O ORFANATO DAS ALMAS PERDIDAS
Samanta estava feliz e satisfeita, pois conseguira um emprego depois de um bom período desempregada. O trabalho não era lá grande coisa, mas era o que ela gostava, iria trabalhar em um orfanato cuidando de crianças, que ela imaginava que necessitaria dos seus cuidados. Samanta havia ficado sabendo do emprego, através de uma mulher misteriosa que conversara com ela em uma praça da cidade, em um dia nublado.
O orfanato era em uma área afastada da cidade, cercado por campos, fazendas, criações de animais e tinha uma vizinhança pacata e reservada. Devido ao isolamento do estabelecimento, Samanta cumpriria um turno, em que trabalharia oito dias e folgaria dois. Portanto, na sua nova vida, ela passaria mais tempo com as crianças do que com sua família. Isso era algo que Samanta ainda não sabia, mas ela logo iria pertencer na totalidade ao orfanato.
A jovem e bela Samanta chega em um ônibus, que pára na beira da rodovia. Porém o orfanato ficava em um local em que a jovem teria que andar cerca de um quilômetro para chegar no lugar em que ela encontraria com a freira Izabela. A religiosa a leva para o orfanato, chegando lá Samanta é colocada em seus aposentos e Izabela diz:
-- Após você arrumar as suas coisas, venha que quero te apresentar às crianças e a sua companheira de trabalho. Aqui somos só eu e a dona Iara, portanto temos muitos serviços.
Samanta, então responde a freira:
-- Tudo bem, estou ansiosa para conhecer o estabelecimento e as pessoas que dão vida a ele.
Izabela, com um sorriso estranho no rosto, retruca a colocação de Samanta:
-- Vida? Minha filha, não sei se existe vida aqui.
Tais palavras, deixa a garota com uma grande interrogação, mas ela não diz nada e continua a desfazer as suas malas.
O passado da freira Izabela era desconhecido, ela era uma mulher rígida e que prezava pela disciplina e não suportava brincadeiras, nem mesmo uma leve insinuação. O que para ela representava desrespeito às almas que habitavam aquele estranho lugar.
A freira apresenta dona Iara a Samanta. Iara era uma senhora de semblante triste e que parecia esconder algo sombrio. A jovem percebe um ar estranho naquela senhora de porte físico avantajado e rosto que expressava o medo. Mas Samanta tenta se consolar e pensa consigo mesma que a postura da Iara deveria ser somente respeito com a freira.
Da janela de um dos quartos, Samanta avista um cemitério no quintal do orfanato, ela acha aquilo muito estranho e pergunta à freira:
-- Aquele cemitério pertence ao orfanato?
Izabela, responde:
--Pertence sim, mas deixe esse assunto de lado, sobre o cemitério, você saberá no momento exato.
No final da tarde, Samanta é apresentada às crianças, quando elas se encontravam no refeitório para o jantar. A jovem percebe que todas as crianças tinham um semblante estranho, pareciam que não tinham personalidades. A freira Izabela impunha uma disciplina rígida a todas elas.
Quando as crianças se recolhiam para os seus quartos, tudo isso com uma disciplina militar, uma delas pára em frente Samanta e sussurra em seu ouvido:
--Cuidado com os mortos, eles estão sofrendo.
Tal manifestação fez a jovem se arrepiar, ela não entendeu muito bem o que a criança quis dizer, aquelas palavras despertou uma sensação medonha em seu ser.
Quando Samanta se encontrava em seu leito tentando dormir, o silêncio da noite naquele casarão foi quebrado por um estranho barulho, que parecia de crianças rindo e brincando. A curiosidade da jovem é aguçada e ela se levanta para verificar o que estava ocorrendo. Segurando uma lanterna, ela tenta chegar até o foco do barulho. Então ela se depara em frente a uma porta e percebe que dentro daquele quarto havia crianças brincando. Com um cuidado extremo, Samanta abre a porta, ao apontar a lanterna na escuridão do quarto, ela percebe vultos se movendo rapidamente e como que num passe de mágica, as risadas se transformam em choros de dor e em lamentos. Samanta percebe a janela aberta e ao aproximar-se da mesma ver os vultos adentrando nas sepulturas do misterioso cemitério. Assustada, a jovem tenta retornar depressa para os seus aposentos. Mas, assim que sai do quarto ela percebe aquela figura assustadora parada em pé no corredor. Samanta logo percebe que é a Iara, que olhava fixamente para ela. Depois de algum tempo em silêncio a Iara lhe pergunta:
-- O que houve minha filha?
Samanta, então responde:
-- Eu ouvi um barulho estranho neste quarto e vim verificar.
Que tipo de barulho, indaga Iara.
-- Parecia que algumas crianças brincavam aqui.
Responde Samanta.
Iara, então intervém:
-- Estas malditas crianças, não descansam e nem deixam os vivos descansarem.
Samanta não entende a colocação de Iara e então pergunta:
--Como assim não descansam?
Responde Iara:
-- Não se preocupe minha filha, deixe-as em paz que elas retribuem o sossego a você. Vá dormir que amanhã temos um longo dia com muito trabalho.
A jovem passa a noite em claro, estava muito pensativa e após pensar bastante em seu leito, ela percebe que não estava entendo nada do que acontecia naquele lugar.
No dia seguinte, Samanta vai até ao escritório, isso num momento em que ela sabia que Izabela estava ocupada e Iara estava na cozinha. A jovem descobre os registros dos internos e na primeira oportunidade, ela vai ao cemitério e chega à conclusão que os nomes nas lápides e cruzes, eram os mesmos das crianças internadas no orfanato. Assustada, a jovem retorna ao orfanato e pensa em tirar a sua dúvida com a freira Izabela.
Samanta, naquela mesma tarde, procura a religiosa e relata a ela o que havia descoberto. Izabela se cala por um certo período, mas retorna a conversa e diz a assustada jovem:
-- Samanta, minha filha, não direi nada agora, mas à noite vou até o seu quarto e te chamarei. Então explicarei tudo a você.
O dia transcorre em um intenso suspense para Samanta, ela observa a tarde fria e cinza se dissipar e dar lugar a escuridão da noite ornamentada pelo céu negro, com trovões e relâmpagos que provocam clarões ainda mais assustadores, que temperam o medo da jovem. Samanta se fecha em seu quarto, da janela ela observa por traz de algumas árvores mortas o cemitério das crianças perdidas. Até que o silêncio é quebrado por batidas fortes na porta do seu quarto. A jovem imagina ser a freira que lhe trouxe a tão esperada explicação.
Samanta abre a porta e se surpreende ao ver aquela criança triste parada ali a sua frente. A criança que mais parece um vulto lhe estende a mão e diz:
-- Venha, a bondosa freira quer falar com você nos aposentos dela.
Ao tocar a mão da criança, Samanta percebe o frio medonho que sai do seu corpo. Ao chegar ao quarto da freira Izabela, Samanta tenta sorrir, mas não consegue. A freira então lhe diz:
-- O meu mensageiro vai mostrar a você tudo o que for necessário para você entender o que se passa aqui.
Então, a criança fria abre a janela e rapidamente Samanta é cercada por vários vultos flutuando numa velocidade incrível. A jovem é transportada até o cemitério, seu corpo desaparece nas terras negras daquele lugar. Na manhã seguinte a freira Izabela e a misteriosa Iara, paradas no meio do cemitério, contemplam uma sepultura nova com uma lápide de ardósia escrita, Samanta Imaculada Vieira. A freira Izabela se vira para a Iara e lhe diz:
-- Temos que avisar a ceifeira que é hora de voltar à praça da cidade e conseguir mais uma alma. Logo a cota estará completa Iara, e assim, o mestre nos perdoará. Iara responde a freira:
-- Me sinto um pouco culpada ao ver o desespero nos olhos deles quando percebem que estão de partida. Agora, começa a cota das almas masculinas.