O QUE VEM COM A NOITE? Parte II

– O que houve? – gritou Felipe aos pés da escada.

Virei-me para ele com os olhos lacrimejando, mas antes que eu respondesse a indagação ouvi um gemido vindo da sacada. A pergunta de Felipe ficou sem resposta, pois me aprecei em direção a sacada e lá estava Jonas encolhido deitado no chão. Sua roupa estava rasgada e sua pele marcada por vários arranhões, ele gemia baixinho e ficava sussurrando palavras incompreensíveis. Felipe chegou logo em seguida.

– Me ajude a levá-lo para dentro – pedi a Felipe.

Nós o carregamos para dentro com muito cuidado, Tífane e Fred estavam aos pés da escada estarrecidos com o estado de Jonas.

– O que houve – indagou Tífane com as mãos no rosto, em estado alarmado.

– Não sabemos ainda – respondeu Felipe – traga um cobertor Fred.

Sentamos Jonas em um sofá e o cobrimos com cobertor. Ele olhou para cada um de forma assustadora, depois começou a apontar para cada um de nós dizendo:

– Eles querem você..., você... e você! – finalizou apontando para mim.

Todos se afastaram estarrecidos, não parecia ser o Jonas falando, aqueles seres pareciam estar usando sua boca para falar, o tom de voz era ameaçador, como se ele nos odiasse. Depois baixou a cabeça e continuou gemendo. Voltei a me aproximar dele e perguntei:

– O que houve lá em cima Jonas? O que fizeram com você?

A pergunta ficou sem resposta, um silencio profundo tomou conta do ambiente, um vento forte entrou pela porta da sacada fazendo-a bater com força assustando a todos. Fred correu para fechar a porta e eu repeti a pergunta colocando a mão no ombro de Jonas que se contraiu com a dor. Ele deu uma risada sinistra:

– Enquanto dormíamos Alicia me chamou, eu sabia que não era ela, sabia que eram eles, mas mesmo assim eu fui, queria vê-la de novo. Caminhei até a porta da sacada e ela continuou me chamando, olhei pela janela e ela estava lá sentada ao pé daquele carvalho, sorrindo e brincando com a sombra da árvore, que aprecia estar viva. “Você está me vendo” ela gritou, eu fiz um sinal positivo e ela disse “nós também estamos te vendo”. De repente ela estava na sacada com as mãos no vidro da janela, “por que não vem aqui fora?” eu afastei da janela fazendo um sinal negativo com a cabeça, ela pareceu se irritar e disse “então nos convide para entrar, estão todos aqui comigo e querem todos vocês perto deles”.

Jonas fez uma pausa olhando para nós. Tífane sentou-se no chão e começou a chorar, Fred que estava escorado no corrimão da escada após fechar a porta sentou-se num degrau, Felipe começou a coçar a cabeça dando voltas pela sala e eu me sentei ao lado de Jonas esperando que ele prosseguisse:

– Ela estava sempre sorrindo – prosseguiu ele após nos observar por algum tempo – começou a arranhar o vidro sussurrando palavras que pareciam brotar direto em meus ouvidos “essas portas não vão protegê-los para sempre, então porque não as abre de uma vez e nos deixa entrar”. Depois ela começou a chorar implorando para eu deixá-la entrar, eu levei a mão na maçaneta e abri a porta devagar.

Comecei a sentir que estavam ao meu lado, um toque frio e macio, depois senti minha pele sendo rasgada. Eu estava paralisado e não conseguia nem gritar, enquanto a dor tomava conta do meu corpo aquilo que havia assumido a forma de minha irmã segurou-se pela mão e começou a me conduzir para fora, onde senti mais toques e dores em várias parte do corpo. Faziam-me sangrar e pareciam se deliciar com isso. Mas senti um calor em meio a todo aquele frio, o sol começava a nascer e me deixaram em paz voltando para seu refúgio nas sombras.

– Como eles eram? Demônios, fantasmas? Tinham asas, chifres? – perguntou Tífane sobressaltada.

Jonas lançou novamente aquele olhar assustador para todos nós e se deteve em Tífane:

– Não sei dizer, eu os via ao mesmo tempo em que não os via, a forma não parecia nada com que se pudesse comparar, quando tento lembrar várias formas e imagens me vem à cabeça como se fossem algo e nada ao mesmo tempo. Não são nada que nossas lendas e mitos possam classificar, pois acredito que são seres que não deveriam existir, mas mesmo assim existem.

As palavras de Jonas me encheram de maiores temores, pois ele não parecia falar idéias vindas de sua cabeça, a impressão que dava era que sussurravam em seu ouvido o que deveria dizer. Que seres inomináveis seriam esses, inclassificáveis pela mente humana? Que segredos escondiam esse vale, talvez houvéssemos invadido domínios proibidos ao homem. Um velho tio meu costumava me contar estórias sobre lugares que escondiam segredos muito mais antigos do que a raça humana, e que vez ou outro poderíamos nos deparar com esses lugares e não havia mais como voltar.

Mas aquele lugar não parecia ser um desses que meu tio falava. Quando Junior escolheu esse vale para acamparmos ele pesquisou na internet, várias pessoas o visitavam no verão para pescar e acampar. Porém Jonas sentiu alguma coisa assim que pisamos aqui, e eu só fui perceber tarde demais, não havia vida, sem pássaros, sem insetos, os repelentes nunca foram usados, sem peixes, não pescamos nada. Tudo era um perfeito silêncio, como se qualquer ser vivo se negasse a adentrar esses domínios, e os únicos tolos a fazerem isso fomos nós.

Getúlio Costa
Enviado por Getúlio Costa em 03/08/2010
Código do texto: T2415719
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