Quiromania para a Condessa Erzsébet
A minha vida chegou ao fim no momento em que a noite terminou.
Uma mulher, uma sombra passageira disfarçada de musa, depois de ninfa, depois sereia, deusa, vício, maldição e tortura, transpôs a minha existência e roubou a essência do meu ser.
Transformou em rosa dilacerada o cego apaixonado. Em restos putrefatos o inocente sonhador.
Não fez caso da existência conjunta construída à custa de palavras, sussurros, gemidos, gritos e silêncios.
No buraco vazio onde outrora ardia o meu coração, por ela, restou apenas o som áspero de dentes dilacerando sentimentos. Cortou a jugular da minh’alma quando desprezou as noites de luxúria em que bebia incansavelmente a minha seiva. Eu a saciava dando o que ela queria e ela queria sempre mais.
Julgava-a perfeita – pobre tolo que era – a companheira ideal por nunca alterar-se com o tempo, permanecendo sempre bela, jovial, faminta e sedutora, e não levei em conta que eu é quem mudara. Uma noite, sorrindo o seu sorriso diabólico, olhando o seu olhar malicioso, falando suas falas encantadas, me acusou de haver secado por dentro, fazendo-me duro, insípido, gélido.
Não a interessava mais, de qualquer modo.
Partiu. Da minha vida.
Partiu. O meu coração.
A lua bem que tentara me avisar, mas eu era surdo e não entendia que a paixão só existe nas pinturas dos poetas. E que um amor como o meu – tão gigantesco, brutal e raro – só ocorre a uma pessoa em cada geração, nunca com duas, pois toda a matéria-prima amorosa faltante no Universo encontrava-se supercondensada em mim.
E este amor, esta dor, foi a herança e a maldição que ela me deixou.
Logo, só me resta suplicar para que o vazio me absorva por completo antes que em vingança eu mate milhões, explodindo de prazer bestial tal qual a minha algoz o fez, gozando a minha morte. Que a minha última visão seja o seu corpo nu e seus esbugalhados olhos vermelhos, o sussurro de seu nome entre os meus lábios e seu pescoço em espasmos entre as minhas mãos.
(texto escrito em 16.07.2010 em www.jefferson.blog.br)