Noite de natal

A semana foi corrida e agitada.

Sentado das três da tarde até quase onde horas da noite, dentro daquela roupa vermelha e quente. Insuportavelmente quente.

A barba coçava, incomodava.

A fila de crianças parecia não terminar.

Meninos, meninas, meninos, meninas.....

Todas pedindo, pedindo.

Umas só de ver dava para perceber que mereciam era uma bela surra.

Poucas eram meigas e que realmente mereciam um presente do Bom Velhinho, caso ele existisse.

E geralmente essas boazinhas eram as que não receberiam nada, pois eram pobres demais para isso.

Pobres como ele sempre foi. Essa semana era uma das piores.

Depressão. Raiva. Lembranças do passado.

De um passado que ele queria esquecer.

Mas a necessidade era maior, e esse era um meio de aumentar as rendas para pelo menos amenizar um pouco a pobreza de sua casa.

A pior parte era ter de manter um sorriso e agradar as crianças.

Mas esse ano estava sendo ainda pior.

Talvez fosse a perda de sua mãe no meio do ano, vítima de uma simples doença, que poderia ter sido curada, caso tivessem um plano de saúde.

Mas não tinham, e desse modo ela faleceu em um corredor de hospital público.

As luzem piscavam, o brilho das vitrines, a alegria das pessoas...

Nada disso o animava.

Todo dia, lá estava ele, com sua roupa vermelha.

Antes de voltar para casa, fazia ponto nos bares de plantão.

Bebia e bebia. Chegava em casa quase amanhecendo já.

Se jogava na cama e ali ficava semi desmaiado até lá pelas 12 horas.

Se levantava, tomava banho e já is se aprontando para voltar ao martírio.

Vivia sozinho, pois sua esposa o deixou levando seus filhos para o outro lado da cidade.

Ela não suportou mais viver com um homem infeliz, bêbado e que a espancava, e espancava os filhos.

Mas esse ano seria diferente. Seria.

Dia 24. Lojas lotadas. Vai ser duro o trabalho.

Crianças que acreditam no Papai Noel.

Outras não mais.

Ele nunca acreditou. O único pai que teve nunca lhe deu presentes.

Na verdade nunca esteve presente. Nunca o conheceu.

No final do expediente, ganhou alguns presentes.

Recebeu seu salário. Foi para a casa.

Mas antes bebeu muito.

Sozinho em casa. Ainda com a roupa de papai noel.

Ainda com a barba postiça.

Sua vida passa diante de seus olhos.

Ele chora muito. Sente uma dor dilacerar seu coração.

Sua mente já não está mais nas suas faculdades perfeitas.

Sua dor aumenta a cada minuto. Se torna insuportável.

Ele sente seu coração se apertando. Falta lhe o ar.

Mas de repente um alívio. Uma paz. A dor não existe mais.

Tudo está branco. A paz.

Só o vermelho que ele vê é a sua roupa que não está mais quente.

E um fio de sangue vermelho que escorre de seu pulso.

Se misturando ao vermelho da roupa de Papai Noel.

Esse ano seus filhos não receberão os presentes miseráveis que ele sempre ofereceu.

Esse ano vai ser diferente...

Feliz Natal !?!?!?!?!?

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 17/12/2010
Código do texto: T2677332
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