Vultos na neblina

Há uns dias atrás tive de sair bem cedo para acompanhar minha filha até o ponto de ônibus pois ela precisava estar mais cedo na faculdade.

Eram cinco horas da manhã, e como havia chovido na noite anterior acompanhado da chegada de uma frente fria, havia uma neblina bastante intensa por conta disso.

Nesse horário as ruas estão desertas, quase todas as pessoas ainda dormem.

Como já disse, a neblina era densa, dando para se ver a apenas uns metros à frente e outras às costas.

O trecho da caminhada era curto, em no máximo quinze minutos chegamos até o ponto.

Estava bem frio aquela madrugada.

Esperamos uns dez minutos até o ônibus surgir no meio da neblina e enconstar no meio fio.

Entrei rapidamente para colocar a bolsa dela no corredor e saí em seguida.

Nos despedimos com um beijo, o ônibus saiu devagar e sumiu novamente na neblina.

Retomei o caminho de volta. Coloquei as mãos nos bolsos para me proteger do frio.

Enxergava poucos metros à minha frente.

Notei algo estranho. Normalmente os cães latem e avançam quando pessoas passam pela rua, principalmente na madrugada, mas não sei se devido ao frio tudo estava silencioso.

Um silêncio quase assustador,

E havia sim cães nas casas daquela rua.

Caminhei por algum tempo e notei que depois que eu havia passado é que os cães começavam a latir e avançar.

Mas latiam demonstrando medo, e quando avançavam faziam com ódio.

Mas não era minha presença que causava essas atitudes nos cães, mas sim alguém que vinha após mim.

Olhei para trás mas devido à neblina nao consegui ver ninguém.

E os cães continuavam latindo ferozmente.

Por uns instantes parei, para ver se a pessoa se aproximava, mas nada.

Notei porém que a pessoa, ou o que fosse que me acompanhava também havia parado, pois os cães continuavam a latir e a avançar.

Senti um medo e um arrepio, que não era apenas de frio.

Continuei a andar, um pouco mais rápido agora. E para meu desespero, a pessoa ou fosse lá o que fosse também apressou os passos.

Comecei a ouvir passos, e eram mais de uma pessoa a caminhar.

Olhei novamente para trás, porém sem parar de caminhar.

A neblina ainda era densa, mas me pareceu ver uns vultos, caminhando, pareciam duas ou três pessoas.

Continuei a caminhar. A distância que percorri quando fiz o percurso contrário, levando minha filha ao ponto de ônibus parecia bem mais curta.

Aumentei mais ainda minhas passadas. Continuavam a me seguir.

A rua era um declive suave, mas que ajudava muito a caminhada.

Cheguei até uma esquina onde eu deveria virar à esquerda e logo estava em casa. Um alívio preencheu meu ser.

Senti que ainda me acompanhavam pelos latidos dos cães em fúria.

A neblina continuava intensa. Mais alguns metros e estaria em casa.

Minha respiração estava ofegante e meus pulmões estavam no limite.

Enfim, abri o portão de casa e entrei rapidamente.

Eu sabia que iriam passar em frente de minha casa.

Apesar do medo que me dominava e minhas pernas que insistiam em tremer, fiquei ali parado segurando a maçaneta da porta da sala e olhando para a rua.

Os cães latiam, cada vez mais próximos de minha casa.

Por fim a cahorrinha que temos em casa e que fica no quintal, começou a latir e a avançar.

Eles estavam bem ali na frente de minha casa. E senti que ficaram parados ali por alguns minutos.

Consegui sentir eles me olhando, mas a neblina não me deixou vê-los.

Fiquei ali, imóvel, sem conseguir expressar reação.

Aos poucos minha cahorrinha foi parando de avançar e de latir.

Deu uma choramingada e voltou para sua casinha.

Eles haviam ido embora.

Nas próximas casas vizinhas da minha, os cães começavam a latir e a avançar.

Entrei em casa, voltei para minha cama, ainda faltavam uns minutos para meu horário de levantar.

Fiquei ali, pensando na cena singular pela qual havia passado.

Nunca comentei com ninguém sobre isso.

E também nunca consegui entender o que realmente aconteceu.

De uma coisa tenho certeza. Não eram pessoas, pelo menos não pessoas vivas.

Acredito que muitas coisas nunca saberemos com certeza nessa vida.

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 10/05/2011
Reeditado em 10/05/2011
Código do texto: T2960889
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