Vultos
Eles sempre me acompanharam.
Quando criança achava que eram sombras.
Nada de mais. Me lembro que estavam sempre por perto.
O tempo foi passando, elas foram se multiplicando.
Começaram a emitir sons.
A principio não conseguia decifar.
Mas depois, entendia o que queria dizer.
Fizeram parte de minha vida.
Ao meu lado, indo e vindo.
Às vezes sumiam. Dias. Meses.
Mas voltavam, um após o outro.
Diziam que tinham outros trabalhos.
Outras tarefas.
Mas nunca me explicaram.
Também não me interessei.
Uma noite acordei, estavam todos lá.
Todos eles. Me olhando.
Sussurando. Murmurando.
Não conseguia entender o que falavam.
Mas senti que não era bom.
De repente um arrepio.
Uma sensação indescritível.
Seu corpo sendo usado como um invólucro.
Me vi saindo do corpo e assumindo a forma de um vulto.
Negro. Sem vida. Um boneco.
Vi meu corpo se movimentando. Caminhando.
Tentei impedir, me seguraram.
Disseram que tinha de ser assim.
Que eu havia autorizado.
Fiquei ali em companhia do testante.
Todos em pé, em círculo.
O tempo passando. Tic tac tic tac.
Vi quando eu voltei e me sentei na cama.
Aspecto dopado. Olhar perdido.
Depois dessa vez muitas outras mais.
A mesma sensçaõ de torpor, medo, ansiedade.
Onde eu ia, o que fazia?
Impossível saber.
Os vultos agora não iam mais embora.
Revezavam invadindo e usando meu corpo.
Eu ficava inerte, nada podia fazer.
Os vulros me dominaram.
Meses se passaram.
Um dia a campainha toca,
Policiais. Uma intimação.
Uma suspeita. Crimes.
Os vultos. Eram eles.
Não eu. Mas que provam eu tinha?
Era eu sem ser eu.
Meu corpo apenas.
Voltaram logo que os policiais sairam.
Me olhavam.
Me disseram que tinha a solução.
Me tornar um vulto, como eles.
Usar outros corpos.
Não. Não, nunca.
Contei minha história.
Ninguém acreditou.
hoje vivo nesse manicômio imundo.
Vagando pelos corredores.
Os vultos ainda me visitam.
E as mortes .....?
Bem, aqui acontecem com menos frequência.