Tripas e sonhos
Estava um frio incomum para aquela época do ano. Já eram 10 horas da noite e eu dirigia meu carro por horas sem ver nenhum sinal de vida. A única visão era a de galhos secos e tortos dando uma aparência fatasmagórica à estrada escura, e que tinha como trilha sonora os pios sinistros que vinham da mata.
Meus olhos já estavam pesados e os pés inchados e doloridos. Já estava certo de que o mapa que seguia não me levaria a lugar nenhum. Procurei um lugar para passar a noite, quando de repente vi um vulto a minha frente. Era um homem que pedia carona. Parei o carro e desci, mas não vi ninguém, apenas senti um calafrio intenso e um embrulho no estômago. Voltei ao carro e continuei a dirigir.
Encontrei um hotel à beira da estrada, que parecia aconchegante apesar da aparência de velho e da tinta desbotada nas paredes. Estacionei o carro, e me dirigi a entrada escura e empoeirada. Bati numa pequena campainha sobre o balcão, mas por um momento ninguém atendeu ao meu chamado. Continuei batendo. O lugar tinha um cheiro de azedo e uma aparência lúgubre. Senti então uma mão gelada sobre meu ombro, e por pouco não molhei as calças. Ao meu lado estava um sujeito idoso e franzino, pálido e de voz rouca que disse trabalhar no hotel. Dei um sorriso amarelado e meio sem jeito. Ele me entregou a chave do quarto e desejou uma noite agradável.
Entrei no quarto, e a visão que tive não era das melhores: baratas andavam sobre a cama e ratos se equilibravam na janela. O cansaço me venceu e cai sobre a cama num sono pesado. No meio da noite acordei suado e assustado, bebi um pouco de água e sentei na cama. Comecei a escutar um gemido que vinha do outro quarto. Lenvatei-me e na ponta dos pés sai do quarto. Caminhei até o outro quarto e olhei pela fechadura, mas nada pude ver por causa da escuridão. Decidi voltar ao meu sono quando senti algo que escorria por baixo da porta. Toquei com os dedos e cheirei, era sangue. Corri ofegante ao meu quarto e tranquei a porta. Ouvi um grito de dor profunda ecoando pelo corredor, que foi cortado pelo uivo sinistro de um cachorro. Peguei uma lanterna e decidi entrar naquele quarto, senti o sangue grudando na sola do sapato. quando entrei no banheiro vomitei de horror ao ver o sujeito que me atendeu sujo de sangue devorando a cabeça de um homem cujo corpo estava esquartejado. Gritei e sai correndo para fora do hotel e vi que meu carro tinha sumido. O suor tomava conta do meu corpo. Vi o sujeito na porta do hotel com uma serra-elétrica nas mãos. Corri pelo descampado escuro, sem rumo e cheio de pavor. Meu pensamento era apenas de fugir de um final trágico e sangrento. Eu corria pela vegetação seca mas sempre parecia retornar para o mesmo lugar. Minha cabeça estava girando e já não tinha mais orientação nenhuma. Cai em banco de areia onde corpos mutilados arrastavam-se em minha direção com murmúrios indecifravéis. Um deles segurou meu o pé e com uma mordida arrancou 2 dedos. Gritei de dor e me levantei. Estava agora no meio de uma mata seca e envolto por alcatéia de 15 lobos de olhos vermelhos e brilhantes. Tentei correr mas fui derrubado, e logo servi de jantar. Eu era devorado e continuava vivo e consciente. Sentia cada pedaço de carne sendo arrancado de mim. No fim não passava de um corpo mutilado largado ao tempo. Acordei e gritei de medo quando vi que sobre meu corpo se arrastavam milhares de larvas de moscas que acabavam com as sobras deixadas pelos lobos. Um urubu aproximou-se e com uma bicada arrancou um de meus olhos. O sujeito com a serra-elétrica olhou na minha face e abaixou o seu instrumento de morte. Senti o metal me partir a cabeça ao meio, e um líquido purulento escorria pela ferida. Fechei os olho e desejei que fosse o fim.
Quando acordei estava em uma sala de hospital com uma máscara de oxigênio. O médico aproximou-se e disse que eu tinha sofrido um acidente grave de carro após ter saído embriagado de uma festa. Chorei de felicidade, por constatar que tudo não passou de um sonho. O médico voltou e disse que alguém queria me ver, e que ele tinha me socorrido na estrada. Olhei e na entrada da porta estava o sujeito pálido do hotel. Não resisti, tive uma parada cardíaca e a escuridão tomou conta de tudo. Finalmente o fim chegou.