Carcará e o Diabo

Pessoal essa história é baseado num fato real, (segundo meu tio), mudando apenas o nome da ave e o final, mas a parte do comboio é verdade... desculpas pelos erros de portugues, pois não corrigi o texto.

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Carcará morava com a mulher e os filhos em um pequeno serrote. A casa era grande e boa, toda rodeada de alpendres, ainda havia um pequeno estábulo com uns burros bons que ele tinha. Carcará tinha a burra mais veloz do lugar, Judith era o nome do animal, apostava corrida contra qualquer cavalo de fazendeiro sem medo de perder. Raimundo era seu “jóquei”. Nessa época a bodega do Carcará era famosa, ele sempre fazia festas, serestas e quadrilhas juninas.

Certo dia chegou à casa de Carcará um fazendeiro rico, vinha montado em um cavalo branco, ele disse:

- Quem é o caboclo que tem a burra Judith? Um tal de Carcará?

- Sou eu mesmo! Posso saber quem quer saber? Quem quer saber de minha burra?

-Sou o coronel Pontes Costa. Eu sou dono da fazenda Boa Esperança. A fama da sua burra está correndo o mundo meu amigo e eu não poderia deixar de vir aqui testar o meu alazão contra ela, mas primeiro, desce um copo de cachaça.

O velho fazendeiro desceu do cavalo e o outro rapaz que vinha atrás dele em outro cavalo marrom claro, segurou o animal para o velho. O coronel foi em direção a pequena janelinha de madeira, já carcomida pelo tempo. Notou que a bodega era muito sortida, viu também que o homem tinha daquele lado do alpendre muita coisa estocada, notou grandes sacas de carvão, muita palha para fazer chapéu e três grandes tambores que ele deveria guardar feijão. Por sob a janelinha, o coronel Pontes notou um grave defeito na pintura. A parede que era toda azul, mas naquele pedaço em particular, tinha a tinta era toda borrada, meio preta, parecia que algum tipo de solvente ou ácido tinha sido passado ali de propósito. A dose de cachaça já o estava aguardando sobre o balcão, o velho retirou o chapéu e passou a mão no copo, virou de uma vez na boca. O liquido quente desceu rasgando-lhe a garganta, uma pequena careta brotou em seu rosto, deu logo uma cuspida na parede. Agora ele entendia o motivo do borrado na parede.

Carcará olhou aquele velho, tomando cachaça no seu botequim. “Coronel Pontes Costa”, ele pensou, “eu vou ganhar o seu dinheiro”. Cortou um limão em quatro pedaços e deu para o homem tirar o gosto, o velho agradeceu com um sorriso e começou a chupar o limão por entre o grande bigode branco.

- Pois é seu Carcará, a fama da sua burra corre o mundo. Vem ver se a bicha é boa mesmo, se ganhar do meu cavalo, com João montado nele, aliás, animal nenhum ganha desse cavalo com João montado nele. – disse o coronel.

- Então vamos empatar, pois nunca ganharam de Judith com o Raimundo montado nela. – respondeu Carcará com um sorriso.

Combinaram a aposta, foi muito dinheiro. Foi ajeitar a burra, junto com Raimundo. Colocaram o cabeção e a sela em uma esteira apenas. Dado algum tempo os dois cavaleiros estavam em suas respectivas montarias, o belo cavalo tinha o homem que veio com o coronel em cima dele e a burra com Raimundo nela. A largada foi dada, com um tiro de macaca. Os animais começaram a correr, o alazão pulou na frente, mas a burra corria como o vento e no final da reta da corrida de vaquejada a burra ultrapassou o cavalo do fazendeiro.

- Olhe seu Carcará, sua burra é boa mesma. – disse João.

- Obrigado. – foi tudo o que o homem respondeu.

O coronel saiu se maldizendo, pois tinha certeza que a burra não ganharia do seu cavalo alazão. Carcará apenas sorria, com o bolso cheio de dinheiro.

Nisso se passaram algumas semanas, tudo corria normalmente, até que outro homem montado em um cavalo preto chegou à famigerada bodega.

- Carcará, sai para fora danado, sai que hoje tu irá perder uma corrida. – gritou o homem de cima do cavalo.

Carcará ouviu aquela voz, potente como um trovão, um arrepio percorreu-lhe a espinha. Levantou-se e apareceu na porta da casa.

- Quem me chama? Quem é que diz tamanha calunia. – disse com voz firme.

-Eu me chamo Lúcio e vim desafiar a burra Judith, pois é hoje que ela perderá seu legado e você seu juízo. – disse o homem da voz de trovão.

- Pois seu Lúcio, hoje Judith não correrá, pois o meu corredor, o Raimundo não está. Ele foi para a cidade, mas Lúcio não se deixou abater e disse:

- Você está com medo Alexandre? Não tem coragem de correr? É um medroso! – e começou a gargalhar.

Carcará sentiu outro arrepio na espinha, como aquele homem sabia seu nome? Certamente ouvira alguém falando por ai, mas ninguém o chamava pelo nome. Ele disse:

- Eu mesmo correrei com você.

O homem se limitou a sorrir. Carcará entrou em casa para pegar os arreios da burra, sua mulher ainda tentou falar com ele:

- Meu filho não faça isso.

- To fumando numa quenga mulher! Sai daqui.

Ele pegou todo o material necessário para ajeitar Judith. Correu para o estábulo e ajeitou o animal. Depois montado na burra foi para a pista.

Lúcio já estava lá esperando por ele, o cavalo negro brilhava ao sol, estava impaciente, mas era um animal lindo.

- Está preparado homem?

- Mais preparado do que você imagina. O que vamos apostar?

- Dinheiro, quanto você quiser, mas acima de tudo se eu ganhar, você perderá sua honra e sua sanidade.

Carcará era esperto, mas não entendeu o que o homem quis dizer. Deram a largada na corrida, o cavalo do homem era muito rápido e a burra não agüentou o peso do seu cavaleiro e acabou sendo derrotada. Para acabar de completar o azar do nosso “anti-herói”, a burra ainda teve uma pequena fratura na perna, devido o peso.

O homem do cavalo negro saiu sorrindo, ficou esperando pelo derrotado na porta da bodega.

Carcará vinha muito chateado, pois teria que sacrificar sua burra e ainda perderia muito dinheiro. Acertado o pagamento, o homem foi embora. A raiva que Alexandre sentia era enorme, ligou à velha radiola e abriu um litro de cachaça. Tomou três doses seguidas e mais uma terça. Foi matar a burra. Pegou um machado e saiu.

O pobre animal estava deitado com a pata quebrada. O homem chegou meio embriagado com o machado nas mãos e disse:

- Sua maldita, você tinha que perder essa corrida. Vá para o inferno e o satanás pode levar você e esses burros miseráveis.

Desceu o machado na cabeça do pobre animal, que após três pancadas, estava morto.

Passou algum tempo até que o cachorro da casa dele aparecesse morto, uma semana depois o primeiro burro morreu três dias mais tarde, outro burro esperou uma semana e todas as ovelhas da família dele apareceram mortas e, finalmente, o ultimo burro apareceu morto. Carcará não sabia o que fazer, via sua vida afundando, seus animais morrendo, sua bodega começava a decair, ele até tentou fazer uma seresta para tentar ganhar algum dinheiro, mas no mesmo dia, na cidade teve uma festa com um famoso sanfoneiro e ninguém foi na seresta e ele acabou tendo um prejuízo enorme. Depois de algum tempo a mulher dele não agüentou a pressão e fugiu de casa com outro homem, deixando o marido e os filhos.

A vida de Alexandre Carcará foi decaindo pouco a pouco. Até que um determinado dia, ele ficou louco de vez. Estava em casa sozinho com os filhos. No meio e sua loucura, ele resolveu que iria matar as crianças. Pegou o mais novo e o prendeu dentro da bodega, foi no quarto da menina que brincava com suas bonecas e com o mesmo machado que tinha matado a burra ele rachou a cabeça da pequena, que morreu na hora. Depois ele voltou na bodega e abrindo todas as garrafas de querosene ascendeu uma vela. Com o passar do tempo o vapor do querosene encheu o ambiente e ao encontrar a vela acesa incendiou tudo, queimando a bodega e o filho dele.

Carcará resolveu se matar. Pegou uma corda e amarrou na linha principal do telhado da sua casa. Cortou os pulsos e se dependurou na corda, ficou agonizando por alguns momentos e morreu. Os vizinhos ao verem as labaredas de fogo no pequeno comércio ainda tentaram ajudar, mas era tarde demais.

Os vizinhos disseram que um pequeno comboio passou na estrada, por volta da meia noite daquele dia, pouco antes da tragédia. O som das burras e o estridente tiro de macaca foi ouvido, mas em determinada hora pode-se ouvir alguém dizendo:

- Vamos Carcará, está na hora.

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Leiam os contos de Fernando Calixto, o novo Cavaleiro do Apocalipse.

João Murillo
Enviado por João Murillo em 05/01/2011
Reeditado em 05/01/2011
Código do texto: T2711704
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