O Reverso da Moeda [Parte II] Final
A Noite era fresca. Dudu havia ligado pra turma e mandado ir para um rio meio longe da cidade, o vento assobiava baixinho, parecia querer contar que algo terrível iria acontecer ali, desci do carro e sentir um calafrio na espinha, Vi Robertinho fazendo um sinal para que me aproximasse, parecia que o Túlio era o único que não havia chegado.
-Temos que esperar o Túlio - Duda Falou, saindo das sombras e se juntando a nós cautelosamente.
Robertinho assentiu com a cabeça.
A turma se achava meio dividida, eu ainda não entendia o que iria acontecer, naquele momento não tinha qualquer idéia do que os moleques iriam fazer, minha mão tremia um pouco, tentei esconder, todos estavam isolados um dos outros, presos em seus próprios pensamentos.
Quando o Túlio chegou eu sentir um peso enorme me sufocando, todos seguiram em uma mesma direção e fui atrás. Eu nunca esquecerei daquela cena, o Marcio com um saco amarrado na cabeça, as mãos atadas nas costas, o chão desapareceu debaixo dos meus pés, meu amigos não eram mais os mesmos, dei um passo à frente, eu queria evitar o que estava preste a acontecer. O sangue espirrou em meu rosto, eu simplesmente paralisei.
O Robertinho e o Dudu haviam tirado o saco da cabeça do Marcio, e começaram a espancá-lo com barras de ferros, o sangue jorrava do Rosto dele, sua face se deformava a cada pancada que recebia, com tal violência, eu olhei para os olhos do Marcio, ele pedia ajudar silenciosamente e eu não poderia ajudá-lo, não mais. Eu estava do lado dos meus amigos, não era por aquele cara que eu iria mudar.
-MORRA DESGRAÇADO – Robertinho gritava descontrolado.
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Apenas eu e o Fernando ficamos observando, aquela sessão horrenda de brutalidade havia durado alguns minutos, mas, para mim foi uma eternidade, eu nunca imaginei que meus amigos de infância agiriam como animais um dia. Que eu agiria como um animal.
- Pronto galera - ordenou Dudu, com uma cara brutal - sumam com tudo, Fernando e Paulim, vocês vão a pé, até o asfalto, você limpe as marcas de pneus e apaguem suas pegadas, e por favor, só andem na arieia, e peguem algumas vassouras que tá no banco de trás do meu carro, e dar um suavizada no rasto, hein.
Robertinho se abaixou e colocou um capacete de motoqueiro no corpo retorcido do Marcio, uma lagrima desceu pela minha face e eu disfarcei, abaixando para fingir tirar um graveto do tênis.
-Dudu, me ajude aqui, caralho -gritou Robertinho nervoso.
Dudu pegou os pés cheios de sangue do Marcio e Robertinho os braços, e jogaram o corpo no rio, na parte mais funda, o capacete de motoqueiro dava um visual sinistro para o cadáver, eu queria vomitar, mas, o peso no meu estomago não deixava.
- Agora -começou o neto - todos tirem as roupas.
Arregalei os olhos, alem de assassinos viraríamos o que?
- Não se assustem, galera - falou Robertinho já tirando a blusa- Temos que destruir qualquer prova, entenderam? - Robertinho tirou o short ficando apenas de cueca e tênis, todos copiaram seus movimentos.
-Todos, têm sangue na roupa –informou Dudu - mesmo lavando pode ser que achem alguma coisa depois.
Neto foi até a porta-mala do carro do Dudu e pegou saco plástico onde guardou as roupas e queimaria mais tarde em uma mata fechada perto da fazenda do pai do Túlio.
UM Ano Depois...
Varias pessoas foram interrogadas, inclusive Dudu e o Robertinho, nada ficou provado contra eles, a cidade havia se acalmado depois do acontecido.
Uma semana depois da missa de um ano da morte do Marcio, Robertinho sofreu um acidente de moto indo para uma festa em outra cidade com a namorada, mas, por incrível que pareça ele não sofreu nenhum ferimento nem a namorada.
-Cara, vocês tinham que vê, eu fui muito sortudo, tava doido pra chegar na festa e a Briana disse que viu um cara com capacete passando na pista e puxou meu braço - ele tomou fôlego e tomou outro copo de cerveja, todos escutavam com atenção, mas eu e o Fernando trocamos olhares enigmáticos, um cara de capacete?, era muito estranho- aí eu pedir o controle da moto e cair e não machuquei, nem a briana.AI,CARALHO!
- O que foi? - perguntamos em coro
-Nada sentir uma pontada no meu estomago, mas só é as cachaças!
Todos deram risadas e tornaram a prestar atenção no Roberto. Não se passou 10 minutos o Roberto desmaiou, levamos ele pro hospital as pressas. Dois dias depois ele morreu, ele sofreu um rompimento em um órgão interno, e apodreceu por dentro. Foi à primeira vez que chorei na frente de outras pessoas sem vergonha nenhuma, o caixão de Robertinho se destacava na sombria igreja, os bancos se encontravam lotados, a irmã de Robertinho gritava, chorava, os pais estavam inconsolaveis e a namorada estava em casa sedada.
- Porque esta me contado isso? - perguntou um gordo macilento sentado na minha frente.
- Peso na consciência – respondi,sério – foi ficando pior a cada ano.
- O que aconteceu com os outros?
-O Dudu morreu afogado dois meses depois.
Um homem entrou apressado pela porta.
- Seu delegado -chamou o homem,magro e alto, um pouco corcunda e com olhar cansado.
- O que foi?- respondeu grosseiramente - me procure depois, estou ocupado.
Ele tornou a me encarar
-Só estou tentando fazer você entender, que isso virou uma maldição.
-Você quer que eu acredite nisso?
-Sim - falei com simplicidade.
- Ora – o delegado levantou de súbito da sua cadeira e olhou todos os seis homens que se encontrava na sala –Os filhos de vocês estiveram presentes no assassinato daquele jovem e vou provar.
Mas ele não conseguiu, apenas se contentou com a historia daqueles seis homens tristes. Dois dias depois me prenderam na minha casa por ter confessado um crime, um crime que eu cometi e um crime que meu filho cometeu. 30 anos se passaram desde que aquilo tudo aconteceu, 30 anos de peso na consciência, e aquilo virou uma maldição, porque do mesmo modo que meu filho e seus amigos mataram um cara, os filhos de todos que presenciaram o assassinato do Marcio, também se envolveram em assassinatos, e todos da turma, todos aqueles homens daquela noite assumiram a culpa para livrar os filhos da cadeia, eu estou pagando por algo que fiz, um crime sem volta, que me matava a cada dia que se passava, e finalmente confessei, e ao mesmo tempo salvei outro assassino.
MEU FILHO!