Bodas da morte
 
Há quase 400 anos que a família Merzari era proprietária do casarão situado na entrada do lugarejo, e por herança moravam nele Cecília, e sua família.
A decoração era sóbria com muitas peças antigas e quadros de muitas gerações anteriores a sua, em um dos lados da grande sala o retrato de uma matriarca de séculos passados foi conservada onde sempre esteve, ao lado da escada de acesso ao andar superior do casarão.
O detalhe é que a semelhança de Cecília com a mulher do retrato era evidente, mas sempre tiveram por conta do parentesco este, porém.
Cecília contava com 38 anos, passara a vida entre aquelas paredes e se contasse a alguém que nunca viu nada de anormal ali, estaria mentindo e sabia disso.
Houve tempos em que encontrou abertas janelas que havia fechado gatos estranhos e morcego a transitar pelo interior do casarão, mas há uns 10 anos ela começou a ter visões com freqüência, mas uma em especial ela via desde que seus olhos pela primeira vez dirigiu-se para aquela pracinha em frente ao casarão.
A noite arrastava-se em seu início, chuvosa e com uma leve neblina, Cecília encostou uma cadeira a janela de seu quarto, desceu o queixo sobre os braços postos embaixo, e ao alongar o olhar em direção a pracinha, viu um homem que a contornou até a metade, e depois passando ao meio dela, parou por instantes com um pequeno pacote na mão, olhou-a e depois desapareceu ao final dela.
Cecília tinha nada mais que 7 anos e desde então em noites de neblina a mesma cena se repete a pelo menos 3 décadas.
Nunca teve a oportunidade de alcançar o misterioso homem, pois cada vez que tentou, ao chegar à rua nada mais via.
O objeto de espanto de Cecília não afetava outros, pois só aparecia a ela, e aí estava mais uma razão porque o seu pobre cérebro definhava, pois ao tentar explicar aos outros o seu drama era desacreditada por conta da sua exclusividade na visão do estranho ser.
Um longo sobretudo negro, com uma alta cartola e também calças negras, e o embrulho na mão, era desde os antigos tempos a vestimenta do homem dos dias de neblina.
Cecília tinha mais 4 irmãos e os pais, neste tempo: Os irmãos casados e os país falecidos.
Nos serões da sua infância a beira da escadaria do casarão ouvia histórias contadas pela sua mãe sobre os retratos espalhados pela sala.
A história passada de geração a geração, contava que a matriarca sob o qual retrato ficavam, morreu há muitos séculos, mas tinha uma história de amor que todos gostavam de ouvir.
Contam que ela fora enamorada de um jovem cadete do exercito, e que mais tarde separando-se dele, enamorou-se de outro, e que no dia do seu matrimonio a carruagem em que iam para a igreja matou um homem nas proximidades da pracinha e que por causa dessa morte mais tarde o seu marido acabou suicidando-se nos pântanos na parte de trás do casarão.
E a história terminava sempre com a profecia: Quando forem contados 400 anos desde o casamento da matriarca, o sol vai escurecer em outra vida.
Deduziam as crianças que alguém iria morrer, e dada esta conclusão, medos momentâneos, e logo esqueciam das histórias.
O outono debulhava as árvores ao redor do casarão e em toda a pracinha.
Cecília terminara de corrigir trabalhos da escola, pois era professora, e lentamente subia a escada até seu quarto, até que instintivamente olhou uma pequena ventarola na parede...
Divisou lá ao fundo, do lado de fora do casarão, na praça, o homem..
Durante toda a sua vida o vira, mas não daquele jeito, não dalí.
Voltou o corpo, acelerou o passou, ultrapassou a grande porta, e em poucos segundos estava diante de um ser que sonhou encontrar a vida toda, mas a sombra em seu rosto, não a deixava ver.
Estática, era ela que via agora aquele embrulho sair do lado do corpo do homem e lentamente ser levado pela sua mão até em frente aos seus olhos...
Com todos os seus sentidos tentou captar cada movimento ou ruído daquele homem, mas parece que ele flutuava...
Então uma voz como que vinda das estrelas lhe disse:
___Este é meu presente pelas suas bodas, tive que fazer uma viagem e só agora o trouxe...
___Os teus traços nunca mudaram a reconheceria pelos séculos, concluiu.
Cecília como que hipnotizada, desfez o embrulho, retirou uma pequena caixa, e dentro dela, esquadrinhado, um chocolate de perfume celestial... Retirou um pequeno pedaço e o deixou derreter na boca...
Sua visão foi ficando embaçada, e viu afastar-se o homem como tantas vezes.
Deitada na pracinha, olhos esbugalhados pelo doce envenenado, entendeu finalmente que o ex amor da matriarca, via nela a reencarnação de seu antigo amor, e a matou por ter sido preterido a outro.
Em seu último suspiro Cecília viu na parte oposta da tampa da pequena caixa uma data e uma hora, exatamente a data e a hora em que corrigiu o ultimo trabalho... 400 anos separavam as duas datas e horas.
.


xxeasxx

Malgaxe
Enviado por Malgaxe em 18/02/2010
Reeditado em 28/07/2010
Código do texto: T2093971
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.