O CEMITÉRIO: ENTROU... FUDEU!!!
Comentário do autor: Dedico este conto a minha amiga Zeni, que adora estórias de cemitério e me sugeriu este tema. Um grande abraço e obrigado pelo carinho.
Subúrbio de Londres, tempos atuais.
Párias da sociedade! Era a melhor forma de descrevê-los. Os dois amigos andavam juntos há muito tempo, eram assassinos procurados, viviam a margem da sociedade, só saiam à noite e ao amanhecer tinham que se esconder do jeito que desse para não serem pegos ou reconhecidos. Eram tempos difíceis para eles, não havia muitos lugares que pudessem descansar em paz.
Já estavam caminhando a noite toda, nas costas, sacos atulhados denunciavam que vinham de mais uma investida criminosa bem sucedida. Precisavam se esconder com urgência, e o velho cemitério com o qual se depararam parecia ter vindo a calhar.
- Veja Tiago, nem me lembrava deste cemitério. É enorme e um dos mais antigos de Londres. Aqui ninguém irá nos encontrar.
- Nem pensar. Você sabe que eu odeio cemitérios – falou Tiago enquanto fazia uma careta de repúdio – Além do mais, você sabe muito bem o que aconteceu da última vez que entramos em um deles. Coisas estranhas podem acontecer...
- Não me faça rir, um assassino como você com medo de um velho cemitério cheio de cadáveres?
- Simão, você sabe muito bem que não é dos cadáveres que tenho medo...
- É eu sei realmente, mas então me diga: já estamos no meio da madrugada e não conhecemos o terreno direito, qual a alternativa que vossa infinita sapiência indica?
Diante do silêncio de Tiago, Simão atirou seu saco para o outro lado do muro e com agilidade surpreendente escalou a parede, ato que foi em seguida imitado por seu contrariado amigo.
O interior do cemitério era realmente sinistro, o aspecto de abandono era evidente a julgar pela evidente liberdade com a qual ervas daninha aumentavam seu território, expandindo-se por sobre as lápides antigas. Um ar gélido e uma névoa densa completavam o quadro macabro.
- Simão, isto não esta me cheirando bem, acho melhor irmos embora. Não escuto barulho algum, este silêncio não é normal...
- Não fale bobagens Tiago, estamos dentro de um cemitério abandonado no meio da noite. O que você esperava? Os cadáveres rindo e conversando, sentados em seus túmulos jogando truco?
- Não sei como você consegue fazer piada numa hora destas, é sério Simão, estou com um mau pressentimento.
- Há.. vá comer alguma coisa que seu mal deve ser fome... – disse Simão enquanto arrombava a porta de um grande mausoléu – Pronto. Perfeito! Aqui ninguém vai nos incomodar, podemos comer alguma coisa e descansar em paz – completou ele enquanto sentava num canto e retirava algo do saco para se alimentar.
Ficaram sentados próximos um ao outro, engolfados na mais completa escuridão que só era aplacada por tênues fachos da lua cheia que reinava imponente no céu.
Enquanto levava mais uma porção do seu suado alimento até a boca, Tiago perguntou:
- Simão, você se arrepende de ser como é?
- Sinceramente, não. Cada um tem a sua sina, só lamento é esta condição que vivemos atualmente, estas roupas esfarrapadas, nos escondendo como ratos. Tenho saudade dos tempos de riqueza, em que era respeitado e vivia livremente. E você, se arrepende?
- Sim. O destino foi cruel comigo, mas acho que o motivo pelo qual tomamos este caminho não importa, o fato é que matamos muita gente. Acho que é por isso que estamos nesta situação, estamos pagando nossos pecados. Estou cansado de tudo isso, não tenho mais pretensões na vida. Tudo que peço é o mínimo de comida para sobreviver e um pouco de paz. Tenho esperanças que Deus um dia perdoe minha alma.
O som de vozes distantes quebrou o silêncio da noite e interrompeu a conversa, os dois se olharam preocupados e se esgueiraram com cuidado até a porta do mausoléu.
- Que barulho foi esse? – sussurrou Tiago.
- Calma, devem ser apenas alguns jovens bêbados querendo se divertir, já vimos isto antes.
Em silêncio, continuaram a observar pela fresta da porta entreaberta. Com espanto, verificaram um estranho ritual ter início: eram em torno de vinte pessoas encapuzadas, entoavam um cântico numa língua ininteligível. Claramente estavam procurando uma sepultura em especial, e logo que a encontraram começaram a cavar até retirar um corpo que parecia estar vestido de preto. A única figura que destoava do restante era uma mulher de branco que estava amarrada e tentava em vão se libertar.
- Jovens bêbados uma ova, que porra é esta Simão?
- Eu já tinha ouvido falar disso, mas não acreditava que fosse verdade. Acho que são adoradores do diabo, parece que vão oferecer a mulher em sacrifício para tentar ressuscitar alguém...
- Eu falei que estava com um mau pressentimento. E agora? E se eles nos virem?
- Calma, vamos ficar quietos que eles vão embora.
- Mas e se eles vierem até aqui? Se nos descobrirem?
- Sei lá... não tenho respostas para tudo. Se eles vierem a gente pensa no que fazer. Não somos nenhuma mocinha indefesa como aquela pobre coitada...
- Meu Deus, eu só queria um pouco de paz.
- Cala a boca! Você só sabe reclamar e se queixar da vida!!! – gritou Simão perdendo a paciência com o amigo.
- Não.... olhe o que você fez... eles nos ouviram... estão vindo pra cá... e agora, o que vamos fazer?
- Ora, que pergunta idiota Tiago... Vamos matar todos eles, afinal ainda somos dois vampiros poderosos.
- Meu Deus Simão, eu disse que estava com um mau pressentimento... eu só queria um pouco de paz esta noite... você nunca mais vai me convencer que cemitério ainda é um lugar que podemos descansar em paz – reclamou Tiago enquanto seus dentes cresciam ao se preparar para dizimar aqueles incautos humanos adoradores do diabo.
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