POBRE CRIATURA

A pobre criatura

A pobre criatura não conseguia lembrar-se de muita coisa; tudo era muito confuso e a realidade misturava-se com a solidão, com o medo, a escuridão e o infindo frio que a envolvia. Contudo da mínima remessa de lembranças que ainda resistiam, duas coisas não lhe fugiam à consciência: O calor amável gerado por quem a conduzira àquele lugar sombrio e a fragrância suave, fraterna e envolvente de seu carrasco. Sim! A delicadeza e amabilidade do odor perdido era o que mais lhe doía e com pequenos soluços inicialmente expressava a saudade involuntária que lhe corrompia.

A pouca luz que conhecera ocultara-se, somente tudo que no momento possuía era a escuridão opaca e o eco sinistro da solidão de seus soluços rítmicos e deformados, estes tão distantes e carregados de infelicidade que mesmo o mais cruel dos homens ou dos deuses seria incapaz de aflição não sentir. Entre os gemidos de incapacidade, a escuridão realizava seu trabalho inerente e indelével, proporcionando gradativamente à pobre criatura a perplexidade da incapacidade e da falta de direcionamento lógico; logo a confusão tornar-se-ia principio único, e a incapaz criatura, aos poucos não saberia sequer de sua própria existência. Contudo mesmo corrompida pela confusão, uma chama simples de esperança suavizava esporadicamente seus soluços e através daquele cheiro suave que não esquecia acalmava-se e, lentamente, extasiada pela paz desta lembrança, adormecia; entretanto ao adormecer algo lhe despertava em calafrios cortantes proporcionado por um furioso fogo gelado.

O frio, conduzido por seu principio natural, realizava com pertinência sua função determinada pelos séculos e, aos poucos, deformava entre calafrios e espasmos a frágil figura da nua criatura. Em qualquer direção, ali estava o frio cortante, inexorável; onipresente como um deus da morte. A dor: a conseqüência da situação, tornava-se quase insuportáveis. Logo o frio, a dor, a saudade do cheiro amável perdido, forçava-o correr, fugir, explodindo-o numa ferocidade de gritos e movimentos.

Inócuo : este era o resultado das ações e pretensões. Não podia mexer-se, tão quanto podia gritar; perdera as forças, estas aos poucos eram absorvidas pelo frio, a escuridão, pela solidão; muito mais.

Suavemente e do mesmo modo como desejava sorrir, a pobre criatura, sem aperceber, conduzida pela saudade do cheiro e do calor, assim como a saudade se esvaecia, singelamente imitava-lhe a vida. Pela escuridão, pelo frio, pelo medo, pela falta de sentidos, mas muito mais pela saudade do cheiro a criatura esvaecia. uma forte fadiga tomou-lhe o espírito, talvez causada pelas tentativas vãs de fuga e grito, talvez por motivo lógico, ou talvez pelo vento da morte; não sabia; adormecia.

Bruscamente despertou, toda a escuridão estremeceu, a singela criatura foi arremessada contra uma flácida parede fria repleta de sombras, o medo encorajou-a e entre fortes gritos de desespero; logo...Calou-se. Um rosnado imenso inundou a solidão escura, que logo se encheu com latidos de imensurável intensidade. O terror abraçou o espírito da imóvel criatura que entre desesperados gritos pedia clemência e paz; pedia o cheiro e o calor.

-Sai. Passa Maldito. O que temos aí?

Acima; novamente, a luz, a singela criatura viu! Lembrou-se do cheiro e chorou, chorou como nunca.

- Deus! Deus! É uma criança! Uma Criança dentro desta caixa! Deus! Socorro ajudem!

Os gritos de desespero nada amenizavam a saudade do cheiro e o calor das mãos que ali a singela criatura puseram; jamais amenizaria, contudo outras quentes mãos, fragrantes existem; ela conheceria. Muitas vezes pararia de chorar, talvez sorriria. Sim! Sorriria.

J V I C T O R

Por meio de uma denúncia via 190, policiais militares do 3º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (3º BPMM) encontraram, por volta das 22h42 desta quinta-feira, um bebê do sexo masculino, com aproximadamente um dia de vida. A criança estava na dentro de uma caixa de papelão na rua Costa Aguiar, no Ipiranga, em São Paulo.

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A criança foi socorrida ao Pronto Socorro Ipiranga, onde permanece internada em observação médica, e passa bem.

Dados apresentados no 17ºDP, onde foi elaborado o Boletim de Ocorrência de Abandono de Incapaz.

http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0%2C%2COI2678661-EI5030%2C00-Bebe%20de%20dia%20de%20vida%20e%20achado%20em%20caixa%20de%20papelao.html

http://contosjvictor.blogspot.com/

J V I C T O R
Enviado por J V I C T O R em 08/08/2010
Reeditado em 08/11/2010
Código do texto: T2425450
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