Os Olhos Azuis de Elise Hoeffner

Aqueles olhos azuis eram os mais belos que já havia visto. Sempre tivera certeza disto, mas agora o sentimento era, se possível, ainda mais arrebatador.

Quando passou por Elise no cais sem se despedir, achou que não teria forças para embarcar. Mas o dever o chamava, e ele era um bom marinheiro.

Era uma bela manhã de sol. O navio sairia às nove em ponto, de Baltimore rumo ao porto de Liverpool, que nessa época ainda não era conhecida como a cidade dos Beatles.

A vida de um oficial da Marinha Mercante americana era agitada. Quando Patrick Yorke escolheu esta como sua profissão, sabia disso. Entretanto, não poderia imaginar que um dia conheceria Elise Hoeffner, filha do Capitão do navio em que navegava, o US Liberty. O primeiro encontro entre os dois havia acontecido um ano antes, durante um jantar promovido pela empresa que contratava os serviços da tripulação do Capitão Hoeffner.

A contragosto, Patrick havia comparecido ao evento, que a seu ver seria apenas mais uma formalidade. Evitava programas deste tipo, mas vez por outra se fazia presente, pelo menos para não deixar a impressão de ser um completo anti-social. Não que não fosse, mas ninguém precisava saber.

Chegara acompanhado de Jefferson Thompson, o Jeff, seu amigo além de ser um dos oficiais de máquinas da tripulação. Sempre que possível, chegavam juntos. Jeff Thompson era extrovertido e aproveitava qualquer oportunidade para estar no centro das atenções, e contando suas piadas a um número cada vez maior de pessoas. Por vezes se tornava inconveniente, mas Pat gostava dele. Havia sido o primeiro a ajudar o jovem oficial Patrick Yorke a se sentir à vontade com o resto dos tripulantes. Ao chegarem ao evento, Jeff logo juntou-se a um grupo que conversava animadamente perto da mesa de frios. Alguns dos homens já visivelmente embriagados, embora o jantar ainda não houvesse sequer sido servido, começavam a falar alto e a causar uma dose de mal estar ao ambiente. Pat preferiu não entrar na roda, e deslocou-se até a grande varanda do salão, para fumar alguns cigarros de seu maço Camel.

“Yorke!”, alguém chamou do outro lado da varanda. Patrick logo reconheceu a voz do Capitão, e dirigiu-se para onde ele se encontrava, cercado de um pequeno grupo de pessoas. “Este é meu garoto, pessoal”, disse Hoeffner com um largo sorriso quando Pat se aproximou. “Como vai, meu jovem? Não esperava te ver por aqui. Sei que não gosta destas coisas.”

“De fato, Capitão. O senhor realmente me conhece como poucos desta tripualção”, respondeu Pat amistosamente,

“Yorke, estas são as mulheres da minha vida”, falou o Capitão Hoeffner enquanto mostrava as duas moças elegantemente trajadas com vestidos longos à sua esquerda. Hoeffner afastou-se com elas e Pat, pedindo licença aos homens com quem conversava. Quando estavam os quatro afastados do grupo, apresentou-os formalmente.

“Esta é minha mulher, Mary.” Patrick cumprimentou-a cordialmente. “E esta bela jovem é minha filha da qual lhe falei, Elise.” A jovem enrubesceu, e Patrick beijou sua delicada mão e olhou-a nos olhos.

No mesmo instante, foi fisgado pela beleza estonteante da moça. O Capitão falava constantemente sobre sua família, em especial sobre Elise, sua única herdeira.

Patrick já havia visto uma ou duas fotos da moça, porém nenhuma fazia jus a sua aparência em pessoa. Sua pele clara e macia como um pêssego, suas maças do rosto altas e rosadas, seus cabelos pretos, e principalmente, seus estonteantes olhos azuis claro eram arrebatadores. Aqueles olhos pareciam olhar diretamente para a alma do jovem mercante, que teve calafrios ao olhá-los intensamente pela primeira vez. O Capitão e sua mulher, percebendo o embaraço dos jovens, sorriram.

“Queridas, este é Patrick Yorke, de quem vocês também já ouviram falar um bocado, não?”, ele disse, ainda sorrindo. “Não sei o que seria de nossas viagens, cargas e descargas sem ele. Um oficial brilhante e um excepcional rapaz, tenham certeza. Coloca todos com as mãos à obra naquele navio, apesar de ser tão jovem.”

“Lionel realmente fala muito de você. Prazer conhecê-lo, meu rapaz. E obrigada por manter o Liberty nos eixos. Se dependesse deste aqui somente, estariam todos perdidos”, disse Mary Hoeffner, no mesmo tom jocoso que o Capitão usava ao fazer alguma de suas brincadeiras.

Pat sorriu timidamente, e por um momento pensou se algum dia soubera que o primeiro nome do Capitão era Lionel. Achava que não.

Após os quatro trocarem alguns olhares, com Elise e Patrick ainda sob a tensão da troca de olhares inicial, Hoeffner mais uma vez quebrou o silêncio.

“Olhe, Mary, os Reuters chegaram. Vamos lhes dar as boas vindas. Tenho um assunto para tratar com aquele velho trapaceiro de pôquer.” Olhou então para a filha e o rapaz. “Porque vocês dois não conversam um pouco para se conhecerem melhor? Nos reunimos em nossa mesa quando o jantar for servido, certo? Yorke, será um prazer se quiser juntar-se a nós. Na verdade, eu insisto para que o faça.”

Sem esperar mais um segundo sequer, o Capitão e sua esposa foram até os Reuters. Porém, Pat ainda teve tempo de ver o velho homem do mar de relance, piscar com um olho para ele.

Não precisa se preocupar, Capitão, ele pensou. No que depender de mim, farei o possível. Ela será minha.

Patrick e Elise conversaram durante toda a noite, e a partir de então iniciaram o romance. A atração inicial não havia sido apenas dele, descobriu. Elise fora cativada pelo sorriso e pela simpatia do marinheiro. Tudo no que ele pensava, era ela, e tudo no que ela pensava, era ele. A cada viagem de Patrick, ele sofria assustadoramente com a falta de sua amada. Elise, por sua vez, raramente deixava a casa da família durante estes períodos. A Sra. Hoeffner foi a primeira a demonstrar sinais de preocupação com a obsessão do casal apaixonado. Comentou com o marido, que não lhe deu atenção. Bobagem, ele disse. Deixe as pobres crianças aproveitarem enquanto há tempo. Ela, então, manteve-se afastada da situação. Mas nem por isso, passou a achá-la normal.

Durante todo este período, o US Liberty navegou somente em cabotagem, ou seja, viagens domésticas nos Estados Unidos. Saber que estava em mares caseiros de alguma forma amenizava o sofrimento de Patrick. Sabia que em alguns dias estaria de volta, e poderia entregar-se totalmente àqueles olhos azuis que penetravam seu corpo e atormentavam seus pensamentos dia e noite.

Em noites claras e estreladas, durante as viagens, Pat e o Capitão Hoeffner iam ao deque do navio fumar, beber e conversar. Isto causava ciúmes em alguns outros tripulantes, mas Patrick não se importava. Apenas uma coisa lhe era importante em todo o mundo.

“O senhor acha, Capitão, que ela realmente sente minha falta?”, ele perguntava constantemente, como se precisando ouvir a afirmação da boca de outra pessoa. O Capitão, invariavelmente, abria seu característico sorriso e respondia, olhando firme nos olhos castanho-claros de Pat.

“É claro, meu filho. Nunca vi aquela garota tão feliz, em toda sua vida. Acredite. Ela conta os dias para que você volte. Veja, nem se preocupa mais com o velho pai!”, dizia. “Minha esposa está inclusive preocupada, de tanto que aquela menina sente saudades suas. Confie em mim, rapaz.”

Esta conversa sempre fazia o jovem se sentir um pouco melhor. Depois ia se deitar. Invariavelmente, em seus sonhos, ele a veria, a sentiria e a tocaria. Não raras vezes, acordou em prantos ao perceber que ela estava na verdade a milhas de distância. Apegava-se aos dias que faltavam para o desembarque, e começava seu dia, após olhar a foto de Elise que levava em sua bagagem.

Jeff desistira, após inúmeras tentativas, de levar a atenção de Pat para outro rumo. Os velhos jogos dos homens do mar não mais o interessavam. Ainda executava suas tarefas competentemente, o que sempre fora sua marca. Porém, além disso, era completamente alheio aos seus companheiros. Era visto acompanhado somente durante suas conversas com o Capitão.

Todos os tripulantes sabiam sobre ele e Elise. A jovem, na verdade, havia sido alvo de cortejos de diversos outros oficiais ao longo do tempo, mas nunca correspondeu a nenhum deles. O próprio Jeff, lembrava com amargura de como havia sido rejeitado sumariamente pela moça. Embora Hoeffner nutrisse respeito e lealdade por todos da tripulação, sua preferência por Yorke fora explícita desde o momento em que o rapaz incorporou. Apesar de ser o mais novo dentre todos, Patrick logo desfrutou de privilégios e cortesias por ser o predileto do Capitão. Agora, parecia -e com grande participação de Hoeffner no processo- ter conquistado a maior jóia da vida daquele Lobo do Mar, o que aumentou o já grande desafeto de grande parte dos tripulantes pelo jovem.

Porém, há duas semanas, o mundo de Pat e Elise virou de cabeça para baixo.

Ao voltar para casa depois de uma visita a Jeff Thompson, que havia estado seriamente gripado durante a semana anterior, Patrick deparou-se com o Capitão parecendo excitado e impaciente em frente ao portão de seu prédio. Quando o homem o avistou, correu em sua direção, completamente exultante.

A empresa contratante de Hoeffner, o convocou para uma nova viagem. Seria a Liverpool, para levar os mais diversos tipos de especiarias americanas, incluindo discos da mais nova moda entres os jovens, o Rock and Roll, especialmente gravações de um sujeito chamado Elvis Presley. Seria uma viagem de Longo Curso, internacional. Hoeffner, embora habilitado a capitanear viagens deste porte, nunca o havia feito. Não pôde esconder sua excitação ao contar a notícia a todos, especialmente a seu fiel marinheiro, Yorke. No entanto, surpreendeu-se com a reação do rapaz. Ao mencionar a viagem, ali mesmo, na calçada ao meio de outros pedestres, os olhos de Pat se arregalaram, e ele ficou vermelho. Seu tom de voz passara a ser claramente exaltado.

“Senhor”, ele disse, “não posso ir a esta viagem! Passaria semanas fora, como ficaria todo este tempo sem Elise?”.

“Ora, rapaz”, começou o Capitão, sério, “o dever lhe chama. Uma das razões pelas quais sempre o desejei para minha filha, era por sua honradez a seus compromissos e lealdade. Como pode vir agora me dizer que não me acompanhará na viagem mais importante de minha carreira?”

As palavras do Capitão pesaram sobre Patrick, e ele não teve o que dizer. Partiriam em quinze dias. Todo o tempo era pouco. Pat destaou a correr Np mesmo instante, deixando o Capitão sozinho.

Ao chegar a seu lar, Hoeffner viu a mulher sentada à mesa da cozinha, sozinha. Ela parecia abatida,e ele perguntou o que havia acontecido, ao que ela respondeu com a voz embargada.

“Patrick esteve aqui”, ela disse olhando firme para ele. “Levou nossa Elise, e não me disseram aonde iriam. Eu disse que algo havia de errado!”, falou, caindo em prantos. “E se eles não voltarem?”

O Capitão soltou um alto suspiro de compreensão,.e abraçou a mulher.

“Ele é um ótimo rapaz. Voltará para a viagem. Não se preocupe, querida.”

E assim acontecera. Dez dias depois, Patrick e Elise voltaram a Baltimore. Não disseram uma só palavra sobre aonde haviam ido, ou o que haviam feito. Simplesmente apareceram, e agiram como se nada houvesse acontecido, na casa dos Hoeffner. O olhar do Capitão para os dois não era mais o mesmo que exibia aquele largo sorriso. Limitou-se a dizer:

“Yorke, daqui a cinco dias, esteja no porto. Sairemos às nove em ponto. Duas horas de antecedência. Agora, vá para casa, e descanse. Parece exausto.”

Pat nem sequer olhou para o capitão. Acompanhou Elise até seu quarto, e saiu de lá alguns minutos depois.

“Não se preocupe, Capitão”, disse, enquanto se dirigia a porta da frente. “Estarei lá. Como sempre estive.”

Este garoto fala a verdade, pensou o velho Hoeffner. Mas ele também percebeu que os olhos do jovem estavam sonhadores e perdidos. Temeu pelo que pudesse acontecer nos próximos dias.

Surpreendentemente para o Capitão, não tiveram mais notícias de Pat nos dias seguintes. No entanto, a bela Elise também pouco se fazia presente na rotina da casa, passando seus dias em seu quarto, praticando bordado e ouvindo ao rádio. A Sra. Hoeffner, preocupada, tentou se aproximar da filha, sem sucesso, assim como o marido. Os grandes olhos azuis da moça tinham o mesmo ar perdido e sonhador dos olhos castanhos do jovem Patrick. A vida na casa dos Hoeffner transcorreu fria, até o dia da partida do US Liberty para Liverpool.

Então, a manhã do embarque finalmente havia chegado. Os Hoeffner levantaram-se cedo, o Capitão com seu entusiasmo pela missão, e sua mulher e filha de coração apertado para verem seus homens partirem. Elas iriam assistir à partida do Liberty, como sempre faziam.

Um carro, mandado pela empresa, foi até a residência da família. O motorista arrumou a bagagem no parta-malas, e eles partiram. Às sete e meia, chegaram ao cais do porto. Aos poucos a tripulação chegava e passava pelos três, cumprimentando-os, com Hoeffner recepcionando a todos. Porém, nenhum sinal de Patrick Yorke, até quinze para as nove.

O Capitão começara a ficar impaciente. Fazer uma viagem como aquela pela primeira vez sem o homem que desfrutava de sua máxima confiança, era certamente algo que não estava em seus planos. Quando o jovem apareceu, andando devagar com sua bagagem, o Capitão soltou um suspiro de alívio.

“Vamos, Yorke, embarque imediato!”

Pat não se deu o trabalho de apressar o passo. Continuou no mesmo andar sonolento. Hoeffner decidiu relevar. Afinal, ele havia ao menos aparecido.

Toda a tripulação estava embarcada. O cais estava repleto de mulheres e crianças, a esperar pela partida dos pais de maridos para Inglaterra, em uma viagem que totalizaria com a estada em Liverpool, por volta de dois meses.

Patrick passou pelos Hoeffner sem sequer dirigir o olhar à Elise. Simplesmente, falou:

“Desculpe pelo atraso, Capitão”, e continuou seu caminho ao Liberty. Hoffner olhou para a filha, que tampouco se mostrava surpresa pela indiferença do rapaz. Despediu-se mais uma vez das duas, e seguiu atrás de Patrick, falando em seu ouvido, enquanto passava por ele.

“Conversaremos hoje à noite no deque, garoto.”, e então seguiu na frente do jovem oficial.

Com todos a bordo, o navio zarpou. Todos no convés acenando o último adeus a seus familiares no cais, antes da aguardada primeira viagem para fora dos EUA do US Liberty.

Por mais que tentasse cumprir a promessa que ele e Elise haviam feito em seus últimos instantes no quarto dos fundos na casa dos Heoffner, depois dos dez dias mais intensos de suas vidas, ele não pôde evitar. Olhou, ao longe, aquela bela moça, e percebeu que ela também olhava para ele, através dos mais belos olhos azuis que já se tivera notícia.

Parou de olhar para o cais apenas quando ele não passava de um ponto borrado ao fundo de sua visão. Retirou-se para o pequeno quarto que dividiria com Jeff durante a viagem. Cumprimentou-o e a mais alguns velhos amigos, e pela primeira vez em muito tempo, ao menos tentou parecer que não estava com a cabeça totalmente voltada para Elise. Apenas tentou, pois sua mente por dentro fervilhava como nunca, pensando sobre o tempo que passaria sem sentir sua pele macia e ver seus olhos encarando-o dentro de sua alma.

O dia transcorreu de forma aparentemente normal. Apenas aparentemente, pois dentro de si, Patrick Yorke havia tomado uma decisão.

À noite, após o jantar ser servido à tripulação, o Capitão se dirigiu ao deque, onde havia convocado Pat para conversarem sob a luz da lua, que brilhava naquela noite estrelada.

Quando subiu até lá, Patrick estava sozinho, encarando a escuridão.

“Uma bela noite, rapaz, não?”, disse o Capitão ao se aproximar.

Pat olhou para ele de soslaio, e respondeu:

“Realmente é, Capitão.”

“Ainda pensando em minha filha, Yorke?”, disse Hoeffner, amistosamente.

“Teria como não, senhor?”, respondeu seriamente o jovem. “Ela é tudo para mim. Não vivo mais sem aqueles olhos. Sinto-me fraco sem eles. O senhor não sabe como foi difícil passar por ela no cais e não olhá-la.”

“Por que não despediu-se de Elise ao passar por ela, meu filho?”

“Porque, senhor”, disse Pat soluçando. “No momento em que eu o fizesse, me tornaria incapaz de subir a bordo. Mas agora, vejo que melhor seria se eu o tivesse feito.”

“Não diga isto, meu jovem. Fez a coisa certa. Orgulho-me de você por estar aqui.”

Patrick destinou um sorriso triste ao Capitão.

“Agora vamos descer e comer alguma coisa. A viagem que nos espera é longa, não quero meu homens mal alimentados”, falou mais uma vez Hoeffner, com o sorriso largo e bonachão,voltando à sua face.

“Em um segundo, senhor. Pode ir, me dê apenas mais um momento.”

“Como quiser.”

Após dar as costas a Patrick, Hoeffner parou, e olhou para trás. Ele tinha mais algumas coisas a falar.

“Sobre os dias em que você Elise passaram fora, pouco me importo. Apenas quero dizer que o amor e promessas que fizeram, foram muito importantes para minha filha. Ela voltou diferente. Sonhadora, de algum modo. Parecia vinda de um conto de fadas.” O homem velho e barbado, parecia realmente tocado pelas palavras que dizia. “Não a desaponte.”

O Capitão, então, desceu para jantar com o resto dos tripulantes.

FINAL I

Pat suspirou.

Pensou em voltar atrás de sua decisão, mas decidiu mantê-la. Fizera uma promessa a si mesmo, e a cumpriria. A sensação que experimentara ao viver intensamente ao lado de sua paixão, fora a mesmo tempo maravilhosa e dilaceradora.

Cada vez que a encontrava, era quase impossível deixá-la partir. Quando não a via, porém, a sensação angustiante o afligia a todo segundo. Tê-la o consumia, não tê-la o destruía.

Quando teve certeza de não haver mais ninguém por perto, ele foi até um amontoado de caixas no depósito. Pegou uma que estava no fundo do aposento empoeirado. Levou-a para fora no deque, amarrada a uma corda. Após levar a pesada carga até onde ele estivera antes, amarrou-a também a seu pé esquerdo. Certificou-se de que estava firme.

Olhou para cima, contemplando mais uma vez o brilho da lua cheia prateada, e sentindo o vento da noite tocar seu rosto como uma suave pena de ganso.

Que agora eu encontre o brilho dos seus olhos na eternidade, Elise. Patrick Yorke debruçou-se sobre a borda do navio, e se jogou ao mar da noite, onde encontrou seu fim na imensidão azul.

FINAL II

Pat suspirou.

Teria de ser forte durante os meses seguintes. Seria. Ao voltar, sabia que apesar de tudo, Elise estaria esperando por ele. Sentiu-se forte naquele momento. Pronto para o que quer que o esperasse.

Bem, menos para o que de fato aconteceria.

Quando se preparava para descer para o jantar, ouviu passos atrás de si. Era Jeff.

“Jeff, meu amigo; já serviu-se do jantar? Estou indo para lá agora mesmo.”

“Na verdade ainda não, Pat. Estava esperando por você.”

“Bem, então vamos descer. Está frio aqui em cima.”

“Ainda não. Vamos conversar um pouco. Sei que está sendo difícil para você estar aqui agora”,disse Jeff, a ainda alguns bons passos de Patrick. “Conquistou a mulher que a tripulação quase inteira um dia cortejou. Afastar-se dela assim deve ser realmente difícil.”

“Não havia o que ser feito, meu amigo. Mas estou começando a pensar seriamente em largar essa profissão quando a viagem terminar. Meu alento é de que provavelmente será a última, o que me dá forças para chegar até o final sem Elise”, respondeu Pat, abrindo um sorriso cansado.

“O Capitão vai ficar desapontado quando seu queridinho desistir. Não apenas o queridinho; seu amado genro! Mas em uma coisa você está completamente certo, Yorke.”

“O que seria, Jeff?”, disse Patrick levantando uma sobrancelha.

“Essa foi a última vez que embarcou em um navio”, Jeff Thompson respondeu enquanto sacava a pistola com silenciador, e disparava em seu companheiro, que caiu no chão imediatamente.

Thompson se aproximou do corpo caído no deque, já sem vida. Olhou para ele estatelado, com um misto de sensações. Ergueu-o, e jogou-o ao mar.

Encontre seu fim na imensidão azul. Azul como os olhos dela, ele disse em voz baixa.

Dylan Jokerman
Enviado por Dylan Jokerman em 19/03/2011
Reeditado em 06/07/2011
Código do texto: T2858917
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