mulher que desfrutava de grande prestígio na época dentro da Camarilla, e isto em muito nos beneficiou.
Vivemos felizes, desfrutando o pós vida, por meio século. Em 1871, porém, Germaine começou a exagerar na brincadeira.
Meu mentor e amigo costumava provocar certas contendas e paixões exageradas. Se envolvia com muitas mulheres e muitos homens, despertava ciúmes, inveja, intrigas e duelos(e com certeza o fazia de propósito). A camarilla começou a se aborrecer conosco, e concordamos em deixar Paris de uma vez por todas.
De malas prontas, chegamos à Londres. A capital inglesa era linda, mas menos iluminada e viva que minha doce Paris. Mesmo assim, o ar sombrio de Londres deu lugar à novas noites de terror planejadas alegremente por Germaine e por mim. Passei a me chamar Eleanor Bennett, e Germaine continuava com o mesmo nome, ao qual eventualmente substituía por "Gerry" ou "German" se necessário fosse. A camarilla de Londres parecia-nos um pouco mais organizada do que a de Paris, mas não nos importávamos. Na realidade, Germaine e eu até buscávamos estar em uma cidade sob a organização da Camarilla, por motivos óbvios: Sabá é violento, e talvez se importasse bem menos com nossos hábitos excêntricos, e cidades independentes tem diablerie rolando solta, Germaine tem geração baixa, ou seja, seu pescoço também estaria em risco, mas isso tudo, claro, não passava de desculpas. Havia claramente em ambos o desejo de estar mais próximos do perigo, e como encontrar local mais perigoso para se estar quando não se tem lá o melhor dos caráteres do que próximo à Camarilla?
Ah os anos lindos de Londres! Acompanhei todo o desenvolvimento da máquina, e me dediquei, quando não estava sendo o inferno na Terra(se sou uma amaldiçoada, devo agir como uma - Foi o que alguém me disse uma vez em algum lugar) a estudar tudo o que o homem era capaz de criar(e no futuro isso acarretaria em uma de minhas principais atividades, levando em conta a maneira que sobrevivo atualmente). Foi em meados de 1930 que Germaine e eu criamos problemas sérios em Londres. Ele foi descoberto dando uma de "leva e trás" dentro da Camarilla, na qual já estavamos infiltrados havia muito tempo, e para evitar que fossemos mortos sem razão(só estávamos nos divertindo), fugimos de Londres na traseira de um navio de carga, sem conhecer ao certo seu destino. Confesso que não queria deixar Londres ainda...eu tinha planos para aquela cidade, e gostaria de ter destruído mais um pouco os ingênuos membros da seita(pessoalmente eliminei o laço do Senescal com a chefe dos Algozes, me tornando um tanto quanto íntima da mesma), afinal, esta era nossa maior diversão.
Eu precisava de Germain para provocar os sentimentos mais cruéis, e me aproveitava de minha beleza e sensualidade para levar o plano à cabo. O navio nos levou aos E.U.A. O primeiro ano da grande depressão nos recebeu como uma mulher estéril. O pós Guerra deixou no ar um clima mórbido e soturno, o clima em que Germaine e eu mais nos adaptávamos. Os americanos não tinham emprego, nem dinheiro, nem estima. Fomos nós os santos, os benevolentes anjos da morte que os conduziram à solução de seus problemas. Dizimávamos, feríamos mortalmente e abandonávamos à deriva dos portos e navios, e saqueávamos para usufruto de nossos luxos pessoais. Neste ano, Pierre foi morto por um caçador, e descobrimos o quão perigoso esses mortais que conhecem nossa natureza encantada e nos perseguem até a morte podem ser.
Mal nos instalamos na primeira cidade Camarilla que encontramos(Los Angeles foi nossa eleita), e a segunda guerra mundial começou. Ríamos, ríamos aos montes, ao encontrar outros Anarquistas naquela época. Anarquistas que vez ou outra davam uma de mortais, e se envolviam na guerra inútil, a guerra sem fundamentos, a guerra deles, a troco de nada. Ríamos mais ainda ao encontrar anarquistas dos nossos. Aqueles que ignoravam as regras da seita, dos mortais, de Caim, de quem quer que fosse, e viviam às margens das sociedades, mortal e imortal, destruindo tudo o que se pode intitular por "ordem". Com estes, o último tipo, ríamos juntos, em reuniões de terror...ríamos novos aliados, que juravam nos proteger onde quer que estivéssemos.
Os países aliados venceram. Tanto fazia para nós...estávamos envolvidos em nossa maior empreitada: Madame Guil viria à ser eleita Justicar em breve, e Germaine e eu planejávamos usurpar este cargo dela. Treinamos, trapaceamos, nos dedicamos e finalmente nos envolvemos com ela, afim de repetir o ato mais bem bolado que já havíamos tido notícias: Kemintiri e o Justicar Ventrue(quem conhece a história da lista vermelha entende muito bem, quem não conhece, que vá procurar no google). Me aproximei de Guil e ela de mim. Apesar de ser extremamente mais velha que eu, ela me amava, e disso eu sabia. Germaine era apenas aquele dedicado amigo que sempre estava ali para resolver os problemas da seita, sem jamais levantar suspeitas. O plano era perfeito.
Conseguimos manter-nos ao lado dela por mais um quarto de século. Infelizmente, em 1970, nosso tiro saiu pela culatra, e ela descobriu nossas reais intenções através de um maldito Toreador com leitura profunda de mentes. Germaine e eu fugimos, desesperados, sendo agora vítimas de caçada de sangue. Decidimos nos separar, pois juntos seríamos localizados com maior facilidade. A única dor da qual me lembro em toda a minha existência foi a separação de Germaine, mas se fez necessário, e foi feito. Viajei sem rumo por muitos lugares do mundo, estudando a tecnologia, aperfeiçoando minha força e habilidades de guerra, e conhecendo outros anarquistas nos quais despertava paixões e rivalidades. Em meados de 1990, somente, em uma passagem pela Venezuela, conheci o Sr. Lúcio Ventura. Eu já me apresentava como Hannah, nome que assumi em Israel, e estava realmente meio perdida quando o conheci. Lúcio era um bravo guerreiro, e possuía influência assombrosa dentre os da Camarilla. Eu nunca havia conhecido um Anarquista com tamanho respeito, e por alguma razão ele se afeiçoou a mim, me assumindo como mentor.
Ok, legal...um dia desses eu era eleita para ser caçada e morta, e de uma noite pra outra tenho um senhor de prestígio, sou respeitada dentre os da Camarilla, e até tenho propostas para servir à alguns Xerifes e Algozes. O mundo que eu conhecia estava desabando sem Germain. Eu já sabia que graças à nossa idéia de gerico, agora ele era um dos mais procurados na lista vermelha, ou seja, eu não poderia ir atrás dele nem que quisesse. Lúcio em 2016 foi eleito Justicar Brujah no mundo inteiro, e eu passei a me beneficiar de todo esse status. Decidi ficar com Lúcio. Manteria a pose de boa moça, obedeceria as regras, comportaria-me bem, como sempre fiz em todos os lugares onde passei. E também, como fazia com Germain, por trás dos panos geraria o caos e a desordem, e frustraria os planos de quem quer que fosse. Sim, eu continuaria o que Germain e eu começamos, e seríamos afinal novamente dois, mesmo que isso só existisse em meus sonhos.
Sou a boa moça, sou prestativa, sou decente. Obedeço às regras, meu mentor, meus irmãos. Minha seita.
Causo o caos, a desordem, trapaceio, esvazio contas bancárias pela internet, mato sem permissão, torturo, faço doer.
Meu nome é Hannah Ventura, e agora é assim, pois minha essência sempre pertencerá à anarquia, e ao meu amado Germain.