Clarissa
Quando ele a viu naquela noite, algo aconteceu.
Ele nunca havia sentido algo assim.
Aos poucos foi se aproximando devagar. Era tímido, mas precisava vencer a timidez agora pois não sabia se a veria novamente.
Puxou conversa todo sem jeito e sem cor.
Seus olhos se cruzaram. Azuis e vivos. Sua pele muito branca e como de um bebê, perfeita.
Ela sorriu com um sorriso alvo, como ele nunca tinha visto antes.
Em pouco tempo haviam deixado o baile rolando e estavam sentados na calçada do clube.
Ele ficou sabendo que ela saia muito pouco. Que era tímida.
Descobriu também que seu nome era Clarissa.
O tempo foi passando. As horas voando e era hora de se despedirem.
Estava esfriando e ele colocou seu casaco sobre os ombros dela. Ela agradeceu, mas disse que não podia chegar em casa com o casaco.
Ele insistiu. Ela aceitou.
Queria acompanhá-la, ela não deixou.
Ele a colocou em um táxi e ela partiu.
Deixou um bilhete com o endereço para que ele fosse pegar o casaco no outro dia.
A noite estava escura e ele radiante, feliz da vida e amando.
Na hora nem se preocupou em ver o endereço, guardou no bolso.
23 e 30. A chuva caiu pesada e escureceu ainda mais a noite.
Ele pegou outro táxi.
Foi pra casa, dormiu como anjo. Um anjo feliz.
Choveu a noite toda. Chuva forte.
Acordou. Olhou o endereço. Achou que fosse brincadeira. E de mal gosto.
Não poderia ser. Não aquele endereço.
Esperou a chuva dar uma trégua e foi para rua, pegou táxi e foi para o endereço indicado no papel.
Ele não queria acreditar no seus olhos mas o local era o que estava no papel.
Cemitério das Oliverias. Quadra 32. Jazigo 12.
Ele não sabia se entrava ou não. Teve medo. Teve curiosidade.
Tomou coragem e entrou. Seus passos o guiaram como se ja soubessem o caminho.
Após caminhar um pouco entre mausoléus e ver flores e velas seu corpo gelou por inteiro.
Estava bem na sua frente. O jazigo 12 da quadra 32.
Todo em mármore negro com letras manuscritas em cobre indicando o nome da família:
"Família Vivara".......
Havia uma estátua de um anjo debruçado chorando sobre uma placa onde nomes se alinhavam junto a fotos antigas.
Seu coração disparou e sua respiração quase parou.
A moça do baile estava em uma das fotos: Clarissa Vivara. 1970 - 1987
Ele tremia muito. E estava transpirando apesar da chuva e do vento gelado.
Aí foi que ele reparou alguns vasos com flores muito bem arrumados e notou algo debaixo de um deles. Para seu susto ser ainda maior viu que era seu casaco, bem dobrado e protegido da chuva.
Ele o pegou, vestiu e saiu.
Todo final de semana ele a visita e leva flores.
E em todo baile que ele vai, ainda espera se encontrar com Clarissa Vivara.