LAMENTOS NA TEMPESTADE

Lamentos na Tempestade

O dia estava muito quente. Não havia nenhuma nuvem no céu, que trouxesse esperança de chuva para refrescar um pouco a terra. Já fazia algum tempo que não aparecia uma só gota de chuva e todos esperavam ansiosos por ela.

Anoiteceu. A cidade aos poucos se recolhia para dormir.

Alguns dias antes, Diego e Sophia haviam conseguido comprar sua primeira televisão modelo 14 polegadas, com caixa vermelha e preta- idêntica à do reclame do único semanário da cidade, novidade para aquela época, pois na década de 70, ainda predominava a TV preta e branca.

Diego e Sophia eram um casal simples como a maioria dos casais da cidade. Ele, trabalhador cheio de sonhos, estava muito feliz por ter conseguido comprar sua casa, localizada na região denominada “Cidade Nova” e estar equipando-a, de maneira simples, porém confortável e acolhedora.

Ela, jovem prestimosa, cuidava da casa e no período da tarde era professora do 2º ano primário.

Antes de casar haviam combinado que só teriam um filho quando estivessem estabilizados, pois, Diego desejava que Sophia, ao nascer o bebê, parasse de trabalhar, para se dedicar exclusivamente a casa e ao rebento.

Sophia ficou grávida. A emoção invadiu os corações daquele casal, que aguardavam com alegria e ansiedade a hora da criança nascer.

Arrumaram o quartinho, com muito capricho e bom gosto. O enxoval do bebê foi todo bordado pela futura mamãe.

Chegou o grande dia. Gabriel nasceu belo e perfeito, pesando quase quatro quilos. Muito Calmo. Raramente chorava. Dormia a maior parte do tempo.

Naquela noite, ficaram na varanda da casa, até bem tarde, pois era impossível dormir com tanto calor. Até o pequeno Gabriel, com seus quatro meses de vida, estava impaciente. Sophia, como era de costume, havia dado banho no bebê, e o deixando apenas de fralda.

Nas ruas, viam-se homens, mulheres e crianças passeando. Alguns carros transitavam jovens que se divertiam, com garrafas de refrigerantes bem gelados e também a tradicional cervejinha.

O telefone toca. Era dona Luciana, mãe de Sophia, que morava em outro estado.

Ele está lindo mamãe! É um anjinho. Só vive sorrindo, a senhora precisa ver. Até parece que não tem criança aqui em casa.

Depois de muito bate papo despediram-se, com a promessa de que logo a vovó viria rever o pequeno Gabriel, pois já fazia três meses que não o via.

Gabriel sonolento começou a resmungar, Sophia amamentou-o com carinho, colocando-o no berço, já adormecido.

Era uma cena linda. Diego e Sophia, abraçados, passavam a mão no pequeno filho que dormia.

Como já era quase meia noite, recolheram-se para seus aposentos. O calor era insuportável, porém, vencidos pelo cansaço adormeceram.

Lá fora, o tempo começou a mudar. Nuvens negras cobriam o céu.

O vento sem nenhuma piedade passava como um furacão, derrubando tudo o que tinha pela frente. Só se via as luzes das residências se acendendo, famílias assustadas, procurando proteger-se. Parecia que as casas iam sair voando.

As mães colocavam seus filhos dentro do guarda-roupa ou embaixo da mesa. O barulho lá fora era ensurdecedor, como se um trator estivesse derrubando tudo. Derrepente começou a chuva... O granizo caia, como grandes ovos, quebrando telhas, vidraças e amassando carros.

Que madrugada fatídica! Chovia mais dentro das casas, do que fora. Diego e Sophia corriam de um lado para outro, procurando proteger seus bens materiais. Cobriam sua televisão, afastaram colchões, móveis...

Lá fora só se ouvia o rugido do vento e um barulho da chuva e das pedras que caiam incessantemente. Protegido os móveis, Sophia lembrou-se do filho. Foi em direção ao quarto e, ao chegar, deu um grito, pois todos os vidros estavam estilhaçados e a janela aberta. Correu para o berço... Estava vazio. Num misto de dor e pavor, gritou bem alto:

-Diego, onde você colocou o neném?

E ele, paralisado, sem conseguir falar, balbuciou: Eu não me lembrei de proteger o meu filho...

Abriram a porta e saíram aos gritos, pedindo socorro. O menino havia sumido.

Muitas foram às buscas, porém até o dia de hoje ninguém sabe o paradeiro da criança.

Uns acreditam que ele foi raptado. Outros que ele foi levado pela forte enxurrada. Entretanto a maioria diz que Deus recolheu o pequeno Gabriel para o céu, por ser um anjinho indefeso, e que, cada vez que se forma um temporal, o pequeno Gabriel pede ao Pai do Céu, que sopre as nuvens e o vento para longe da cidade, pois quer proteger seus pais, e todos aqueles que sofrem pelas intempéries da natureza.

Contam os antigos moradores, de que em noites de tempestades, é possível ouvir um choro de criança, e que nesta hora deve-se fazer uma oração pedindo a Deus que proteja seus filhos de todo mal. Assim o choro cessa e a tempestade logo se acalma.

Edina Simionato
Enviado por Edina Simionato em 06/04/2011
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