David Hell

A súbita ascenção de um reles cantor de happy hour para mega star em menos de um ano era algo que chamava a atenção de toda a mídia.

Algo que era inexplicável.

Sua música era uma mistureba de rock com todo tipo de música, passando pelo lírico e até erudito, mas algo que me intrigava era os trechos falados em latim e declamados com uma voz gutural que parecia não ser a dele e sim de um demônio saido das profundezas do inferno.

Viajei muitos quilômetros para assisitir a um show dele e tentar desvendar o mistério.

E além do mais isso renderia uma ótima matéria na revista onde eu escrevia.

O difícil seria ele aceitar marcar uma entrevista.

Dia do show. Casa lotada. Idade média do público: dezesseis a vinte e cinco anos.

A maioria de classe média.

A princípio não consegui marcar nada com seus assessores. Nada de entrevistas.

Todos acomodados. David Hell, esse era seu nome artístico nunca teve banda de abertura, somente ele e sua banda no palco, sempre.

Muitas luzes e fumaça num mega show.

Ele entra no palco. Delírio na platéia.

Permaneci em um canto, meio fora daquela massa de jovens delirantes.

Notei alguma pessoas estranhas circulando, achei que fossem seguranças, mas vi que não eram.

Homens bem altos vestidos de negro com a pele bronzeada e uma expressão do mal no rosto. Circulavam como se não fossem notados, ma verdade eu mesmo ora os via e depois desapareciam.

David Hell era carismático. Interagia com o público.

O ápice do show eram os trechos falados em latim.

A voz gutural arrepiava, causava medo e espanto.

Esqueci de comentar que estudei um bom tempo em um colégio de padres e o latim era ensinado, e sendo assim, talvez eu fosse um dos poucos, se não o único a entender o que era falado nesses trechos.

Meu medo aumentou muito quando eu entendi o que ele falava após pedir aos jovens que repetissem com ele, o que faziam entusiasticamente.

Inocentemente sem saber o que diziam eles ofereciam suas almas ao diabo, num pacto

real e válido.

Meu corpo se arrepiou por inteiro quando notei que aqueles homens que achei serem sa segurança na verdade eram anjos, anjos com grandes asas negras que assinalavam cada jovem após ele ter feito o pacto.

Olhei para o palco, David Hell parecia estar em transe, com as mãos erguidas com o sinal do demonio, ou o que muitos pensar ser o simbolo do rock.

Seus olhos estavam revirados deixando apenas o branco exposto.

Assustador. Medonho. E aquela voz, não, não era ele falando.

De repente ele abre os olhos, e me encontra.

E continua a falar em latim:

- Você é o único aqui que entende Latim. Te espero no camarim após o show.

Não tenha medo, você quer uma matéria, terá a matéria.

Fiquei paralisado por alguns minutos.

O show continuou ainda por umas duas horas.

Após isso, um dos seguranças me procurou e me encaminhou até o camarim.

Ele estava lá, de costas para a porta.

Me cumprimentou sem olhar para mim. Continuou de costa, me peidu para sentar.

Me disse que todo sucesso tem um preço. Às vezes um pouco alto.

Falou sobre seus fracassos como cantor e como pessoa até o dia em que por brincadeira, invocou os poderes das trevas.

No mesmo dia um homem negro, muito bem vestido o procurou dizendo que tinha uma proposta para ele.

Daria todo sucesso que ele procurava, dinheiro, mulheres, fama e tudo mais que ele quisesse.

Em troca, sua alma e a alma de outras pessoas.

Não acreditando na proposta, ele aceitou e assinou um contrato.

Naquela noite teve um sonho, ou pesadelo, onde ele se via no inferno e o Deus das Trevas passava a ele todas as intruções e modo de agir.

Acordou apavorado e com a triste certeza de que havia feito um pacto real com o demônio.

A partir daí todos conheciam a história. E a cada show muitas almas eram entregues ao demônio através do pacto feito em latim que ninguém sabia o que significavam, apenas repetiam e diziam sim no final, entregando suas almas.

Eu não queria acreditar, mas era real.

E ele terminou a entrevista me dizendo:

- Essa é a verdade, a dura verdade. Pode escrever exatamente como te contei.

Mas, acredita mesmo que no século vinte e um, alguém em sã consciência acreditará no que acabei de te contar?

- Você queria a matéria? Agora a tem....E fez bem em não repetir as palavras.

Fiquei calado o tempo todo, só ouvindo.

E senti um arrependiento na sua voz.

Nem tanto pela sua alma, mas por ele ter de levar tantas almas junto com a dele.

Saí, voltei para minha cidade.

Quando o editor da revista me questionou sobre a tal entrevista com David Hell, simplesmente disse que não consegui o ingresso.

Afinal ninguém iria acreditar mesmo.

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 12/11/2010
Código do texto: T2610978
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