A EMPREITADA
A empreitada
Já havia passado alguns dias depois do mutirão, Zé do brejo ainda não tinha arrumado outro serviço aguardando o dedo melhorar. Suas economias eram muito poucas e obrigou-o a procurar outro serviço, Ficou sabendo que o coronel Ludugero, um grande latifundiário no município do Cavalo Queimado, tinha uma empreitada pra fazer numa de suas fazendas. Zé do Brejo procurou dois companheiros de sua confiança: Zé da Onça e o fala Mansa que eram respeitado em qualquer serviço e acostumado a trabalharem juntos.
Os três companheiros foram até a fazenda do Coronel Ludugero em busca do serviço. Ao aproximar da sede ficaram encantados com tanta beleza; Na chegada da sede que ficava na margem esquerda da rodovia GO4, tinha um mata-burro, uma casinha muito bonita protegendo uma bela placa com o seguinte letreiro: SEJA BEMVINDO AO ELDORADO. Seguimos subindo por um corredor de palmeira real que dava acesso até a sede que ficava numa parte elevada de onde se tinha uma visão esplendida da bela represa e de uma grande parte de pastagem da fazenda coberta por dezenas de arvore de ipê roxo e amarelo tomado de flores transformando aquele ambiente num magnífico cartão postal. A casa era enorme, com varandas por todos os lados, vários armadores de redes, um belo jardim na frente em forma de um coração e dentro do coração uma estrela simbolizando a bandeira de Israel. Mais tarde ficamos sabendo que o coronel Ludugero era descendente de judeu. Do lado esquerdo tinha um pomar com várias espécies de frutas de onde avistava o curral e o galpão onde os peões guardavam as selas e o maquinário agrícola.
Quando os três companheiros chegaram à sede avistaram o coronel sentado numa cadeira de balanço com um cachimbo na boca. – bom dia patrão disse Zé do Brejo tomando a iniciativa. – bom dia respondeu Coronel após soltar uma boa tragada de fumaça do seu charuto. Posso saber qual motivo trouxe vocês aqui na minha fazenda?- Sim doutor... Respondeu Zé. Nós viemos aqui por que ficamos sabendo que o senhor tem uma boa empreitada para fazer. - Tenho sim, respondeu o coronel. Eu tenho uma mata para brocar e derrubar no fundo da minha fazenda, distante 40 KM. Daqui. - quanto a distancia não vejo nenhum problema doutor... Se combinarmos no preço e o doutor comprar um bom rancho e nos levar até lá, fazemos o serviço do jeito que o doutor exigir e só voltamos quando terminar a empreita.
Depois de tudo acertado, o coronel comprou o necessário para fazer o serviço, colocou tudo na sua caminhonete L.200 e mandou o seu capataz ir deixá-los no centro da mata, onde os três rapazes deveriam trabalhar por um longo tempo. Eles viajaram 20 kilômetros em uma estrada carroçal no meio da fazenda, com um corredor que dava acesso as mangas de pastagem formadas, todas bem divididas e numeradas nas cancelas, que saiam do corredor. Depois que terminou a pastagem, entramos na mata virgem e viajamos por mais 15 kilômetros até chegarmos ao rancho no local da empreita. Era um ranchinho muito simples de pau a pique, coberto com sapé e um fogão a lenha, improvisado por caçadores que pernoitaram por lá. Depois que alojamos nossos pertences no rancho, o capataz nos mostrou o local da empreitada e voltou para sede da fazenda.
Eu já havia trabalhado com os meus companheiros em outras empreitas, sabia que Fala Mansa era um cabra muito medroso... Mas não tanto... Somente agora fui descobrir que ele tinha medo até da própria sombra. Para encurtar a conversa, quando limpamos as proximidades do barraco encontramos uma catacumba velha. Esta sepultura era tudo que ele não queria ver naquele lugar sinistro e deserto. Logo que começou escurecer ele ascendeu logo uma grande fogueira na frente do rancho para espantar assombração e o perigo de algum animal selvagem que quisesse encostar-se ao rancho. – Fala Mansa sentindo um mau pressentimento, comentou com seus companheiros: Olha, Não estou gostando nada desse fim de mundo aqui. É muito deserto e sem recurso. Disse demonstrando um ar de preocupado. Este lugar chega me dar arrepios. É muito longe de casa e tem muito animal selvagem nesta mata virgem. – Zé da onça que tinha esse apelido por que já havia matado uma onça de facão, respondeu sorrindo para o companheiro medroso. Qualquer onça que se meter à besta e aparecer por aqui, eu vou botar um cabresto nela, vou domá-la que nem um gatinho de estimação. Ainda vou tirar o leite dela pra você beber. - Zé do Brejo que não queria se passar por medroso, disse também: eu já fui até arrastado por uma onça pintada até sua toca onde estavam os seus filhotes e ainda consegui escapar com vida. – se eu ver uma onça, eu morro muito antes dela me pega, respondeu Fala mansa.
Já havia se passado mais de 30 dias que os três companheiros estavam trabalhando no centro da mata sem ir à cidade. O capataz da fazenda, todo final de semana ia conferir o serviço para ver se estava sendo feito como foi combinado. Nada de anormal havia acontecido até aquele dia. Eles estavam se fartando na carne de caça. Tinha uma enorme quantidade de tatu, veado, capivaras, cateto, etc. Todas as noites era um barulho danado de pássaros, capelão, esturros de onças, de lobos, mas, ainda não tínhamos avistado nenhuma de perto. Mas o pior ainda estava para acontecer. Foi numa sexta feira 13 de agosto. - Fala Mansa que alem de medroso era muito supersticioso. - Falou logo de manhã com os companheiros. Hoje não é bom a gente trabalhar por que é dia de azar. - Zé da onça deu uma gargalhada e respondeu: superstição é coisa de medroso nós vamos trabalhar dobrados. Temos que terminar logo esta empreita para irmos embora. Os três afiaram as ferramentas e foram para o trabalho. Quando já estava quase escurecendo, Zé da onça teve a infelicidade de ser picado por uma cobra cascavel que já estava com o bote armado somente esperando a presa. Imediatamente a sua vista se escureceu e os dois companheiros tiveram muito trabalho para chegar com ele até o barraco. Sem remédio para cortar o veneno, rapidamente ele se espalhou em toda corrente sanguínea e começou a sair sangue pelos poros, levando-o a óbito.
Zé do Brejo, muito triste e preocupado com o corpo do companheiro, chamou Fala Mansa e lhe perguntou. - Você quer ficar aqui com o defunto, ou você vai até à fazenda do Coronel buscar socorro? Para ser bem sincero com você, eu nem vou e nem fico. Eu não tenho coragem de ficar sozinho aqui com o defunto nem pra ganhar todo o dinheiro do mundo e também não tenho coragem de enfrentar essa mata virgem, infetada de tanto bicho selvagem. – Eu não quero morrer nesse fim de mundo também. – Então o que você sugere Fala Mansa? – Olha Zé, nós dois passamos o restante da noite aqui com o defunto e amanhã bem cedinho eu vou à sede da fazenda chamar o gerente pra vir buscar o corpo do nosso companheiro. Os dois companheiros decidiram esperar o dia amanhecer. As três camas que eles dormiam foram improvisadas no começo do serviço. Era de forquilhas com varão e apenas um colchonete por cima. Colocaram o defunto na cama dele, ascenderam uma fogueira no meio do rancho e cada um deitou na sua cama para descansar um pouco. Mas, os cabelos do medroso foram arrepiando, o queixo começou a tremer e o medo foi apertando tanto que ele não agüentou e foi se deitar na cama junto com seu companheiro e cobriu até a cabeça para não ver o defunto. – Só que Zé do Brejo não gostou de ficar imprensado naquela cama estreita ouvido barulho de dente rangendo que nem queixada e resolveu aprontar com ele naquela noite tenebrosa. – Zé esperou apenas que seu parceiro dormisse. Pegou o defunto colocou junto com ele e foi deitar na cama do falecido. A fogueira já estava só nas brasas, o dia já estava próximo de amanhecer. – Zé disse consigo mesmo. Já está na hora. Começou a imitar o barulho de assombração para acordar seu companheiro e percebeu que ele havia levantado a coberta só um pouquinho para ver o que estava acontecendo. Nesta hora Zé sentou na cama com o corpo duro, espichou os dois braços e deu mais um gemido. - Fala Mansa, muito apavorado agarrou o defunto com as duas mãos gritando... Zé!!!, Zé!!!, Zé!!!, Acorda depressa que o defunto ta sentado. – Mas nada do Zé acordar. Quando ele percebeu que o corpo que imaginava ser do Zé estava gelado saiu correndo e gritando: socorro, socorro, socorro meu Deus... O Zé também morreu, agora só falta eu... – sem olhar para traz, pegou a estrada e antes do meio dia já havia percorrido os 40 kilômetros e chegado à sede da fazenda do coronel.
Depois de ter ouvido toda história que o pião contou Imediatamente o capataz pegou a caminhonete e foi buscar os corpos dos dois trabalhadores que Fala Mansa acreditava estar mortos. Quando chegaram ao rancho avistaram Zé do Brejo sentado na sua cama velando o companheiro. – O capataz sem entender o que havia acontecido perguntou para o medroso. – Você não disse que os dois estavam mortos? – E estavam mortos sim... – O corpo do Zé estava gelado e duro. Ele deve ter ressuscitado ou então é o fantasma dele que ta sentado naquela cama. Na volta pra sede da fazenda, Zé contou ao capataz como tudo aconteceu. Disse que não queria deixar o defunto sozinho e pensou que este seria o jeito mais fácil do medroso ir buscar socorro o mais rápido possível. – Só que Fala Mansa nunca mais perdoou o Zé pelo medo que passou. Na estrada ele teve até que lavar a calça num riacho que havia sujado toda de merda.