condenados a morte

Era uma noite clara de lua cheia e Alber estava sentado em uma poltrona roxa de encosto grande e acolchoado. As luzes da casa estavam todas apagadas, exceto pelo pequeno abajur no criado mudo, ao lado da poltrona.

Seu semblante era triste, mas não havia lágrimas em seus olhos.

Suas mãos estavam cobertas por sangue, igualmente a suas roupas. Ele olhava fixamente para o chão. No chão uma faca manchada de vermelho, e ao lado da faca um cadáver de mulher.

- O que fez Alber? –disse uma voz em sua cabeça.

- Não tive a intenção, ela era tão bonita...

Alber levantou-se e ficou de frente ao corpo e o empurrou com o pé:

- Ela não se mexe, por que ela não se mexe?

- Por sua causa Alber, por sua causa... – disse-lhe a voz da sua cabeça.

Ele então ajoelhou-se ao lado do corpo, pegou a faca e a olhou, então fez um corte em um de seus braços e começou a gritar:

- Olha Madaleine, olha, também sangro, e meu sangue é igual ao seu!

Foi quando lhe disse a voz em sua cabeça:

- Madaleine, não é ela que está ai...

- Claro que é ela, olha os cabelos loiros, olha o vestido de noiva do nosso casamento de hoje!

O corpo era de uma mulher de cabelos morenos, estava vestida de calça jeans e camiseta branca. E no crachá ensangüentado que estava em seu peito estava escrito: Helena Maria Silva - agente de pesquisas. CENTRO DE ESTATÍSTICAS E PESQUISA.

- Agora Madaleine e eu ficaremos juntos. Disseram que ela tinha me abandonado, mas ela voltou para mim, voltou para mim.

Então a casa em que estava foi cercada pela policia. Até cinco quarteirões à distância podiam-se ouvir o som das sirenes dos seis carros que cercavam a casa.

- Ouça o barulho dos sinos da igreja, o barulho! Vieram para o nosso casamento Madaleine, vieram todos!

- Não Alber, não são seus convidados, é hora de você pagar pelo que fez. – novamente lhe disse a voz em sua cabeça.

A polícia invadiu a casa, os dois primeiros policiais que entraram, ficaram chocados com o que viram: aproximadamente cinqüenta corpos deixados em fileiras de dez, espalhados pelo chão. A maioria em estado avançado de decomposição e, na frente deles, Alber com o cadáver de Helena nos braços.

Na hora em que era levado pela viatura, ele gritava:

- Devolvam-me Madaleine, devolvam-me!

Na delegacia os delegados conversavam:

- Veja, eram todos aqueles que haviam sumido nos últimos meses. Como alguém pode fazer algo assim? Amontoar corpos na sala de casa.

- Aqui a ficha dele. – disse o outro delegado.

- Deixe-me ver. Alber Mello Nogueira, cirurgião cardíaco conceituado, pediu demissão após ser abandonado por sua noiva no dia do seu casamento, isso há um ano. Foi encontrado um mês depois numa ponte, tentando se matar. Começou um tratamento psiquiátrico, mas depois de dois meses foi considerado curado.

Na cela em frente aos delegados estava Alber, que não parava de dizer:

- Estão todos aqui, estão todos aqui. Me ajudem. Querem me matar, querem me matar...

Os delegados viam aquilo e comentavam “coitado”, mas não viam o que Alber podia ver.

Na cela, junto a Alber, ele via todas as pessoas que ele havia matado. Diziam que ele ia se arrepender eternamente do que fez.

O tribunal o considerou mentalmente incapacitado. Prisão perpétua no manicômio municipal.

Tudo isso aconteceu há um ano, e até hoje Alber fica pedindo por ajuda na sua cela acolchoada.

Ele fica numa ala isolada dos outros, pois seus gritos de terror são tão agonizantes, que os outros internos piram ainda mais ao ouvi-los.

***

- Por que me contou a história dele Danilo? Você sabe que o turno da noite é meu.

- Calma novato, ele é só mais um louco dos muitos que temos aqui. Agora vai lá, e cuidado com os fantasmas!

Esses eram Danilo e Israel, funcionários do manicômio municipal “João Teixeira Nascimento” onde há um ano estava internado Alber, ex-cirurgião, acusado de ter cometido cinqüenta e um assassinatos em um momento de loucura.

Israel andava por aquele corredor silencioso. Era seu turno da noite. Estava lá para pagar sua faculdade de biologia, queria explorar o mundo e descobrir novas espécies de plantas e animais.

Que cara mais perturbador esse Alber, vou levar a comida dele e sair logo da cela, odeio esse lugar. – pensava Israel empurrando o carrinho com o jantar dos internos.

Chegando em frente à cela de Alber, olhou pelo acrílico da porta, e lá estava ele, no canto gritando:

- Vão me matar, vão me matar!

- Cala a boca seu maluco. – falou Israel virando-se para pegar o prato.

E quando retornou o olhar ao acrílico, levou um susto, pois encostado lá estava Alber olhando para ele.

- Que susto! Parou de gritar foi?

- Vão te matar, vão te matar... – disse Alber para Israel soltando uma risada.

O quê? - foi o que pensou Israel antes de virar e se deparar com um cadáver em decomposição a sua frente.

- A Hora da Morte começa agora! – disse o cadáver.

E o grito de Israel se dispersou na noite, juntamente com os gritos de todo o manicômio.